TENSÃO NO AEROPORTO DEZ FUNCIONÁRIOS AGREDIDOS
Violência. Atrasos, cancelamentos e over bookings deixam passageiros furiosos e violentos no aeroporto de Lisboa, onde a PSP perdeu um terço do efetivo de segurança nos últimos anos
“Os incidentes estão a crescer, quer em frequência quer em agressividade”
PAULO NETO LEITE
CEO DA GROUNDFORCE
Há 17 anos a trabalhar na Groundforce no aeroporto de Lisboa, Ângelo (nome fictício, pois pediu anonimato) passou o momento mais assustador da sua carreira no passado sábado. Estava na porta de embarque de um voo para o Brasil, quando foi anunciado que este tinha sido remarcado para o dia seguinte. “Os passageiros indignados começaram a procurar explicações junto aos funcionários que ali se encontravam, mas um casal não aceitou. Um deles puxou-me violentamente a gravata e deu-me um pontapé no braço. Refugiei-me no interior da porta de embarque para poder contactar as autoridades e utilizar uma saída de emergência, caso fosse necessário”, contou ao DN este profissional, com 50 anos.
É um dos dez funcionários da Groundforce – empresa que presta serviço nos check-in, portas de embarque, bagagens entre outros – que foram agredidos nos últimos três meses no aeroporto Humberto Delgado (ver coluna ao lado). Nesta segunda-feira, uma mulher foi “agarrada” com força nos braços por um passageiro que disse pertencer à GNR e que perdera o voo de ligação ao Porto. “Se a quisesse magoar a sério, magoava”, ameaçou a funcionária.
O medo instalou-se entre estes profissionais e a direção da empresa, solidária, não esconde a sua apreensão. “Os incidentes estão a crescer, quer em frequência quer em agressividade”, alerta o CEO, Paulo Neto Leite. No ano passado, houve um total de oito casos de agressão, concentradas, sobretudo, no final do ano, quando estes incidentes começaram em crescendo (até agosto tinham sido registados apenas dois). Desde outubro já foram 14, dos quais dez nos últimos três meses.
A causa apontada está diretamente ligada a um aumento dos casos de cancelamentos de voos, atrasos – que muitas vezes impedem as pessoas de apanhar os voos de ligação – e overbookings (mais bilhetes vendidos do que os lugares disponíveis). Alguns passageiros, a maior parte estrangeiros, não se conformam e passam à violência física e verbal. “Os aeroportos estão a operar perto do seu limite e com um aumento da irregularidade, o que origina situações de insatisfação dos passageiros. Não assistimos ao aumento dos meios de segurança de forma proporcional. Adicionalmente, assistimos hoje em dia a um sentimento de impunidade para com estes comportamentos bárbaros de alguns passageiros”, sublinha este responsável.
Nesta semana, Paulo Neto Leite já se reuniu com a ANA, entidade gestora do aeroporto, com a PSP e com a Autoridade de Aviação Civil, que tem responsabilidades na segurança. “No início da próxima semana juntaremos forças com os sindicatos no sentido de sensibilizar o poder político para a necessidade do reforço de meios e de alterações legislativas que entendemos serem necessárias”, como equiparar as agressões a estes funcionários a um crime público, cuja agravante poderia servir de dissuasor. O pedido de audiência com o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, seguirá hoje.
A Direção Nacional da PSP confirma que desde abril foram feitas dez detenções “decorrentes de situações em flagrante delito, em que funcionários foram vítimas de ameaça ou/e agressão”. Fonte oficial lembra que esta força de segurança tem como “preocupação permanente garantir a resposta célere às ocorrências diárias da operação aeroportuária”.
Carlos Oliveira, dirigente da Associação Sindical de Profissionais de Polícia (ASPP), o mais representativo da PSP, que ali presta serviço, assinala que o efetivo desta força de segurança no aeroporto não tem tido um crescimento proporcional ao fluxo de passageiros. “Perdemos mais de um terço do efetivo. A falta de pessoal é gritante e a necessidade de mais recursos humanos está à vista”, sublinha.