DN, um diário para os nossos dias
No virar para a próxima semana, o DN vai mudar. Pequena mudança, o que nos vai acontecer a partir de domingo, 1 de julho. Diz bem a nossa campanha publicitária: “Ao minuto durante a semana – Sem horas ao domingo.” Traduzido por imagens: segunda, terça, quarta, quinta, sexta e sábado, a informação é consumida como uma rápida bica diária; ao domingo, como um capuccino cremoso e de espuma desenhada... Jornal sôfrego e jornal caprichado, ambos jornais mas diferentes, sejam os dias de trabalho ou de lazer. Assim, o DN será exclusivamente online à semana; já ao domingo, em papel, deliciosa e preguiçosamente saboreado...
Outros estariam nervosos, como perante uma revolução... Que exagero! A idade, e já vamos a caminho dos 154 anos, dá-nos a sábia noção do quanto é relativo o nosso mudar. Afinal, coisas destas – saltos grandes e riscos certos –, olhados pela nossa história, são simples adaptações à modernidade. Por favor, venham comigo visitar outras tantas mudanças do DN. Na longa história do DN há uma revolução e, essa, não é o que vai acontecer no próximo domingo. Mas a essa, já lá vamos, mais à frente.
Entretanto, eis a primeira mudança que fez o DN: em 1871, ia o jornal com cinco anos, e a capa foi um brinde aos assinantes: um desenho assinado pelo jovem Rafael Bordalo Pinheiro, então com 25 anos. A imagem mostrava o fundador do DN, Eduardo Coelho, pedalando uma bicicleta e o seu sócio Tomás Quintino Antunes equilibrando-se sobre um círculo... Ora as rodas da bicicleta e o círculo da acrobacia eram moedas de 10 réis. Não eram só moedas, mas todo um programa, a base de um negócio, o pilar de um destino. Esses 10 réis, a mais pequena moeda portuguesa daquele tempo, era quanto custava o jornal. E ela significou o programa que levou o jornal ao sucesso. Custar pouco para vender muito; vender muito para ter publicidade e ganhar dinheiro; e ganhar dinheiro para trazer os melhores a fazer o jornal. Os melhores, como esse grande Bordalo que fez o desenho.
Tudo isso é a explicação do negócio, mas onde está a tal mudança que a minha crónica de hoje prometia mostrar? Pois, ela é o desenho. Desde a sua fundação, o jornal era graficamente sóbrio. Curtas notícias alinhadas a uma coluna, sem título, só separadas por um filete tipográfico. Só letras. Até então, o jornal limitarase a ser o que o seu título, Diário de Notícias, indicava ser: diário e de notícias. Notícias, curtas e bem escritas, todos os dias. Com aquele desenho, o DN reconheceu que a imagem era também informação. Eis a primeira mudança que fizemos, vai para quase século e meio! Se para ela recorremos a Rafael Bordalo Pinheiro, é porque no DN, mesmo em meras mudanças, trazemos os melhores para as fazer.
Tendo entendido que jornalismo se faz também de imagens, fomos por aí. Em 1877, publicamos a primeira ilustração, um mapa da guerra russo-turca. No primeiro DN, em 1864, sobre a Guerra de Secessão americana, publicámos uma curta notícia sobre um discurso do presidente Lincoln. Um pouco mais de uma dúzia de anos depois, já publicávamos um pormenorizado mapa onde se assinalava o “Mar de Azov” e “Sebastopol” e o rio “Euphrates”... Que revolução! Perdão, para nós, uma simples mudança.
Em 1895, inspirados pelo Carnaval, outra novidade: as Caraças do Dia, caricaturas de Bordalo. O traço, já não só simples imagem, mas também capaz de análise cáustica. E o que começa em enorme, com Bordalo, não podia senão exigir continuar com os melhores: o Celso Hermínio, o goês Leal da Câmara, que veio de vedeta em Paris, onde fazia capas de L’Assiette au Beurre, um marco europeu do jornalismo satírico... Desenhos desaguando nesse fecundo e imensamente belo, claro e tão moderno Stuart, ainda hoje nosso lápis (vai reaparecer no DN, já no domingo), apesar de ter morrido em 1961. Grandes nomes cá de casa, que protagonizaram, num género maior do jornalismo, uma só e simples mudança.
Outra mudança: em 1901, Roque Gameiro (desculpem, a modéstia de mais um desconhecido...) ilustra, em caracol, a rainha Vitória, em diversas fases da sua vida. De criança, em 1828, até à velha rainha, imperadora de meio mundo, apoiada numa bengala, em 1899. A primeira infografia da imprensa portuguesa... E na edição de 27 de junho de 1907, o retrato, a meio corpo, do oficial José Joaquim Caldeira Pires, acabado de ser investido no comando de Infantaria 26. Não foi exatamente a figura maior da Exército português do século XX – mas foi a primeira fotografia do DN. Outra mudança.
Como eu estava a dizer, mudanças tivemos muitas. Agora vamos para mais uma: durante a semana, passar para online, como a moderna tecnologia nos permite. Simples mudança, como há 110 anos pôr-nos uma foto na capa. Uma revolução é outra coisa, é fazer o que fez Eduardo Coelho: inventar o jornalismo em Portugal. Antes dele havia folhas literárias e folhas políticas – ambas paroquiais. Jornal para todos (com ou sem papel, mas com tudo que a modernidade nos foi propiciando, desenhos, fotos, online...), isso continuaremos a fazer: “Ao minuto durante a semana – Sem horas ao domingo.” Online à semana, papel ao domingo. Enfim, um jornal para os nossos tempos.
Jornal sôfrego e jornal caprichado, ambos jornais mas diferentes, sejam os dias de trabalho ou de lazer. O DN será exclusivamente online à semana; já ao domingo, em papel, deliciosa e preguiçosamente saboreado...