O que pode ser um líder ideal para os tempos que correm
A verdade é só uma, há líderes para todos os gostos. Mesmo numa
época em que a verdade parece ameaçada, em que as narrativas se desenvolvem carregadas de armadilhas. O escitor, humorista e desenhador Pedro Vieira tentou responder à pergunta:
o que é um líder para estes tempos. Tomou cautela, caldos de galinha e rodeou-se de pessoas. E de dicionários.
Clarinho como a água, sem ademanes em torno de “potencialidade”, “inspiração”, “sucesso”, ou outros vocábulos diretamente saídos dos livros de autoajuda, disfarçados de livros de gestão, disfarçados de livros de autoajuda. Influência e comando. E gente em volta, delegando-lhes autoridade e seguindo-lhes os passos. Também eu me rodeei de pessoas, forma de garimpar conceitos e definições de líder, tentando recolher opiniões e perspetivas de proveniências distintas. Da política à religião, das ciências sociais à cultura. Uma recolha aqui e ali mediada por assessores, disponibilidades variáveis e rede telefónica escassa em locais de veraneio. Sim, porque os líderes também tiram férias e precisam de descansar. Adiante. O que é facto é que a atmosfera que se vive nos tempos que correm provoca inquietação. Olha-se para o Leste e a Europa parece mergulhada em contradições, faltas de entendimento crónicas – aquilo que em ciência política costuma chamar-se de “saco de gatos” – e escolhas lexicais que remetem para uma idade de trevas que preferíamos esquecer. A pretexto das migrações, do euro, do desemprego e da austeridade, desenterram-se discursos e tipos de personalidade que à partida casariam melhor com os anos 30 do século XX do que com uma utopia de livre circulação e bem-estar.
Olha-se para Oeste e vemos uma América em convulsão, confrontada com as suas próprias escolhas e capitaneada por um, digamos, líder que parece mais devedor de Dr. Strangelove de Kubrick do que dos chamados founding fathers. O caldo de cultura desta época é apimentado pela capacidade de comunicar, que se expandiu em progressão geométrica, e pela possibilidade de intoxicar, que beneficiou desse mesmo tipo de progressão. Razão pela qual importará fazer boas escolhas, filtrar, partilhar o destino com alguém que nos ajude a ver mais claro. Para usar uma metáfora do treinador Toni: “Isto no mundo, hoje em dia, está tudo muito complicado. É que antes vivíamos numa época de tostões e agora vivemos numa época de milhões.” Milhões de dólares, de vozes, de eleitores ansiosos, de razões para desconfiar. E no entanto o retorno obtido nesta minha garimpagem revelar-se-á otimista q.b.
Líder, o que é isso, afinal?
“Alguém que faz os outros sentirem-se pessoas com valor e os leva a agir voluntariamente e com gosto num projeto coletivo.” A definição é de Miguel Vale de Almeida, professor universitário na área das Ciências Sociais, que acrescenta ao falar seco dos dicionários a dimensão de aceitação por parte de quem é liderado. Uma definição que vai de alguma forma ao encontro daquilo que Rui Calafate, consultor de comunicação e profissional habituado a trabalhar (com) líderes, pensa sobre essa condição. “O que define um líder é a sua autoridade natural e o reconhecimento que a sua equipa ou a comunidade lhe conferem.” Ou seja, a auctoritas e as condições para a liderança serão algo que se conquista. Quanto maior o magnetismo, maiores as possibilidades. Rui acrescenta: “Há diversos tipos de líder e o que apresenta uma mais robusta base de apoio é o que assente numa liderança carismática.”
Tiago Cavaco é pastor batista e músico de panque-roque (definição do próprio). Por isso é natural que não se socorra da expressão “base de apoio”, embora “rebanho” cumpra a mesma função