Diário de Notícias

E agora?... É obrigatóri­o que partidos debatam, debatam, debatam

Muitos jovens, de juventudes partidária­s, de escolas, uns a favor do sim, outros do não. Todos queriam ouvir falar de eutanásia. O DN falou com alguns

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NAS GALERIAS Pedro, Alexandre, Guilherme, António, Henrique, Ana Bárbara, Tiago e Duarte são jovens, dos 15 aos 28 anos, uns ainda no secundário, outros já na faculdade e no mercado de trabalho, mas um dia todos vão poder dizer que estiveram nas galerias da Assembleia da República na tarde em que, pela primeira vez na história da democracia, os deputados debateram e votaram quatro projetos sobre a despenaliz­ação da eutanásia. Na tarde em que as galerias se encheram de jovens, até de forma ocasional, já que várias escolas faziam visitas de estudo. Mas uns e outros tinham noção de que “o debate é histórico.”

No final, é certo, uns saíram mais satisfeito­s do que outros, pois dividiam-se entre o sim e o não, mas todos tinham uma certeza: que os partidos têm de inscrever a matéria nos seus programas para a debaterem, obrigatori­amente, com as bases e com a sociedade. “É uma matéria muito sensível e é assim que se faz em democracia”, diz Guilherme, um dos mais jovens, 16 anos, 11.º ano no Colégio dos Salesianos, em Lisboa, e inscrito há pouco tempo na Juventude Social Democrata (JSD).

Guilherme assistiu ao debate do princípio ao fim com mais quatro amigos, Pedro, Alexandre, António e Henrique, todos do colégio e todos inscritos na JSD. Porquê? Porque é a ideologia social-democrata que partilham. Porquê a ida ao Parlamento? “Porque é um debate histórico”, concordam. E quiseram ver como era a discussão e, sobretudo, a votação. Aguentaram mais de três

horas, ouviram os deputados e dizem-nos: “Foi importante ouvir todos os lados.” Guilherme é contra a despenaliz­ação e assume que é por uma questão religiosa. “Acredito que a nossa vida não é nossa. Defendo que acima tudo devemos lutar pela dignidade e vida humana”, Henrique e António concordam. Uma matéria de “consciênci­a” Mas já Alexandre, também de 16 anos, 11.º ano, na área das Ciências e Tecnologia, defende o contrário: “É uma matéria ético-moral, de consciênci­a, não tem de estar ligada aos valores católicos.” Alexandre não tem dúvidas e, embora JSD, votaria a favor da despenaliz­ação da eutanásia. Está de acordo com o voto da líder, Margarida Balseiro Lopes, e argumenta: “Se vivemos num Estado laico tem de se atuar como tal. Por isso, acho que todos os indivíduos deveriam ter o direito a escolher uma morte digna, de acordo com a vida que tiveram.” No entanto, sublinha, qualquer lei que um dia venha a ser aprovada “terá de ser fiscalizad­a”. Os cinco faltaram às aulas de Português para poderem assistir ao debate. “Os pais sabem”, garantem, como sabem que se inscrevera­m na JSD. Pedro já teve o pai como deputado do PSD, por isso, “não é a primeira vez que aqui venho”. E, talvez, não seja a última. Quem sabe um dia do lado das bancadas parlamenta­res, dizemos. Eles riem-se: “Quem sabe”, respondem.

Mais velhos, já quase nos 30, Tiago Lucas e Duarte Canotilho, amigos, formados em Direito, o primeiro da JSD e o segundo da Juventude Socialista, estão do mesmo lado: a favor da despenaliz­ação. O resultado não agradou a ambos, mas ambos têm leituras diferentes. Para Tiago, o voto dos deputados do PSD foi “também um voto de boicote à liderança de Rui Rio, que se tinha manifestad­o a favor”. Mas, agora, espera que “o PSD esclareça e clarifique a sua posição sobre esta matéria e que a debata com as bases”. Duarte ficou desiludido com o debate a que assistiu: “Não se discutiu os projetos.” Agora, o trabalho que há a fazer é: “Nas próximas campanhas reforçar o debate e puxá-lo para as questões reais e não continuar a discutir o tema só na base dos princípios e da ideologia, como se fosse só uma questão de direito à vida e à morte.”

Ana Bárbara tem 28 anos e há dois que faz parte do Movimento Morrer com Dignidade. Foi um dos temas que quis discutir, em nome da liberdade individual de cada um, e espera que no futuro a sociedade permita a cada um tomar as suas decisões. ANA MAFALDA INÁCIO

“Proteger a vida humana é diferente de impor o dever de viver em qualquer circunstân­cia”

ISABEL MOREIRA

DEPUTADA DO PS “Não se pode falar de um pretenso direito a morrer, isso é um absurdo. O direito a ser morto por outrem não existe”

ISABEL GALRIÇA NETO

DEPUTADA DO CDS “80% dos doentes morrem sem cuidados paliativos, desprovido­s de qualquer auxílio no alívio da dor na fase terminal da sua vida”

FERNANDO NEGRÃO

LÍDER PARLAMENTA­R DO PSD “O que o medo de uns e o preconceit­o de outros têm trazido para o debate não pode condiciona­r uma escolha livre e serena”

JOSÉ MANUEL PUREZA

DEPUTADO DO BLOCO DE ESQUERDA

 ??  ?? Pedro, Henrique, Alexandre, António e Guilherme assistiram na segunda fila do lado esquerdo das galerias a todo o debate sobre a eutanásia
Pedro, Henrique, Alexandre, António e Guilherme assistiram na segunda fila do lado esquerdo das galerias a todo o debate sobre a eutanásia
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