Trump de braços abertos à Rússia mas com a cabeça já em Kim
Proposta do presidente americano para reintegrar russos no grupo rejeitada pelos europeus. Trump sai mais cedo para Singapura
A cimeira do G7 só termina hoje ao fim do dia, mas o americano Donald Trump vai abandonar mais cedo os outros seis líderes dos países mais industrializados do mundo – EUA, Canadá, França, Reino Unido, Alemanha, Itália e Japão, mais a União Europeia –, reunidos em La Malbaie, na província canadiana do Quebec. O presidente americano, que ontem anunciou ser favorável ao regresso da Rússia ao grupo do qual foi expulsa em 2014 após a anexação da Crimeia, segue diretamente para Singapura, onde no dia 12 tem marcada uma cimeira com o líder norte-coreano, Kim Jong-un.
Numa cimeira marcada pelas tensões entre aliados – seja em relação às tarifas sobre o aço e o alumínio impostas pelos EUA na semana passada seja pela retirada dos americanos do acordo sobre o nuclear iraniano –Trump chega já com a cabeça a pensar no encontro com Kim. Este chegou a ser cancelado pelo presidente americano, mas parece agora ir mesmo acontecer. Quando deixar o Canadá, a meio da manhã de hoje, Trump deixa Everett Eissenstat, o seu assistente adjunto para os Assuntos Internacionais Económicos, a representar os EUA nas restantes sessões de trabalho.
Regresso ou nem por isso O primeiro dia da cimeira do G7 ficou marcado pela ideia do possível regresso da Rússia ao grupo. “Sabem, quer se goste ou não, e pode não ser politicamente correto, mas temos um mundo para gerir e o G7, que costumava ser o G8, expulsou a Rússia, mas pode deixar a Rússia voltar, porque devíamos ter a Rússia de volta à mesa das negociações”, afirmou o presidente americano aos jornalistas antes de deixar Washington.
A ideia não podia ter tido uma receção mais fria por parte dos quatro países europeus do G7. O francês Emmanuel Macron, a alemã Angela Merkel, a britânica Theresa May e o italiano Giuseppe Conte, reunidos pouco antes do início da cimeira no Canadá e por iniciativa do presidente francês, consideraram que “a posição europeia não é um regresso da Rússia”, recordaram a “vigilância do G7” face a Moscovo mas também admitiram “a possibilidade de estabelecer o diálogo”, uma concessão feita aos italianos. Antes desta posição comum, Itália parecera ter opinião diferente, com Conte a tui- tar que a reintegração da Rússia seria “do interesse de todos”.
Mas o próprio governo russo parece não ver com bons olhos a proposta de Trump. “A Rússia está concentrada noutros formatos, além do G7”, explicou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, citado pela agência estatal russa Sputnik. A confirmar as palavras de Peskov está o facto de o presidente russo,Vladimir Putin, se encontrar ontem em Pequim, onde recebeu a Medalha de Amizade das mãos do homólogo chinês, Xi Jinping.
A polémica em torno do regresso da Rússia ao G7 sobrepôs-se às dos últimos dias. Mas Trump não deixou de recordar as discordâncias que tem com os parceiros. No Twitter, o presidente americano escreveu ainda antes de deixar os EUA para o Canadá: “Ansioso por reforçar os acordos injustos com os países do G7. Se tal não acontecer, ficaremos ainda melhor.” Sem deixar de criticar os outros seis países pela forma como trataram a América na última cimeira, Trump suavizou o ataque, ao prever que neste ano, no Canadá, as tensões iam acalmar e que “o amor vai regressar entre nós”.
Do lado da União Europeia, a resposta veio do presidente do Conselho Europeu – o polaco Donald Tusk esteve a representar a UE no encontro, tal como o presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker –, que afirmou: “O que mais me preocupa é o facto de a ordem internacional baseada em regras estar a ser contestada de forma surpreendente não pelos suspeitos do costume mas pelos seus principais arquitetos e mentores: os EUA.”
Sinal da discórdia entre os líderes do G7 – além de Trump, Macron, May, Merkel e Conte, também o anfitrião Justin Trudeau e o japonês Shinzo Abe – é o facto de não ser esperado qualquer comunicado conjunto no final da cimeira. Juntos, os países do G7 representam mais de 60% da riqueza mundial.