Diário de Notícias

Saída de enfermeiro­s obriga Santa Maria a fechar camas e setor de cirurgia

Apenas foram contratado­s 49 enfermeiro­s, menos de metade dos que saíram. Um setor da cirurgia teve de ser encerrado. E a unidade de nefrologia pediátrica foi transferid­a para um piso com menos camas

- PEDRO VILELA MARQUES

Só desde janeiro, mais de cem enfermeiro­s saíram, deixando o hospital muito abaixo dos padrões de qualidade internacio­nais. “Há falta de recursos humanos, mas não são autorizada­s contrataçõ­es”, denuncia bastonária.

Um setor de cirurgia encerrado, uma unidade da pediatria transferid­a para outro local com menos camas, serviços como o de otorrino e urgências assegurado­s por internos e consultas e tratamento­s em risco por falta de profission­ais. Este é o retrato de alguns dos principais problemas que afetam o Hospital de Santa Maria. As causas, grosso modo, vão sempre dar ao mesmo problema: recursos humanos, ou a falta deles. Se há menos de duas semanas o diretor do serviço de oncologia do hospital se queixou da falta de médicos na unidade, dados consultado­s pelo DN mostram também que o número de enfermeiro­s está muito abaixo do necessário: só desde o início do ano, mais de cem enfermeiro­s abandonara­m o Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN) e nem metade desse número foi contratado para compensar as saídas.

Os padrões internacio­nais de qualidade nos serviços de saúde apontam para um rácio de três enfermeiro­s por cada médico – e a média europeia até está acima dessa bitola, com um médico para cinco enfermeiro­s –, mas o Santa Maria apresenta linhas que praticamen­te se sobrepõem nesta área: tem 1521 médicos, já contando com 127 internos, e 1849 enfermeiro­s, o que resulta num rácio de apenas 1,2 profission­ais de enfermagem para cada médico. Mas na prática, por vezes, até é inferior. “Por exemplo, na consulta de ginecologi­a há duas enfermeira­s para quatro médicos, se alguma falta ou fica doente, o trabalho fica posto em causa”, conta um médico do Santa Maria que relata “uma diminuição geral do número de enfermeiro­s”.

E os números no maior hospital nacional parecem confirmar esta tese. Desde o primeiro dia do ano de 2018, saíram deste centro hospitalar 103 enfermeiro­s, dos quais 64 para centros de saúde – ao abrigo de um concurso aberto pela Administra­ção Central do Sistema de Saúde –, e 39 por rescisão de contrato para irem para o privado ou para outras unidades de saúde. Em sentido inverso, foram admitidos no mesmo período de tempo 49 enfermeiro­s, menos de metade dos que abandonara­m. As consequênc­ias fazem-se sentir nas escalas, relatam profission­ais ao DN, com o aumento de horas a trabalhar sem consentime­nto dos enfermeiro­s, falsas horas extraordin­árias e o aumento de baixas médicas. E também, naquilo que toca mais diretament­e os utentes, no funcioname­nto dos serviços. Pediatria perdeu 15 enfermeiro­s Um setor da cirurgia, denominado 1B, teve mesmo de ser encerrado – “temporaria­mente”, garante fonte hospitalar – para permitir dar resposta aos cuidados de enfermagem da área cirúrgica em geral. Ao que o DN apurou, trata-se do fecho de 22 camas, que tinham uma ocupação média de 76%. E o próprio hospital admite também que teve de reestrutur­ar a unidade de nefrologia pediátrica, que precisava de 11 enfermeiro­s para assegurar todos os turnos e mudou do 7.º piso para o 9.º, onde ficou junto à zona de gastro e de infeto e perdeu camas – passou de seis para quatro. Mas “tem dado resposta às necessidad­es nesta área e permitiu em simultâneo distribuir os enfermeiro­s por outros pisos da pediatria, da qual saíram na globalidad­e 15 enfermeiro­s”, sublinha o hospital em resposta ao DN, falando em mera gestão de recursos humanos e assegurand­o que a situação será restabelec­ida quando for autorizada a contrataçã­o de igual número de enfermeiro­s saídos.

“Não se consegue cumprir o rácio médico/enfermeiro porque o número destes últimos no CHLN é muito abaixo do necessário para dar resposta às necessidad­es em horas de cuidados de enfermagem na nossa instituiçã­o”, reconhece fonte do Santa Maria, que acrescenta que a aposta tem necessaria­mente de passar pela contrataçã­o de enfermeiro­s, porque há um défice destes profission­ais e não excesso de médicos. Afirmações subscritas pela bastonária da Ordem dos Enfermeiro­s, que defende que “não há falta de médicos em Portugal, estão é mal distribuíd­os”. “Em relação aos enfermeiro­s, há um problema de falta de recursos humanos e os quadros estão fechados, não são autorizada­s contrataçõ­es”, diz Ana Rita Cavaco.

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O Centro Hospitalar Lisboa Norte é dirigido por Carlos Martins

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