Diário de Notícias

“Devemos ter um Estado social forte, mas alguém tem de o pagar”

A economista Teodora Cardoso, presidente do Conselho de Finanças Públicas, foi a convidada desta semana do ciclo de entrevista­s 30 Portuguese­s, Um País, uma iniciativa do grupo hoteleiro PortoBay, em Lisboa.

- —MARIA JOÃO ALEXANDRE redacao@dinheirovi­vo.pt

É a economia que, na opinião de Teodora Cardoso, tem de financiar o Estado social. “A minha ideologia é que devemos ter um Estado social forte. E isso faz-se não no papel mas com medidas políticas que coloquem a economia a financiar o Estado social.”

“O Estado social é um direito, mas custa dinheiro e alguém tem de o pagar ”, alerta a presidente do Conselho das Finanças Públicas, a primeira mulher a usar calças (e não bata) no Banco de Portugal, para o qual entrou como economista em 1973.

Enquanto falava, nesta semana, no hotel PortoBay Liberdade, junto à Avenida da Liberdade, em Lisboa, por ocasião do ciclo de 30 entrevista­s públicas sobre Portugal promovido pelo grupo hoteleiro madeirense, apontou duas oportunida­des que a levaram ao Banco de Portugal: não havia economista­s homens porque estavam na guerra colonial e porque eu falava inglês.

“Fui aprender inglês porque gostava de línguas estrangeir­as, mas nunca pensei no inglês como instrument­o de trabalho”, disse, sempre a sorrir, perante uma plateia atenta. Estava assim mais bem preparada do que outros para negociar com o FMI a ajuda a Portugal em dois períodos de crise: em 1976 e em 1983. “O FMI só falava inglês, era a língua oficial.”

Foi todo este saber acumulado que usou quando o FMI voltou para resgatar o país em 2011. “A contabilid­ade nunca disse muito aos nossos políticos”, critica, para fechar o tema das crises. Considera ter havido um preconceit­o ideológico da parte da União Europeia e do FMI sobre a experiênci­a do acordo do governo socialista com os partidos à esquerda, perguntou o entrevista­dor permanente desta iniciativa, o jornalista e escritor Luís Osório. “Quando nós [Conselho das Finanças Públicas] criticámos as políticas não foi por preconceit­o ideológico, mas porque não faziam sentido.”

Aconteceu quando se defendia a subida das remuneraçõ­es na função pública, de modo a aumentar a procura interna. “Certo, mas esse aumento de procura era de bens importados. Havia a ideia de que era preciso estimular o consumo dos portuguese­s e que as exportaçõe­s não tinham importânci­a. Ora, diz, “no ano passado foram as exportaçõe­s que puxaram pela economia e criaram procura interna”. Além disso, “a vantagem das exportaçõe­s é que também criam receita para pagarmos as importaçõe­s, e isso no início desta política não foi tido em conta”.

Quando decidiu usar calças e não bata como as outras mulheres que trabalhava­m no Banco de Portugal, na altura uma organizaçã­o puramente masculina, fê-lo naturalmen­te e não movida por uma consciênci­a feminista. Só se apercebeu do sinal que estava a passar quando lhe disseram que não podia ir de cal- ças para o trabalho. Mas isso não a fez mudar de modista e continuou a usar o que lhe parecia adequado.

“Nunca senti discrimina­ção por ser mulher”, e afirma que nunca foi adepta de quotas por considerar que criam um estigma. “Se há um grupo que precisa de uma quota é porque é inferior ao outro.”

Teodora Cardoso preza muito a sua independên­cia e admite ser “uma excelente educadora de cães”, um animal que sempre teve em casa. Lê muitos livros técnicos e a imprensa económica, mas para adormecer escolhe um bom policial escrito em inglês.

O ciclo de conversas 30 Portuguese­s, Um País, começou em maio de 2018 e termina em fevereiro de 2019. Sempre à terça-feira, às 18 horas, na Rua Rosa Araújo, em Lisboa, estão marcados os encontros que devem dar origem a um livro editado pela Guerra e Paz, a publicar no final de 2019.

“Nunca senti discrimina­ção por ser mulher (...) Se há um grupo que precisa de uma quota é porque é inferior ao outro.”

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—TEODORA CARDOSO Presidente do CFP

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