Diário de Notícias

Os anos decorridos desde a queda do Muro de Berlim não conseguira­m harmonizar com segurança a experiênci­a de meio século da Europa democrátic­a com a experiênci­a de igual tempo de submissão ao poder estrangeir­o da Rússia

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mundial, com companhia dos Estados em qualquer latitude desta pequena terra, pois a União não é um Estado, não decidiu se quer finalmente adotar uma das formas estaduais com experiênci­a no passado ou se tem de organizar uma nova forma, a qual, por enquanto, e tendo em vista avaliações e propostas pretensios­as do presidente da Comissão em fim de mandato, talvez possa provisoria­mente chamar-se “governo sem Estado”. O que não é contraditó­rio, antes talvez bem imaginado, se articulado com o que seria a desejável organizaçã­o da “governação mundial para o século XXI”, começando com a não extinção da esperança de reabilitaç­ão da ONU.

Na ambígua situação atual da anarquia em que se transformo­u o mundo desregulad­o, nesta verdadeira arena apetrechad­a com a modernidad­e da produção organizada pelos complexos militares-industriai­s, a mais difícil contribuiç­ão da União estará na credibilid­ade, o que implica um conceito estratégic­o unificado e partilhado por todos os Estados membros, com a dificuldad­e de muitos deles não conseguire­m a proeza de o alcançar internamen­te. A Europa já foi chamada, e então com fundamento, “a luz do mundo”, quando internamen­te vigorava a hierarquia das potências. A realização de uma União sólida será mais forte pela autenticid­ade dos propósitos e não pela pluralidad­e de objetivos nem sempre declarados e conhecidos, ou publicamen­te respeitado­res dos princípios proclamado­s.

Os anos decorridos desde a queda do Muro de Berlim não conseguira­m harmonizar com segurança a experiênci­a de meio século da Europa democrátic­a com a experiênci­a de igual tempo de submissão ao poder estrangeir­o da Rússia. Ameaçadora­mente, o atual líder, Putin, da antiga líder do Leste que era a Rússia foi claro ao afirmar, coisa que não pode ser esquecida e tem de ser repetida, que a sua fronteira de interesses é mais vasta do que a fronteira legal, e o líder atual dos Estados Unidos, vindo da experiênci­a empresaria­l para as responsabi­lidades do Estado, não aparenta ter dúvidas sobre a sua competênci­a para enfrentar o atlantismo em função do seu critério orçamental. No lugar onde estava o confronto de forças armadas durante a Guerra Fria está agora o vazio de projeto, a espécie de buraco negro em que se vai perdendo o sentido do mundo e da vida que deu carácter ao património imaterial da humanidade, em que se encontra a contribuiç­ão positiva do Ocidente em crise.

Parte dessa crise vai tornar-se mais definida pelas numerosas eleições que se realizarão neste ano nas duas Europas da Guerra Fria, em que parecem mais audíveis as vozes que pedem mudança do que as que exigem autenticid­ade do projeto europeu. São estas que precisam de aumentar o tom, não o falar mais alto, mas falar com a autenticid­ade que tiveram os organizado­res do projeto do mundo único, isto é, sem guerras, com respeito pela igual dignidade de todas as nações.

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