Caso Gürtel: Juiz Garzón aplaude sentença histórica contra PP de Rajoy
Penas por esquema de corrupção totalizam 351 anos de cadeia. PP vai recorrer. PSOE, Ciudadanos e Podemos criticam Rajoy
Luis Bárcenas, ex-tesoureiro do PP, foi condenado a 33 anos de prisão e a 44 milhões de euros de multa
PATRÍCIA VIEGAS O ex-juiz da Audiencia Nacional espanhola viu ontem o tribunal a que pertenceu proferir a sentença do chamado caso Gürtel, um esquema de corrupção que envolvia empresários que ganhavam concursos públicos a troco de pagamentos de percentagens que eram usadas para ajudar a financiar o Partido Popular (PP).
A sentença proferida soma 351 anos de penas de prisão para 29 dos acusados e aplica uma multa de 245 492,8 euros ao PP. O cabecilha do esquema, Francisco Correa, cujo apelido em alemão deu o nome à investigação de Gürtel, foi condenado a 51 anos de cadeia. Luis Bárcenas, extesoureiro do PP, foi condenado a 33 anos de cadeia e a pagar uma multa no valor de 44 milhões de euros.
“A justiça é lenta como um elefante mas no final cumpre a sua missão”, disse Baltasar Garzón, em declarações ao programa RojoVivo da cadeia de televisão La Sexta. Apesar do preço que teve de pagar, afirmou, o ex-juiz espanhol declarou-se satisfeito pelo trabalho que ajudou a trazer à luz do dia o esquema de corrupção. A sentença “é um triunfo da sociedade e da justiça apesar dos entraves colocados no início da investigação”.
Conhecido pela luta contra a ETA ou pela ousadia de querer investigar os crimes do franquismo,
anos de prisão É a soma das penas dos 29 acusados do caso Gürtel. O ex-tesoureiro do PP Luis Bárcenas foi condenado a 33 anos e a multa de 44 milhões. em 2012 foi inabilitado de exercer a profissão de juiz durante 11 anos após ter ordenado escutas ilegais na prisão entre os advogados de defesa e os arguidos do caso Gürtel.
Em fevereiro de 2017, de passagem por Lisboa, Baltasar Garzón afirmou em entrevista ao DN: “Fui suspenso pela investigação dos crimes franquistas e posteriormente juntou-se o caso Gürtel, pelo qual fui condenado. Um crime que, do ponto de vista da nossa defesa, não existia. Criou-se na sentença. Mas isso já passou. Serviu para me lembrar de que a luta contra a corrupção tem um custo, que às vezes é muito grande. No meu caso foi a impossibilidade de exercer como juiz durante 11 anos. O estudo do direito era a minha vida, mas esta vida continua. Pode-se continuar a lutar pela justiça, contra a corrupção, também desde fora.”
Em julho de 2017, Mariano Rajoy foi ouvido como testemunha em tribunal, tornando-se o primeiro chefe do governo em funções a sentar-se no banco dos réus na democracia espanhola. Rajoy, presidente do PP, argumentou que sempre se ocupou apenas das questões políticas relacionadas com a atividade dos populares e que os detalhes económicos nunca passaram pelas suas mãos. “Jamais me ocupei dos temas de contabilidade”, frisou. “Não sei nada de contas, só tive conhecimento quando foi publicado nos meios de comunicação social, por isso não há nada que possa aportar, não sei nada desse assunto, francamente”, afirmou noutro momento da audiência.
Ontem, reagindo à sentença, o coordenador-geral do PP, Fernando Martínez-Maillo, disse: “Creio que é uma sentença que está enganada e errada e vai ser alvo de recurso de forma imediata e fundamentada.” E lembrou que, antes de 2003, “Mariano Rajoy nem sequer era o presidente do PP”. Esta sentença refere-se à primeira fase do Gürtel, no período entre 1999 e 2005.
O líder do PSOE, Pedro Sánchez, considerou “inaceitável” a reação do PP em relação a uma sentença que “implica politicamente o presidente do governo e do PP Rajoy”. O líder do Ciudadanos indicou que o seu partido vai reavaliar o apoio ao executivo de Rajoy, que não goza de maioria absoluta. “Esta não é mais uma sentença, pois é a primeira vez que um partido é condenado por corrupção, que é o partido que governa Espanha. Há que tomar decisões”, declarou Albert Rivera, descartando, para já, apoio a uma moção de censura. Do seu ponto de vista isso iria somar mais instabilidade à já existente por causa da questão da Catalunha, comunidade onde o Ciudadanos é forte.
A ideia da moção de censura voltou a ser ontem defendida pelo líder do Podemos, Pablo Iglesias.” Pedro Sánchez conhece perfeitamente a disponibilidade do Podemos”, disse, desafiando o PSOE a apoiar uma moção de censura (foi a abstenção dos socialistas que, no passado, viabilizou o governo minoritário do PP de Rajoy). Recorde-se que Iglesias enfrenta, ele próprio, escrutínio da sociedade espanhola e dos militantes do partido, tendo sido fortemente criticado por ter adquirido, com a namorada, Irene Montero, também membro do Podemos, uma vivenda de 600 mil euros. Iglesias foi acusado de hipocrisia, por criticar a aquisição de um apartamento no mesmo valor pelo ex-ministro das Finanças Luis de Guindos. “Entregarias a política económica do país a quem gasta 600 mil euros num apartamento de luxo?”, escreveu, em 2012 no Twitter. Face às críticas, Iglesias decidiu submeter a questão a referendo no Podemos, através de internet até domingo.