Dividir ou juntar, o dilema dos nossos tempos
As chamadas questões fraturantes tomam conta dos nossos dias. E isso não acontece por acaso. O mundo está mais para fraturas e menos para uniões. O mundo está mais para diferenças e menos para consensos. É assim há muito, a internet e as redes sociais vieram dar gás ao sistema. E aos políticos que atualmente lideram os futuros da humanidade também lhes dá cada vez mais jeito dividir para melhor reinar. Este podia ser o mote desta edição. Não foi de propósito, como nunca é num jornal que se rege pela atualidade. Mas aconteceu que parece haver este fio condutor em muitas destas histórias e acabou por ser assim. Numa espécie de geometria do acaso.
Trump. Quando se fala de divisões é melhor começar por ele. Não apenas por causa dos que o odeiam e adoram. Não só porque, mais uma vez, na semana passada, no Reino Unido, o presidente norte-americano voltou a desunir, desta vez um país, entre os que se indignaram com a sua entrevista ao The Sun, imiscuindo-se na vida interna e criticando May, entre os que sentiram desprezo pela forma como deixou a rainha, uma senhora de mais de 90 anos, para trás numa parada militar, e os que adoram a sua visão do mundo e lhe dedicaram, até, o nome de um pub londrino. O que Paulo Pena conta nesta edição é algo mais grave. Antes de Trump chegar já Steve Bannon, o extraviado chefe de estratégia da Casa Branca, estivera em Londres a participar num encontro em que a extrema-direita pró-brexit, anti-imigração se reuniu com o beneplácito de dois dos mais importantes think thanks conservadores do Reino Unido. O objetivo parece ser mais sério do que as tontas atitudes de Trump indicariam: Trump vê-se como um líder populista e pretende validar-se através da mudança de política europeia. Até agora, parece estar no fio do tempo...
Por falar em extremos, a Valentina Marcelino obteve informação das autoridades de que os motoqueiros presos na semana passada estariam a preparar um ataque em massa na famosa concentração de Faro. Daí a polícia ter atuado com tamanha prontidão.
Embora a Judiciária desvalorize a questão política e diga que do que se trata é de bandidos – sejam os que ostentam esse nome no grupo de que fazem parte sejam todos os outros –, a verdade é que há ideologia por detrás destes homens de cabeça mais ou menos rapada, tatuados e pelos vistos também armados até aos dentes. Há a ideologia da intolerância e da violência, por muito que sejam os negócios do submundo do crime o que os move.
Euma vez que já falámos de dois exemplos de desunião, retomemos o fio de uma meada que se construiu da junção de opostos: a chamada, até depreciativamente, geringonça. Essa inovação político-ideológica portuguesa que parece ir ao contrário dos tempos. Na entrevista DN/TSF desta edição, Jerónimo de Sousa usa da palavra para acalmar ânimos, não se mostrar grandemente ofendido com as palavras de Augusto Santos Silva e garante que está tudo em aberto. Para o Orçamento e para o futuro. Fugindo sempre de respostas mais definitivas, claro.
Geringonça ainda mais estranha foi a que se constituiu entre a fadista Katia Guerreiro e o músico de intervenção José Mário Branco. Guru do novo fado, que se iniciou com Camané, o músico que neste ano comemora 50 anos de carreira fez agora a produção do disco da fadista. O DN assistiu a esta gravação e ao trabalho de filigrana e rigor que José Mário Branco e Manuela de Freitas – mulher, letrista, atriz e companheira – fazem quando agarram num artista. Reportagem exclusiva para ler nesta edição, no dia em que o vídeo com a primeira música do disco é lançada e está também em www.dn.pt.