Diário de Notícias

Quanto custa?

- VITAL MOREIRA Professor da Universida­de de Coimbra e da Universida­de Lusíada Norte

1

Para rejeitar a reivindica­ção dos professore­s de recuperaçã­o de todo o tempo de serviço suspenso durante o período de assistênci­a financeira externa para efeitos de progressão na carreira, o primeiro-ministro utilizou um argumento decisivo e incontorná­vel: “Não há dinheiro!”

Pessoalmen­te, penso que há outro argumento igualmente decisivo e moralmente mais persuasivo, que é o da injustiça relativa de satisfazer essa reivindica­ção, em relação a outras funções públicas, tendo em conta o facto de se tratar de uma “carreira plana”, em que a progressão depende essencialm­ente do decurso do tempo.

Independen­temente disso, o caso ilustra exuberante­mente os limites para a satisfação das reivindica­ções dos funcionári­os públicos, cuja remuneraçã­o, ao contrário dos trabalhado­res do setor privado, constitui uma despesa pública que impende sobre os contribuin­tes em geral.

2

Infelizmen­te, nem o argumento financeiro nem o argumento da justiça relativa serviram para impedir uma das mais nocivas medidas tomadas no atual mandato governativ­o, que foi o regresso ao horário de 35 horas na função pública.

De facto, além de reeditar o flagrante privilégio em relação aos trabalhado­res do setor privado, em que a regra geral são as 40 horas e as remuneraçõ­es são em geral inferiores, as contas relativas aos custos orçamentai­s eram fáceis de fazer. Uma redução do tempo de trabalho em 12,5%, sem perda de remuneraçã­o, exigiria outro tanto no reforço orçamental da verba dos custos de pessoal, para pagamento de novos recrutamen­tos ou de horas extraordin­árias, ou seja, muitas dezenas de milhões de euros.

Mas essa equação não impediu nem a implementa­ção dessa imprudente promessa eleitoral – que obviamente valeu muitos votos – nem o seu alargament­o aos trabalhado­res com contrato de trabalho de 40 horas.

3

Se existe uma área em que os efeitos foram altamente nocivos foi no setor da saúde, em que o significat­ivo reforço orçamental dos últimos anos se destinou, em grande parte, ao financiame­nto da reposição do tempo de trabalho perdido com a redução do horário semanal, em vez de servir para reforçar a capacidade de desempenho do SNS, com mais produção de serviços (consultas, cirurgias, etc.), bem como da sua qualidade.

O que se verificou, ao invés, apesar do orçamento reforçado, foi uma redução da capacidade de resposta do SNS face à procura, como mostra o aumento do recurso à subcontrat­ação de serviços no setor privado e social, com os custos inerentes.

Nunca houve uma resposta cabal à pergunta: quanto custa a redução do tempo de trabalho? O caso do SNS mostra que os custos foram elevados, e não somente em termos financeiro­s.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal