Diário de Notícias

Fernando Medina “Vai haver menos tempo entre autocarros e vamos reforçar carreiras em Lisboa ao fim de semana e à noite”

- CARLOS FERRO, em Nijmegen

Lisboa. O autarca foi a cara da candidatur­a de Lisboa ao prémio Capital Verde Europeia 2020. Apresentou e defendeu os projetos de mobilidade, habitação eficiente, requalific­ação de espaços públicos e após receber o troféu em Nijmegen, na Holanda, disse que as cidades têm de defender a sustentabi­lidade ambiental mesmo que contra os Estados

O presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, quer mais transporte público na cidade e uma relação próxima com os municípios vizinhos pois é de lá que chegam à capital grande parte das pessoas que diariament­e aqui trabalham e estudam. O que representa para Lisboa ser a Capital Verde Europeia 2020? Em primeiro lugar, o reconhecim­ento de uma estratégia política que se iniciou em 2007, que hoje se mantém e que visa cuidar da sustentabi­lidade da cidade. Isso significou uma política concreta em várias áreas: espaços verdes (no plano diretor municipal de 2012 tivemos um grande incremento com a duplicação para 400 hectares de espaços verdes, acrescenta­ndo 200 aos já existentes); espaços públicos (a arborizaçã­o e devolução do espaço público aos cidadãos); a atenção à drenagem das águas das cheias (com a aprovação de um plano de drenagem que está na sua fase de execução) e a aposta na mobilidade sustentáve­l, com a prioridade ao transporte público. E traduz-se em mais responsabi­lidades? É um prémio importante para uma cidade do Sul da Europa, uma cidade antiga, consolidad­a. Este prémio significa reconhecim­ento e ao mesmo tempo dá-nos muita força para continuarm­os. Reforça a nossa vontade e convicção, dá-nos ânimo, parceiros, mais visibilida­de e sentimos também que temos uma responsabi­lidade acrescida com esta distinção. Somos embaixador­es da causa da sustentabi­lidade e isso tem de ser valorizado. E como Lisboa vai dar voz a essa causa? Estamos a desenvolve­r o nosso projeto, todo ele organizado na ideia da sustentabi­lidade, na visão da sustentabi­lidade, seja económica, financeira, social, seja naturalmen­te ambiental. E estas políticas são integradas. Quando requalific­amos o espaço público e o devolvemos aos cidadãos estamos a tratar da sustentabi­lidade ambiental da cidade. Estamos também a tratar a sua sustentabi­lidade económica (com mais áreas de fruição, de comércio) e social, ao entrosar melhor o que são as diferentes representa­ções sociais da cidade que passam a viver e a conviver num espaço público em vez de um espaço mais privado. Há algum exemplo do que diz projetado? Vamos abraçar o projeto de requalific­ação da Praça de Espanha, transforma­ndo uma zona árida de circulação automóvel numa grande zona de fruição pública. No fundo estamos a cumprir vários objetivos de sustentabi­lidade ao mesmo tempo. Temos já no nosso programa um conjunto muito ambicioso de medidas e iniciativa­s, um esforço enorme no que diz respeito ao transporte público – este é o primeiro mandato em que a autarquia é proprietár­ia da Carris –, e a partir de setembro começam a chegar os novos autocarros. No total serão mais 200, cerca de um terço da frota atual da empresa. Serão autocarros ambientalm­ente mais sustentáve­is e que aumentam a capacidade de oferta de forma significat­iva. E que nos vai permitir reduzir carros e emissões ao mesmo tempo que melhoramos a nossa competitiv­idade e a nossa qualidade de vida. É um reforço da frota ou uma substituiç­ão? De início será reforço e depois quando começar a chegar a segunda leva vamos substituin­do os autocarros mais antigos. Mas a nossa preocupaçã­o agora é a de aumentar a resposta [aos utentes]. É disso que a cidade precisa. Depois, numa segunda fase, vai-nos permitir abater à frota aqueles que são hoje autocarros mais antigos, mais poluentes, que já não deviam estar ao serviço. Quando diz que a Carris vai ser reforçada, de que forma isso vai refletir-se no dia-a-dia das pessoas? Vai significar menos intervalos e tempo de espera entre os autocarros, mais carreiras, algumas em sítios diferentes da cidade e em horários diferentes. Este reforço vai ter essa dimensão. E já está decidido onde vão ser essas novas carreiras e reforços? Toda a zona de Alcântara, Ajuda, Belém, e também Beato e Marvila. As ligações destas zonas ao centro são prioridade­s a que temos de dar resposta, também quanto ao transporte ao fim de semana e à noite, que foi muito cortado nessas freguesias. Os investimen­tos relacionad­os com a mobilidade estão apenas focados na Carris? Estamos a analisar e vamos fazer um investimen­to na rede de elétricos. Lisboa tinha uma rede muito abrangente que ia a muitos locais da cidade. Foi um grande erro ter sido destruída, termos abdicado dessas infraestru­tura extraordin­ária. Agora o que vamos fazer é recuperá-la. Vamos fazer a ligação que falta do 24 do Largo Camões até ao Cais do Sodré; vamos levar o 15 numa primeira fase a Santa Apolónia e depois até ao Parque das Nações. E estamos a trabalhar com os municípios vizinhos para também estender a rede de elétrico. E é para chegar onde essa rede? Ainda não quero concretiza­r, mas há algo que posso dizer: há um diálogo avançado com Oeiras relativame­nte à extensão até à Cruz Quebrada, pois a infraestru­tura já lá está e é operaciona­l. Precisamos de fazer a aquisição de material circulante. A seu tempo se saberá no que estamos a trabalhar. É uma coisa mais ambiciosa para o regresso dos elétricos, que vai implicar um investimen­to muito significat­ivo na aquisição de material circulante, material novo. O elétrico tem uma dupla capacidade: meio pesado no sentido de conseguir transporta­r muita gente por hora com qualidade e eficácia, se os canais forem bem desenhados, e, ao mesmo tempo, é mais amigo do ambiente. Que estratégia­s estão a ser preparadas na área metropolit­ana para concretiza­r essa mobilidade que diz ser essencial para Lisboa? Ao nível da área metropolit­ana contamos ter em setembro o plano geral com os investimen­tos que cada câmara entende que devem ser feitos para a melhoria da mobilidade. E este é um programa da maior importânci­a para Lisboa; a cidade nunca resolverá sozinha o seu problema de mobilidade. Hoje, entre metade a dois terços da população ativa que está em Lisboa (a traba-

lhar ou estudar) vem de fora da cidade. Ora, se não houver transporte público é muito difícil a mobilidade dentro da cidade. Tudo isto são iniciativa­s muito importante­s. O que já está a ser feito na área metropolit­ana? Neste momento estamos a trabalhar muito intensamen­te com todas as câmaras municipais da área metropolit­ana no sentido de definir em concreto quais os projetos que são necessário­s para ter um sistema interligad­o que seja eficaz, acessível, mais económico e realista, um sistema que com investimen­tos mínimos aumente o que damos às pessoas. É um trabalho muito importante e motivador. A Área Metropolit­ana de Lisboa (assim como a do Porto) assumiu que a questão da mobilidade, da sustentabi­lidade ambiental e dos transporte­s devia ser a grande prioridade do próximo quadro comunitári­o de apoio numa cimeira que tivemos com o governo. E é esse programa que estamos a desenvolve­r. Na candidatur­a, Lisboa deu ênfase ao mediatismo da cidade como um ponto positivo para a divulgação das questões relacionad­as com o ambiente. É mesmo? Ou aumenta a pressão para ter resultados? Esse desafio já existe, já está no terreno. É exigente ter de adaptar os sistemas da cidade ao aumento do turismo e ao aumento do emprego que o turismo gera. É um desafio muito exigente, seja nos resíduos ou nos transporte­s. Esse desafio já está muito presente hoje e nós temos de o resolver. Temos é de aproveitar também o que é de grande valor. Obviamente que o turismo traz-nos grande valor no emprego, de abertura ao mundo, de reconhecim­ento internacio­nal, e há que aproveitar essa dimensão, essa visibilida­de, para mostrar melhor aquilo que estamos a fazer, para dar voz a esta causa. A causa da sustentabi­lidade é central em todas as comunidade­s. Nem todas. Mesmo a nível mundial... É um desafio que se torna mais exigentes nas cidades na medida em que os Estados estão a recuar, na Europa, mas fundamenta­lmente na América, com o abandono do Acordo de Paris [aprovado em 2015 por 195 países que se compromete­ram a reduzir as emissões de gases com efeito estufa para tentar manter o aumento da temperatur­a média global em menos de dois graus centígrado­s] por parte do atual presidente dos EUA, Donald Trump. Este foi um sinal político muito negativo. E se já era difícil, lembrando António Guterres [secretário-geral das Nações Unidas], cumprir os Acordos de Paris e que tivessem eficácia para nos permitir conter o aqueciment­o global, muito mais difícil se torna quando há adversário­s de peso a contrariar. Quando os Estados Unidos se colocam numa posição de adversário, torna-se tudo mais difícil, mas também nos obriga mais a assumir a nossa responsabi­lidade. E as cidades estão a fazer isso cada vez mais. Há casos por todo o mundo de grandes cidades que estão a assumir esse papel da sustentabi­lidade, e muitas vezes contra o Estado. Conhecem bem as dificuldad­es que enfrentam, por isso cidades como Paris, Detroit, Los Angeles, Barcelona ou Madrid têm estado empenhadas na causa da sustentabi­lidade. E este prémio vai-nos dar mais voz, mais força, para nos juntarmos. Foi essa convicção e os projetos previstos e em andamento que “conquistar­am” o prémio para Lisboa? Sim, não tenho dúvidas. Estamos nesta linha política antes de sequer pensarmos em concorrer ao prémio. Temos uma profunda convicção nesta visão para o futuro da cidade de Lisboa. E talvez o que tenha pesado foi a forma convicta como transmitim­os. Não adaptámos nada para o galardão, pelo contrário. Temos de ser capazes de pôr no terreno projetos emblemátic­os, projetos que resolvam problemas para chegarmos a 2020 e sermos uma montra para a Europa, um exemplo. Esta é também uma responsabi­lidade que a Comissão Europeia também nos pede.

“Vamos abraçar o projeto de requalific­ação da Praça de Espanha, transforma­ndo uma zona árida de circulação automóvel numa grande zona de fruição pública” “Reforço da Carris vai significar menos intervalos e menos tempo de espera entre os autocarros, mais carreiras, algumas em sítios diferentes da cidade e em horários diferentes” “O abandono do Acordo de Paris por parte de Donald Trump foi um sinal político muito negativo. Se já era difícil cumprir, muito mais difícil se torna quando há adversário­s de peso a contrariar”

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Fernando Medina e o vereador Sá Fernandes com a comitiva da câmara que esteve na Holanda para a eleição da Cidade Verde Europeia

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