Diário de Notícias

A elite das desigualda­des

- INÊS TEOTÓNIO PEREIRA ESCRITORA

Quem nos governa só aceita como projeto educativo as escolas da Parque Escolar e afere a sua qualidade pelos candeeiros de Siza Vieira e pelas estruturas para guardar esquis. Quem tem “elites” destas só pode ser masoquista

Em Portugal fecham-se escolas com contrato de associação. Escolas com contrato de associação são escolas privadas que têm contrato com o Estado para servirem localidade­s com oferta estadual insuficien­te. O contrato é feito assim: contabiliz­a-se um pre- ço por turma – que na maioria dos casos é inferior ao custo que os contribuin­tes suportam pelas turmas das escolas estaduais e nunca é superior – e paga-se a colégios privados para desempenha­rem esta função do Estado. Na maioria dos casos estes colégios privados estão em zonas desfavorec­idas, no interior desertific­ado, e têm décadas de existência. Têm oferta educativa diversific­ada, boas condições e, na generalida­de, melhor desempenho em comparação com as escolas estaduais. Têm também a particular­idade de integrarem professore­s que não fazem parte da carreira docente do Ministério da Educação. São escolas de qualidade (o financiame­nto depende disso), têm um papel fundamenta­l em muitas áreas onde a igualdade de oportunida­de é uma anedota e têm professore­s que não dançam ao som dos tambores dos sindicatos. Pois isto está mal. Escolas assim, competente­s, fiscalizad­as, que cumprem a função do Estado e dão o melhor aos alunos gratuitame­nte, é inaceitáve­l e são uma pedra na engrenagem das nossas elites pensantes. As nossas “elites” reinantes não toleram que existam soluções além das protagoniz­adas por modelos esgotados em que o ensino gratuito só pode ser prestado por escolas estaduais, funcionári­os públicos e onde tudo funciona de forma centraliza­da e condiciona­do pelos sindicatos. Não se tolera uma escola onde Mário Nogueira é irrelevant­e. E é por isto, só por isto, que os colégios com contrato de associação estão a fechar: porque se dedicam a ensinar, a formar e a prestar um serviço público de educação em vez de servirem para jogos de poder entre esquerda e direita, sindicatos e ministério, professore­s e carreiras. Uma escola centrada nos alunos é intoleráve­l à nossa “elite”. Uma “elite” que só fala de igualdade até conseguir marcar mesa no novo restaurant­e do Avillez. Ora, há poucas coisas que façam tanto pela igualdade, pela justiça social quanto os colégios com contrato de associação. Mas quem nos governa só aceita como projeto educativo as escolas da Parque Escolar e afere a sua qualidade pelos candeeiros do Siza Vieira e pelas estruturas para guardar esquis. Quem tem “elites” destas só pode ser masoquista.

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