Uma Frida nasce Frida mas também se faz
Frida Kahlo: Making Her Self Up, a exposição que a partir de hoje pode ser vista no Victoria & Albert Museum, em Londres, revela os objetos com que a artista mexicana construiu aquela que para alguns é a sua maior obra de arte: ela própria. De uma prótese
Em criança sobreviveu à poliomielite. Aos 18 anos quase morreu num acidente de autocarro. As fortes mazelas e dores ficariam até à morte (precoce) aos 47 anos, em 1954. Mas também à sua morte Frida sobreviveu. Basta pensar na forma como se tornou símbolo das feministas, fetiche de Madonna, imagem de T-shirts e todo o tipo de merchandising, que inclui uma pulseira no pulso direito da primeira-ministra britânica, Theresa May, e uma Barbie entretanto retirada das lojas por ordem judicial. Na verdade, tudo indica que Frida sobreviverá a todos nós.
A partir de hoje, no Victoria & Albert Museum, em Londres, estão expostos, como numa lição de anatomia, cerca de 200 objetos que fizeram de Frida aquilo que alguns parecem tomar como a sua maior obra de arte: ela própria.
Frida Kahlo: Making Her Self Up reúne as suas roupas extravagantes e coloridas, trajes típicos mexicanos como os vestidos tehuana de Oaxaca ou as blusas huipile, o seu batom favorito, Everything’s Rosy, da Revlon, os lápis com que acentuava a sua monocelha, os corpetes médicos que lhe suportavam a coluna e onde desenhou o martelo e a foice comunistas ou um feto (motivada talvez pela impossibilidade de ser mãe), as suas joias, ou fotografias que testemunham a figura que foi. Tudo isto é ali vizinho das suas verdadeiras obras de arte: quadros como Autorretrato com VestidoVermelho e Dourado (1941).
“Esta é a prova material da forma como Kahlo construiu a sua identidade”, afirmou ao The Guardian Claire Wilcox, curadora da exposição, com Circe Henestrosa.
“Isto parece errado. Estou a olhar para a prótese de perna da Frida Kahlo. Será que ela quereria que o seu membro artificial lhe sobrevivesse assim?”, pergunta no mesmo jornal Jonathan Jones, que argumenta: “Kahlo era, como esta ex- posição revela, com uma clareza sensacionalista, alguém que sofria. Mas também era alguém que criava. Ela não suportava [apenas] a vida, ela transfigurava-a em pinturas brilhantes e visionárias.” Contudo, essa parte, defende, é a menor desta exposição, a que ele chama “arqueológica e não artística”.
Estes objetos (a par de cerca de seis mil fotografias) que pertenciam àquela que um dia perguntou “para que é que preciso de pés se tenho asas para voar?” estiveram fechadas na icónica Casa Azul, na Cidade do México, até 2004. O marido e também pintor Diego Rivera – com um historial de amantes conhecido, como Frida, com Trotsky, por exemplo – dera ordens para que tudo ficasse fechado até à sua morte (em 1957).
“Ela era uma mulher mexicana, de pele escura, com deficiência e em busca de um lugar como artista mulher num ambiente dominantemente masculino no México, no mundo da arte. Não são essas as coisas pelas quais como mulheres lutamos hoje, para termos voz?”, perguntava à BBC Circe Henestrosa, curadora da exposição patente até 4 de novembro, enquanto falava da contemporaneidade de Frida Kahlo, a artista que estava “à frente do seu tempo” e que, na sua última pintura, escreveu: Viva la Vida.
“Esta é a prova material de como Frida Kahlo construiu a sua identidade”, afirma a curadora Claire Wilcox