Nem falhar a Liga Europa manchou “um dia perfeito em Vila das Aves”
Aves. Festa da conquista da Taça de Portugal durou noite e dia na pequena vila de Santo Tirso, apesar das notícias sobre a não ida à Europa
Ter menos adeptos não significa necessariamente festejos menos intensos na altura de celebrar um feito inédito. Prova disso foram as 24 horas que se viveram na Vila das Aves após a conquista da Taça de Portugal, numa festa inebriante que se estendeu até à Câmara Municipal de Santo Tirso, onde ao fim da tarde de ontem a equipa do Desportivo das Aves foi recebida nos Paços de Concelho, com uma pequena multidão a encher a praça em frente à varanda da autarquia.
Alguns milhares de adeptos, dois a três mil – numa vila que tem cerca de 8500 habitantes – não quiseram perder a honraria histórica concedida após a conquista da Taça de Portugal de futebol, a primeira da sua história, após o triunfo por 2-1 sobre o Sporting, no domingo. “O maior feito do clube e da vila”, diz ao DN Pedro Vaz, de 37 anos, a restabelecer-se ainda das emoções que viveu no Jamor com a mulher, Ana, os sogros e demais família.
Um a um, subiram ao palco da câmara os protagonistas para receberem uma medalha do município, comemorativa do feito. Quim, o veterano guarda-redes de 42 anos, e Guedes, o autor dos dois golos, foram naturalmente os mais aplaudidos, mas todos os jogadores, treinadores e dirigentes foram devidamente ovacionados por adeptos em êxtase, a quem nem as más notícias sobre a anunciada ausência do clube na Liga Europa da próxima época fizeram desanimar.
Durante o dia ontem ficou a saber-se que a Federação Portuguesa de Futebol não incluiu o Aves na lista para as provas europeias, por alegado incumprimento nos prazos de licenciamento, mas o site da UEFA contemplava o nome da equipa, o que deu força ao presidente da SAD avense, Luiz Andrade, para, entre críticas à FPF, acreditar numa solução positiva (ver entrevista).
Pedro Vaz, por exemplo, não fica muito preocupado. “Claro que gostava de ver aqui um Chelsea ou um Atlético de Madrid, mas prefiro que o clube cresça de forma sustentada e há vários casos em Portugal de equipas que foram à Liga Europa e depois desceram de divisão”, lembra. Ao lado de Pedro está Ana Queirós, de 26 anos. Eles são os sócios 1799 e 1800 do Desportivo das Aves. O bebé vindouro que cresce na barriga de Ana também ‘foi’ ao Jamor e “será avense com toda a certeza”, garante a futura mãe, mais ferrenha. Pouco sono e muitas promessas Quando acordou, Joaquim Silva, olhos raiados de pouco sono, quase que teve de beliscar-se. “Não foi um sonho!”, diz, elevando o tom, olhos bem abertos agora. “Deitei-me às 03.00 e levantei-me às 05.00 para trabalhar”, conta.
Estamos no Vale do Ave, zona altamente industrializada, e Manuel Pereira também só dormiu duas horas. “Foi 80 por cento surpresa, os outros 20 por cento não! O Sporting esteve oito dias parado e mentalmente estava muito em baixo. Mas o Desportivo das Aves não teve nada que ver com isso e aproveitou a oportunidade”, considera, ao tomar um café na esplanada do Café Central. A poucos metros, Kika, uma cadela labradora preta, tem enroscado no pescoço um cachecol do clube que, em novembro, cumpre 88 anos.
Miguel Carneiro, 21 anos cumpridos ontem – “a Taça foi a melhor prenda” –, acusa o cansaço de quase duas noites em branco, muita emoção e festa. Está com outros 30 a 40 adeptos no café onde habitualmente se reúnem, mais conhecido por Associação de Adeptos, e relembra o jogo que deu ao clube da pequena vila do concelho de Santo Tirso a sua primeira Taça de Portugal. O jovem membro da claque Força Avense admite que quando o Sporting reduziu para 2-1, já na parte final da partida, teve “muito medo”. “Lembrei-me logo que eles tinham recuperado de um 2-0 contra o Braga e ganharam a Taça, há uns anos.”
“Nós estávamos habituados a festejar as subidas de divisão, este ano também a manutenção [outra coisa nunca antes conseguida no clube], mas vencer a Taça de Portugal… Defensivamente estivemos muito bem nesses minutos finais e, quando o árbitro apitou, foi baba e ranho!”, atira.
Carlos Fernandes, 45 anos, blusão de fato de treino do Aves e tacinha de vinho branco à frente, lamenta se o desenlace da inscrição na Liga Europa for negativo, porque “era bom, era dinheiro e prestígio…” Mas o mais importante foi mesmo ganhar a Taça.
Junta-se à conversa, na mesa, Leandro Almeida, de 51 anos. Diz que jogou no clube em jovem e nota, bem-disposto, que “o Desportivo das Aves nunca perdeu uma final” – só disputou esta.
Antes do jogo foram feitas promessas: Joaquim Silva garante que vai a pé até São Bento da Porta Aberta, no Gerês, a quase 60 quilómetros. PedroVaz foi mais comedido: vai ao Monte da Nossa Senhora da Assunção, ponto mais alto de Santo Tirso, onde quer colocar uma bandeira do clube como símbolo da conquista. À sua escala, o Desportivo das Aves conquistou o Evereste.