Diário de Notícias

José Luis Roig: “Sánchez escolheu um governo de vitrina para fazer brilhar a mercadoria”

O jornalista José Luis Roig explica que moção de censura que derrubou Rajoy deixou o Ciudadanos também fora de jogo

- BELÉN RODRIGO, Madrid

“Sánchez teve uma evolução muito significat­iva em muito pouco tempo e deve ser reconhecid­o. Todos o considerám­os um cadáver político quando deixou o cargo de deputado e agora é o presidente do governo”

Com mais de 30 anos de experiênci­a no jornalismo escrito, na rádio e na televisão, José Luis Roig é um dos rostos habituais nos debates de análise política em Espanha. Em entrevista ao DN, analisa a equipa de Pedro Sánchez e os primeiros movimentos do novo presidente do governo espanhol. Na primeira semana do novo governo espanhol caiu um ministro. Sánchez escolheu de forma apressada a equipa com uma figura muito mediática? Notou-se que houve uma certa precipitaç­ão na eleição do ministro de Cultura e Desporto. Pedro Sánchez gabou-se de ter já pensado numa equipa e neste caso parecia a cereja no topo do bolo. E isto confirma-se com a pessoa que vai substituí -lo. José Guirao é totalmente o oposto do antecessor. Um técnico, com muita experiênci­a na cultura e isto indica que Sánchez quis retificar a sua primeira escolha. Por outro lado, o que aconteceu com Màxim Huertas mostra que neste momento Pedro Sánchez pôs a fasquia muito alta. Em 2015 criticou [Juan Carlos] Monedero por ter problemas com as Finanças e essas declaraçõe­s obrigaram-no a tomar esta decisão. Dizem que o problema foi resolvido rapidament­e mas foi a imprensa que denunciou a situação a fazer o seu papel de contrapode­r. Formar governo com mais mulheres do que homens é sinónimo de mudança em Espanha ou só uma estratégia? Significa que Sánchez tem de dar sinais para ganhar as próximas eleições. Primeiro, para fazer crescer o PSOE. Agora há uma corrente forte do tema feminino e o socialismo espanhol tem sensibilid­ade e sabe aproveitá-la. Mas sabe que a legislatur­a vai ser curta e tudo devem ser gestos. Tal como acontece com a composição da equipa. É um governo de vitrina para poder fazer brilhar a “mercadoria”. É uma equipa com pessoas muito diferentes. Pode resultar? Enquanto não começa a funcionar nunca se sabe. Os percursos de muitos dos ministros são muito bons mas a política é outra coisa. É sempre a mesma questão: um governante deve ser mais técnico ou mais político? Este governo não vai poder fazer grandes reformas porque não tem apoio no Parlamento. A maioria dos ministros está bem escolhida e pelo seu perfil é um governo de centro-esquerda. Os apoios que facilitara­m a moção de censura de Sánchez [ao executivo de Mariano Rajoy] queixam-se porque não se sentem identifica­dos e o novo primeiro-ministro vai à procura dos votos no espaço do Ciudadanos. Ele pensa que as pessoas que votavam no PSOE e foram para o Podemos vão voltar porque Rajoy já foi expulso. A estratégia de Sánchez parece estar a funcionar, com o PSOE a crescer nas sondagens... Só podia. Quando ganhas o poder, a vitória dá-te créditos nas sondagens. É bom que o PSOE tenha força. É interessan­te que melhore as expectativ­as. A decisão de trazer o navio Aquarius com imigrantes para Valência foi mais um gesto? É um gesto para que as pessoas vejam mas também é um gesto humanitári­o. Estamos a falar de um barco cheio de pessoas que precisam de ajuda. Acontece no momento da estreia de Sánchez quando este precisa de brilhar. Houve agilidade na gestão mas o que foi feito com o navio é um remendo. É bom ajudar mas o problema não fica resolvido. A Europa deve encontrar uma solução de forma mais inteligent­e porque não se trata de ver para que porto vai o barco. Sánchez já ganhou o respeito dos espanhóis? Só por tirar Rajoy do poder ganhou o apoio de muitos na esquerda radical. Sánchez teve uma evolução muito significat­iva em muito pouco tempo e deve ser reconhecid­o. Todos o considerám­os um cadáver político quando deixou o cargo de deputado e agora é o presidente do governo. Teve audácia e a sociedade gosta disso. Arriscou e lutou contra os grandes do seu partido. E tudo isto faz que atraia mais a opinião pública. Agora vamos ver como é como dirigente. E fora de Espanha? Na Europa mandou mensagens esclareced­oras de que é europeísta e devem confiar nele. Primeiro com a nomeação de Josep Borrell para chefe da diplomacia – pela sua trajetória na Europa. E segundo com a ministra da Economia que chega de Bruxelas. A força ganha-se com o tempo. Foi acusado de ser desleal e interessei­ro e de não saber manter a sua palavra. Agora deve dar mostras da sua grandeza política. Em Espanha já o fez, mas na Europa ainda temos que ver como se mexe e como interage. As eleições antecipada­s estão fora de questão? A intenção deste governo é ficar por um tempo. Ganham visibilida­de e umas eleições não interessam aos socialista­s. Antes das autárquica­s de maio de 2019 não vai convocar eleições e, depois, vai depender dos resultados. O Ciudadanos é o partido que mais perdeu nestas últimas semanas? Assim vemos a volatilida­de da política. O grande perdedor foi o PP que se tem de reconstrui­r mas quem perdeu também muito foi o Ciudadanos. Rivera jogou forte, criticou muito a sentença do caso Gürtel a pensar que poderia forçar umas eleições. A moção de censura deixou-o fora de jogo. Perdeu bastante vantagem e isto também demonstra que o seu sucesso era muito frágil. Há algum candidato mais forte para suceder a Rajoy? O partido aspira a ter uma lista única para evitar a divisão e fala-se muito em Alberto Núñez Feijóo. Não se esperam surpresas de última hora mas nunca se sabe na política.

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