Alimentação nas escolas chega ao Parlamento
Sopa, claro, e uma salada-russa toda às cores – o verde das ervilhas, o branco e o amarelo das batatas e do ovo, as cenouras, tudo cortado aos cubinhos, com umas folhas de alface. Depois a fruta, que pode ser ameixa ou cerejas, morangos, melancia, maçã ou melão. E uma vela acesa de propósito para a ocasião, no centro da enorme mesa retangular. A toda a volta sentam-se os 20 meninos dos 4 aos 6 anos do Jardim-de-Infância São Jorge, em Alfragide, e as educadoras que os acompanham na refeição. A vela, explica a diretora, Paula Martinez, “cria um ambiente bonito, de harmonia”. O almoço, diz, “também é um momento importante de sociabilidade e de partilha”.
Este seria, mais ou menos, o cenário ideal das escolas todas, se fossem aprovados os decretos-leis que o PAN e o PEV vão levar ao Parlamento nesta semana (ver texto ao lado) Este jardim-escola leva as coisas mais à letra. Os alimentos são aqui obrigatoriamente de origem biológica: os cereais e os legumes, o grão, o feijão e as lentilhas, a fruta, “que é muito variada”, o tofu, e também os ovos e o leite, que se servem aqui com menos frequência.
Neste jardim-de-infância às portas de Lisboa, há 35 anos que a alimentação é assim: saudável, a pensar “no todo harmonioso da criança em formação”, mas nem por isso menos saborosa e aromática. “As crianças comem-na muito bem e com muito gosto”, garante satisfeita Paula Martinez.
A Júlia, de 6 anos, acerca-se, curiosa. E ela gosta do almoço na escola? Júlia acena que sim. “É muito bom”, diz sem hesitações. E até tem um prato preferido. “É a massinha com molho de tomate, gosto muito, muito, muito”, diz cheia de entusiasmo. Margarida, da mesma idade, concorda. Já o feijão... Júlia faz uma careta.
Ovolactovegetariana, esta alimentação, assim pensada e cuidada, é um dos pilares em que assenta a visão pedagógica da escola Waldorf, que é a deste jardim-de-infância. O menu está estabelecido para cada dia da semana, sempre a começar com a sopa “de legumes tradicional”, explica a diretora. Depois, à segunda-feira há tofu, à terça são as leguminosas, como o feijão, o grão ou as lentilhas, à quarta come-se massinha integral com molho de tomate e queijo, um dos pratos mais populares entre as crianças, como já viu; à quinta é dia de tarte, “feita com farinha integral”, e à sexta-feira a refeição pode variar entre salada-russa e outras saladas de verão. A finalizar, como a meio da manhã, a fruta é obrigatória.
Aqui não entram carne nem fiambres, salsichas com batatas fritas, ou leite achocolatado e refrigerantes, nem mesmo leites vegetais que tenham açúcar adicionado. Tudo isso é processado e contém aditivos, açúcares e sal a mais, e conservantes de vários tipos – tudo nos antípodas da alimentação biológica que há muito é a escolha desta escola.
As crianças são habituadas desde pequenas – o Jardim-de-Infância de São Jorge recebe a partir do ano e meio – a este tipo de alimentos e de paladares, e isso “tem muitos benefícios para a saúde a longo prazo”, sublinha Paula Martinez. “Promove a consciência sobre as escolhas alimentares e, mesmo que depois na adolescência os miúdos passem por uma fase de menor critério, voltam mais tarde a comer de forma mais saudável.”
Para muitos pais, esta foi, aliás, uma questão decisiva na escolha. Ana Conceição, que tem ali as duas filhas, Violeta, de 4 anos, e Concha, de 2, não podia estar mais satisfeita. “É uma questão decisiva e eu fico supertranquila por saber que as minhas filhas têm este privilégio de uma alimentação saudável”, diz. Por causa disso, Ana até já mudou muito a forma como a família come em casa. Faz mais pratos vegetarianos, embora às vezes as filhas se queixem “de que na escola é melhor”, diz a sorrir. Decisiva é a questão da saúde. “O meu pai tem diabetes tipo 2, por causa da alimentação, e isso revolta-me.” Ana preferiu esta escolha e acredita nela.