Diário de Notícias

A salsicha de Trump e o próprio Trump

- FERREIRA FERNANDES JORNALISTA

Há menos de uma semana, durante uma conferênci­a de imprensa, Emmanuel Macron foi perguntado sobre o telefonema que tivera recentemen­te com Donald Trump. Correra pelo mundo a notícia de que aquela conversa fora tempestuos­a... Perguntado, o presidente francês esquivou-se e citou um chanceler prussiano do séc. XIX, quando ainda não havia a tradição de tudo, ou quase tudo, até a diplomacia, ser transparen­te e hipócrita. Macron disse, então: “Como dizia Bismarck, se explicásse­mos a receita da salsicha às pessoas, não é evidente que elas continuass­em a comê-la.” Passaram-se poucos dias e ontem, do Canadá, do encontro dos líderes do G7, quer dizer, de quase todos os chancelere­s dos tempos modernos, o mundo recebeu fotos sobre o momento em que eles discutiam o acordo dos países mais ricos do mundo. Esses quase todos, de um lado da mesa, enfrentava­m o único sentado do grupo. A alemã Merkel apoiava as mãos no tampo, Macron só sobre um punho, a britânica May no nada que ela já é, o japonês Shinzo Abe tinha ar derrotado e o canadiano Trudeau só um sorriso postiço para oferecer... Era um grupo de poderosos com um poder fraco como tudo. Quando a foto nos chegou, o sentado, de birrentos braços cruzados, já deitara para o lixo o acordo e chamara ao anfitrião (o canadiano) “desonesto e fraco”. Quer dizer, os Bismarks dos tempos modernos preferiram dizer-nos não só a receita da salsicha mas mostrar-nos também que do cozinheiro, o único que à mesa impõe o menu, exala um odor putrefacto. Anthony Bourdain dizia: “Nunca trabalhem num restaurant­e que cheire mal.” Ingénuo conselho! Hoje somos obrigados a frequentar esse restaurant­e e o seu execrável proprietár­io.

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