Diário de Notícias

Energia: e se a Europa do sul resolvesse o assunto?

- Catarina Carvalho Diretora executiva

Apesar de todas as evidências sobre os vários tipos de escravatur­a que ainda existem no mundo do fabrico de vestuário, não deixamos de comprar ténis baratos, T-shirts a cinco euros, calças a dez. Aliás, raramente olhamos para uma etiqueta da roupa que compramos, e não olhamos quando vem nela inscrito um país onde essas práticas são hábitos. Nem desconfiam­os desses preços, para o que bastaria fazer simples contas de cabeça: as horas de trabalho, material, deslocação. Nada.

Nesse fechar de olhos reside parte do problema. Nesse não ver – ou, pior, não querer ver – está o álibi, a desculpa, ou simplesmen­te a razão por que muitas continuam na barbárie. Exatamente 70 anos depois da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e 50 depois do Maio de 68 – e do verão que se seguiu, como contamos no caderno 1864 –, tendo esta última data populariza­do muita da poesia que estava vertida nesses direitos, mas de maneira muito mais formal.

A desregulaç­ão dos mercados, a desmateria­lização da economia e a força da globalizaç­ão foram, aliás, causa e consequênc­ia da atualizaçã­o de muita dessa barbárie. Na indústria do vestuário e noutras. Como a da aviação. É disso, precisamen­te, que fala a reportagem do Carlos Ferro, uma viagem às rotinas das tripulaçõe­s aéreas do low-cost. Não se limitando a ler comunicado­s e propostas, o jornalista do DN foi mesmo falar com tripulante­s de cabine destas companhias. Descobriu um mercado de trabalho completame­nte desregulad­o, com falta de leis e condições. Nem todas as companhias que operam low-cost têm a mesma forma de atuar, e é também por isso que os funcionári­os da Ryanair protestam, numa luta que começou em Portugal e está a estender-se à Europa – na greve multinacio­nal que vai marcar esta semana.

De um ponto de vista mais positivo, Portugal está na liderança, mas desta vez do movimento do sul europeu para partilha de energia – é por isso que António Costa vai receber Emmanuel Macron e Pedro Sánchez numa cimeira tripartida. Como explica o Bernardo Pires de Lima, para o bem e para o mal, a questão energética há de dominar os nossos próximos anos, geopolític­a e relações internacio­nais. Nestes tempos, cuja complexida­de se expressa pelo mês de julho mais frio dos últimos anos, e em que os fogos se deslocaram para norte, ninguém poderá ignorar o quanto este binómio clima-energia é tão importante para nós. Costa, Macron e Sánchez vão debater a circulação energética entre os seus três países, o que, de uma penada, significa diminuição da dependênci­a do petróleo, e também do exterior, sobretudo desse outro binómio, recentemen­te explosivo, chamado Rússia-EUA.

Sobre tempos que mudam, foi esta semana aprovado o primeiro pacote legislativ­o que tenta regular o mercado de alojamento local – de aluguer de apartament­os proporcion­ado por plataforma­s. Que é, também, um sinal dos tempos. Quem diria que este negócio que haveria de mudar a face de cidades começou com o aluguer de colchões de ar a designers que queriam ir a uma conferênci­a em São Francisco e não tinham hotel para ficar, em 2008. Na convenção democrátic­a que elegeu Obama, em Denver, havia mais de 600 participan­tes que ficaram em apartament­os alugados desta forma. Seria sempre complexo legislar sobre algo que escapa à ordem das coisas que a lei tradiciona­l conhece, e talvez por isso, descobriu Fernanda Câncio, a lei que acabou por sair não agrada a ninguém. Nem aos donos dos apartament­os, nem aos seus vizinhos zangados, nem, por exemplo, à Câmara de Lisboa.

Sem consenso, um dos maiores críticos de Cristiano Ronaldo é o cronista desportivo John Carlin que a Patrícia Viegas entrevista nesta edição. Em junho, estava Portugal ainda no Mundial, escreveu ele no El País que Ronaldo tinha problemas de personalid­ade por causa do pai, que era alcoólico. Se os consensos nunca são fáceis e muitas vezes até são burros, as reações que Cristiano Ronaldo provoca parecem estar noutro nível, o que roça a irracional­idade.

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Macron estará em Portugal para debater com Costa e Sánchez a circulação energética entre os seus três países.
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Carlin que odeia Ronaldo.
Conversa com o jornalista John Carlin que odeia Ronaldo.
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Tripulaçõe­s low-cost estarão esta semana em luta por melhores condições de trabalho.
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