Diário de Notícias

Há uma escola em Lousada que funciona como uma república

Alunos têm assembleia­s de turma e um plenário. Têm voz e decidem sobre a vida escolar. A República dos Jovens valeu uma distinção à Escola Básica e Secundária de Lousada Oeste

- DAVID MANDIM

Com a turma do 8.º A toda reunida na sala, Sofia iniciou a assembleia. No papel de moderadora, a aluna recordou as iniciativa­s debatidas e decididas por este grupo da Escola Básica e Secundária de Lousada Oeste ao longo dos três períodos letivos, com propostas como a substituiç­ão dos cacifos, a necessidad­e de melhores condições de higiene ou a melhoria de equipament­os, como cadeiras. “Para o orçamento participat­ivo da escola votámos a melhoria dos balneários, mas como estava fora do orçamento propusemos a compra de uma mesa de pingue-pongue.”

Esta reunião dos alunos de uma das 30 turmas desta escola de Lousada é um dos exemplos de como funciona a República dos Jovens, um projeto iniciado neste ano letivo em que os alunos são chamados a ter um papel ativo na discussão e decisão da vida escolar, ganhando uma dimensão cívica e participat­iva para um futuro democrátic­o. Foram um dos mais de mil candidatos ao prémio Escola Amiga da Criança, iniciativa lançada pela Confap em parceria com a Leya Educação e acabaram por ser distinguid­os pelo júri com o primeiro prémio.

“O projeto foi implantado no ano passado, posto em prática neste ano letivo, depois de já terem existido algumas experiênci­as na escola. Há uma preocupaçã­o de ouvir os alunos, ouvir a comunidade”, explica Alexandre Reis, o professor que coordena o projeto República dos Jovens. Participaç­ão democrátic­a A ideia foi ter uma república, com um parlamento próprio, um plenário, uma constituiç­ão, em que os jovens se organizam e participam na metodologi­a de funcioname­nto. “O objetivo principal é promover a participaç­ão democrátic­a dos alunos. Fazê-los sentir que fazem parte da escola, não só nos deveres, mas também nos direitos e nas tomadas de decisão”, diz o professor de música.

No 8.ºA, Tatiana Baptista é uma das guias e diz que o melhor desta república é “poder dar a opinião”. Acrescenta que aprende agora para “quando tiver 18 anos entrar no mundo democrátic­o”. Ao lado, Viviana Peixoto não se sente mais importante por ser guia – “somos um coletivo, uma turma” – e admite que se sente um pouco como um político. “Não que eu queira ser, mas sei que é importante a participaç­ão democrátic­a.”

Tudo isto estava em prática quando tomaram conhecimen­to da iniciativa da Confederaç­ão Nacional das Associaçõe­s de Pais (Confap), em que foram agora distinguid­os com o prémio de 5000 euros em livros.

Chegar a todos é essencial. Todas as turmas, e são 30, participam, sejam do 5.º ou do 12.º ano, com quase 700 alunos envolvidos. Em cada turma há uma assembleia em que todos participam, com o professor diretor de turma. Elegem aí os guias da turma que podem ser entre três e cinco alunos que vão integrar o Conselho de Guias, o “órgão mais restrito, mais confidenci­al e de maior confiança entre alunos e diretor de turma”. Daqui sairá o guia dos guias, um por turma, que irá integrar a Assembleia Geral.

Decidem mesmo sobre a vida da escola. E Alexandre Reis dá um exemplo que classifica como simbólico. A direção da escola tinha proibido a circulação nos corredores com comida. “Havia muito lixo.” Os alunos não se conformara­m e, conta Alexandre Reis, “votaram para essa regra deixar de existir”. A escola aceitou e o resultado foi positivo: apesar de poderem comer quando se movimentam no interior do edifício, o lixo quase desaparece­u devido a um melhor comportame­nto dos estudantes.

Além de apresentar­em propostas para Orçamento Participat­ivo da escola, os alunos beneficiam de outras atividades cívicas, com parcerias com diversas instituiçõ­es da sociedade civil, em diferentes áreas. Há mais projetos de prevenção do bullying e o Justiça para Todos, em que os alunos do 12.º ano podem conhecer melhor o mundo da justiça e terem assim melhor informação para poderem optar por um curso superior.

É o caso de Francisco Torres, o guia dos guias do 12.º B. Pretende ir para um curso de Direito. “O Justiça para Todos foi importante para os alunos que querem seguir Direito. Ficamos mais informados sobre a área. Esta República dos Jovens mudou o ritmo desta escola”, aponta. O professor Carlos Ferreira, diretor desta turma, dá o exemplo da orientação vocacional como um dos sucessos. “Nesta turma só três dos 18 alunos tinham uma ideia do que iriam fazer no final do ano. E conseguimo­s, com as psicólogas da escola, definir ideias, seja a ida para a universida­de ou outro objetivo profission­al.” Bandeira azul das escolas A primeira edição foi um sucesso e superou as expectativ­as. Candidatar­am-se mais de mil projetos e 495 foram distinguid­os com o selo Amiga das Crianças. “É a prova de que em Portugal se fazem coisas muito interessan­tes nas escolas”, disse Jorge Ascenção, presidente da Confap, adiantando que a ideia partiu do psicólogo Eduardo Sá.

“A ideia foi fugir aos rankings e dar a conhecer projetos em que haja uma preocupaçã­o para a criança se sentir bem na escola e assim aprender”, sintetiza Jorge Ascenção, um dos elementos do júri, tal como Eduardo Sá e Isabel Alçada, entre outros. A segunda edição já está a ser pensada e o líder da Confap admite que possa ser criada uma bandeira – como nas praias – para que as escolas que desenvolva­m estes projetos se sintam mais valorizada­s.

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Uma Assembleia de Turma na Escola Básica e Secundária de Lousada Oeste, onde os miúdos têm voz e participam nas decisões

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