Construção de casas dispara fora da capital
Do Ginjal à Ameixoeira, estão a nascer centenas de habitações. As imobiliárias estrangeiras descobriram um mercado por explorar: casas para portugueses de classe média.
As imobiliárias estrangeiras descobriram um mercado por explorar: casas para portugueses de classe média. Por isso, as obras não param, sobretudo fora do centro. Do Ginjal à Ameixoeira estão a nascer centenas delas.
Chamam-lhe menina e moça, mas Lisboa não para de crescer. Depois de dar o salto para oriente, a cidade das sete colinas está a conquistar espaço a norte. É no Alto do Lumiar que estão a nascer as casas novas dos lisboetas, com mais de 700 apartamentos programados para os próximos anos. A maior parte será oferta para os bolsos da classe média, garantem promotores.
Esta área é vista desde os anos 1980 como o futuro da capital. Representa 379 campos de futebol que, até 2030, acolherão 60 mil pessoas. Mas, até agora, só há uma pequena área construída. Depois da última crise, a empresa proprietária dos terrenos, a Sociedade Gestora da Alta de Lisboa (SGAL), diz estar a recuperar tempo com vendas a promotores privados.
“Temos um portfólio muito grande. Devemos ter vendido cerca de 10%, o que na dimensão da SGAL é enorme. Só esses 10% representam para cima de 400 apartamentos”, indica Miguel Lobo, diretor comercial da sociedade.
Na nova oferta vão entrar também 322 novas casas cuja construção foi iniciada no ano passado, no empreendimento Condomínio do Lago, o 12.o que será construído pela própria SGAL.
Nas casas de segmento médio da Alta, o preço de referência está em 280 mil euros por cem metros quadrados (m2). “Será muito difícil os preços irem abaixo disso”, diz Miguel Lobo. O valor compara com os mais de 421 mil euros por 100 m2 no preço médio da cidade durante o primeiro trimestre do ano.
Os promotores estrangeiros também já descobriram o caminho para lá da Segunda Circular. São 70% dos investidores em construção nova.
Hugo Santos Ferreira, vice-presidente da Associação Portuguesa dos Promotores e Investidores Imobiliários (APPII), confirma que já não é só nos centros históricos que os estrangeiros estão de olho. “Tem sido comum, nos últimos meses, registarmos o interesse de vários promotores e investidores imobiliários, nacionais e até estrangeiros, por novas localizações que não apenas nas zonas prime.” Dá os exemplos de centenas de fogos que estão a ser construídos em Benfica, Telheiras ou Lumiar.
Na APPII, que reúne os maiores promotores, 30% dos associados são agora estrangeiros: dos Estados Unidos, Reino Unido e Médio Oriente. Desde o final do ano passado – e mais, sobretudo, neste ano –, estes investidores, que vieram para recuperar a Baixa, perceberam que a periferia também oferecia oportunidades.
Hugo Santos Ferreira acredita que este ano “vai ficar marcado pelo regresso de alguns projetos fora do segmento alto, pretendendo apanhar um público mais abrangente”.
A expressão “casas para portugueses” está a entrar no vocabulário dos investidores. No início do mês, a promotora espanhola Kronos Homes anunciou que até ao final do ano pretende investir cem milhões de euros na construção de habitação para a classe média em Lisboa e no Porto.
Rui Meneses Ferreira, sócio da promotora, diz que para a Kronos os centros históricos estão fora de questão: “Não vale a pena investir num terreno com espaço para menos de 50 casas.”
Numa primeira fase, a imobiliária está a fechar “duas ou três” operações no Porto e em Lisboa e promete praticar preços “mais acessíveis” do que a média atual das duas cidades. O valor dos imóveis deverá começar nos 250 mil euros e rondar um preço médio de 400 mil euros. “Não podemos esquecer que estamos em Lisboa e Porto.”
Os últimos dados por município publicados pelo INE, de 2016, revelam que nesse ano foi autorizada a construção de 150 habitações em Lisboa; em 2008, tinham sido mais de mil. No Porto, a ten- dência de retração do mercado na última década foi semelhante. O número de licenciamentos passou de 814 para apenas 370.
A Confidencial Imobiliário fez as contas aos pedidos de licenciamento para habitação apresentados em 2017. Foram mais de 3300, sendo 70% para construção nova. Entre as zonas que mais chamaram a atenção dos investidores estão Santa Clara, Olivais e Marvila.
É precisamente num destes pontos do mapa da capital que está um dos novos empreendimentos mais badalados da cidade. Em Braço de Prata, vão nascer 499 casas novas até 2027, que vão acolher mais cerca de 2500 pessoas. Será um novo bairro a fazer a ligação entre o Parque das Nações e o centro da cidade, mas com projeto de autor e preços acima da média. As casas vão custar entre 400 mil e 2,7 milhões de euros. De 28 apartamentos prontos a habitar, 22 já têm dono. Entre os compradores, há um empate entre portugueses e estrangeiros.
Na nova habitação que se avista num horizonte próximo em Lisboa, também há projetos para o centro da cidade. Em Entrecampos, nos terrenos da antiga Feira Popular, surgirão 970 novas habitações. Destas, 700 serão postas no mercado de arrendamento a preços controlados pelo município e Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. O destino das restantes ficará na mão de quem as construir.
Em Carnaxide, há também um novo empreendimento em construção, o Sky City, com uma promessa de oferta de 370 casas com preços entre os 135 mil e os 500 mil euros.
Mas, a expansão do mercado de habitação de Lisboa começa agora também a cruzar o Tejo. Para o cais do Ginjal há planos de construir pelo menos 330 novas habitações.
A oferta de novas casas em carteira na capital está ainda assim longe daquela que os promotores dizem ser necessária para equilibrar um mercado aquecido. O setor calcula que só 70 mil casas novas a nível nacional – 35 mil delas em Lisboa e Porto – seriam capazes de normalizar os preços, mas as previsões apontam para números muito inferiores.
“A manter-se este ritmo, vamos terminar o ano com 17 a 20 mil casas novas, número que é significativo face ao que se tem registado no passado recente, mas que compara com as mais de 114 mil habitações novas licenciadas em 2001”, diz Manuel Reis Campos, presidente da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas.
O país está longe dos números de 2005, o último em que foram construídas mais de 70 mil casas em Portugal. Ainda assim, o setor tem motivos para acreditar numa recuperação.
Joaquim Montezuma aponta “uma subida da procura nacional, com a melhoria do rendimento disponível das famílias, o crescimento do emprego, as melhores condições de financiamento e a reduzida atratividade dos instrumentos de poupança tradicional”.
O consultor da ImoEconometrics lembra que “a forma mais efetiva de tornar a habitação acessível em Lisboa e Porto é através do aumento da oferta”. E a preços que os portugueses possam pagar.