Diário de Notícias

“O que querem saber mais para decidir?”

Associaçõe­s deixaram esta pergunta aos deputados. Aguardam uma decisão

- ANA MAFALDA INÁCIO

“Não é possível fazer a melhor lei do mundo de repente. É preciso ponderação”, disse no final da sessão a deputada do PSD Mercês Borges

“O que é que nós somos? Cuidadores!”“O que é que nós queremos? Dignidade!” Sofia Figueiredo repetia as perguntas vezes sem conta à porta do Parlamento ontem ao início da tarde. As respostas iam sendo dadas por pouco mais de duas dezenas de pessoas.Todas cuidadores de filhos, pais, mães, irmãos, etc... e com uma cruzada às costas: conseguir que alguém olhe para eles; conseguir um estatuto que enquadre as suas funções; conseguir que o código laboral lhes permita ter uma carreira profission­al ao mesmo tempo que cuidam dos outros, e uma carreira contributi­va durante esses anos, para não ficarem eles próprios desamparad­os mais tarde; conseguir apoios para sobreviver­em ou para prestarem melhores cuidados. Por tudo isto, duas dezenas de associaçõe­s foram ontem ao Parlamento dizer mais uma vez aos deputados da Comissão da Segurança Social e do Trabalho o que precisam. E deixaram perguntas: “O que querem saber mais para tomar uma decisão?” “É lamentável que se tenha demorado tantos anos até chegarmos a esta discussão”, disseram. “Se morrer, quem cuida das filhas...” Cada uma das associaçõe­s teve direito a cinco minutos. Umas alertaram para a necessidad­e da redução da carga horária laboral, para que as faltas que dão por serem cuidadores sejam remunerada­s, para que os anos passados a cuidar contem para a carreira contributi­va, para que as medidas que já existem no código laboral sejam efetivamen­te aplicadas. Outras para a necessidad­e de formação, de apoio psicológic­o, para alguns dias de descanso, etc. Outras houve que deixaram críticas:“A lei tem tudo, mas não funciona” ou “existe uma rede de cuidados continuado­s, mas não chega a todos” ou“as instituiçõ­es do Estado não respondem a todos”. “Se morrer hoje o Estado não tem instituiçã­o que receba as minhas filhas. Não têm demência, só não têm o corpo”, disse Manuela Lagartinho. Por isso,“é preciso acautelar todas as situações”, pediram. “Ainda alguém tem dúvidas?” Depois, foi a vez de cada deputado fazer o balanço. João Dias, do PCP, questionou: “Ainda alguém tem dúvidas sobre o que deve ser feito?”, defendendo que “faz parte da natureza humana cuidar”. Portanto, o partido irá bater-se pelas condições de trabalho para estas pessoas. José Soeiro, do BE, argumentou já se ter passado “a fase das recomendaç­ões. Esteéotemp ode o Parlamento assumiras suas responsabi­lidades e legislar”. João Dias e José Soeiro disseram ao DN que tudo farão para ter um documento de estatuto até ao final desta sessão legislativ­a.

Do lado do PS, Luís Soares admitiu ser“fundamenta­l que se faça alguma coisa para reconhecer o trabalho destas pessoas”, mas o partido do governo trabalhará para que qualquer enquadrame­nto integre a ideia de que ninguém é obrigado a ser cuidador, que instituiçõ­es e cuidadores prestam cuidados diferentes e ambos têm lugar, por uma definição de quem é cuidador informal e até onde deve ir o papel do Estado. Do PSD, Helga Correia também defendeu: “Criar o estatuto significa dignificar e valorizar o ato de quem cuida”, sendo essencial para isso definir quemé cuidador. Filipe Ana core ta Correia, do CDS, sublinhou que o partido foi o primeiro a apresentar uma resolução sobre este tema e que será“muito difícil correspond­er às necessidad­es que ali foram expostas se não houver “responsabi­lidade governativ­a”.

Esta deveria ter sido a última audição pública, mas ainda falta ouvir as secretária­s de Estado da Saúde e da Segurança Social. Só depois os deputados irão reunir e discutir um documento. A presidente da comissão, Mercês Borges, do PSD, disse no final que“não é possível fazer a melhor lei do mundo de repente. É preciso ponderação”. Cá fora, as associaçõe­s comentavam não querer perder a esperança, mas “não podemos continuar sem soluções”.

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