Western: aconteceu na Bulgária
VALESKA GRISEBACH Esclareça-se, desde já, o sugestivo título: Western não é uma recriação do género cinematográfico, mas partilha com este uma subtil reflexão sobre os códigos da masculinidade. Não há sequer uma linha narrativa bem definida. O olhar da realizadoraValeska Grisebach detém-se sobre um grupo de operários alemães, contratados para a construção de uma infraestrutura numa zona rural da Bulgária e regista a ansiedade que vai crescendo neste território estrangeiro, entre elevados níveis de testosterona… A câmara fixa-se sobretudo no rosto magro e solitário de um deles. Um semblante sereno que oferece à estética naturalista do filme uma leitura discretamente romântica. Este, qual cowboy melancólico, é a figura que monta um cavalo branco abandonado, e se aventura até à aldeia mais próxima para comprar cigarros, naquela que será a primeira de várias excursões à comunidade, sem entender uma única palavra de búlgaro. Justamente, parece ser nessa (quase) impossibilidade de comunicar que Grisebach alicerça uma visão sobre os jogos de poder que definem as relações masculinas – aqui entre alemães e búlgaros – marcadas pelos ecos da história política. Terceira longa-metragem de Grisebach, apresentada no Festival de Cannes em 2017, Western é, à semelhança do seu protagonista, um filme sem gorduras, mas com muita espessura humana. E a suspensão narrativa que o configura como testemunho de um “aqui e agora” seduz-nos pela imprevisibilidade das forças que vão mexendo com aquela paisagem, ou o modo como a sentimos. No fundo, o western reside nesta negação da escrita. Fica a imagem de um homem a cavalo. INÊS N. LOURENÇO