Guia para perceber as complicadas eleições brasileiras. Bolsonaro ou Lula?
Presidente da Comissão Europeia diz que extrema-direita austríaca não devia estar no mesmo grupo político europeu do que o partido de Le Pen (França) e o de Salvini (Itália). Teste das eleições europeias é em maio do próximo ano.
Já ninguém parece ter dúvidas de que, depois dos ganhos obtidos a nível nacional nos vários países da União Europeia (UE), a próxima batalha da extrema-direita para aumentar a sua influência será a das eleições europeias de 2019 (previstas para entre 23 e 26 de maio, consoante os Estados). Muitos têm feito soar alarmes sobre a anunciada intenção de Steve Bannon, ex-conselheiro de Donald Trump, estabelecer um think tank no coração da Europa, mais propriamente Bruxelas, para apoiar tudo o que são movimentos ou partidos de extrema-direita ou populistas de direita.
The Movement, O Movimento, será o nome da dita organização e pretende rivalizar com a Open Society Foundations, do filantropo George Soros, que durante décadas tem promovido a democracia liberal em território europeu. Isto numa altura em que líderes de alguns países da UE, como o húngaro Viktor Órban, defendem abertamente uma democracia iliberal, o regresso dos Estados nação que tenham por base o cristianismo. Apenas e só. Porque sim. O agitador Steve Bannon Bannon, ex-CEO do Breitbart News, site conotado com a extrema-direita dos EUA, começou há muito contactos na UE – mas também fora dela. Em março, discursou no congresso da União Nacional, ex-Frente Nacional de Marine Le Pen, em França. E também falou em Zurique, na Suíça, a convite de Roger Köppel, diretor da revista Die Weltwoche e deputado do Partido Popular Suíço. Sim, aquele que, em cartazes, retratava os imigrantes como ovelhas negras que os suíços deveriam expulsar. Na ocasião reuniu-se também com Alice Weidel, líder da Alternativa para a Alemanha (AfD), partido de extrema-direita alemão que ficou em terceiro lugar nas legislativas de setembro de 2017. Além disto, há uma semana, Bannon recebeu na sua casa, em Washington, o nacionalista Zeljka Cvijanovic, líder da República Sérvia da Bósnia e Herzegovina. A Srpska, apesar de ser uma das entidades que constituem aquele país dos Balcãs, nunca se convenceu com a ideia de não ser um Estado independente.
No meio de tudo isto, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, afirmou, em julho, que o Partido da Liberdade (FPÖ), liderado pelo vice-primeiro-ministro austríaco, Heinz-Christian Strache, deveria cortar relações com outros partidos de extrema-direita como a União Nacional de Le Pen ou a Liga de Matteo Salvini, o controverso ministro do Interior de Itália. “Eu quero que o FPÖ deixe esta aliança negativa [o grupo da Europa das Nações e das Liberdades no Parlamento Europeu]. Na minha opinião não pertence lá”, declarou o responsável máximo da Comissão. O FPÖ está atualmente no governo da Áustria, coligado com os democratas-cristãos do ÖVP do primeiro-ministro Sebastian Kurz. Áustria de 2000 vs. Áustria de 2018 A coligação que hoje governa a Áustria é a mesma que, há 18 anos, foi posta de lado pelos restantes parceiros da UE. Estava-se na segunda presidência portuguesa da UE. Esta tinha na altura 15 Estados membros e, numa decisão inédita desde a fundação do clube europeu, 14 decidiram isolar um e cortar todos os contactos. “A situação é sem dúvida diferente da de 2000”, escreveu no Twitter, em dezembro, Pierre Moscovici, comissário dos Assuntos Económicos e ex-ministro das Finanças francês. Então, mas afinal, há extrema-direita boa e má, populistas melhores e piores, consoante o timing, o país, os interesses do momento?
“Não está no interesse da Comissão neste momento tomar como alvo o FPÖ. Este partido é essencialmente a garantia da maioria do governo de Kurz, que pertence ao Partido Popular Europeu (PPE). A Áustria está agora na presidência da UE. Já vimos este tipo de tratamento diferenciado em relação ao governo de Órban e ao governo conservador da Polónia, ambos também parte do PPE. Os populistas de direita parecem beneficiar da associação à maior família política europeia. A juntar a isso, é preciso considerar que, a nível nacional, as fronteiras ideológicas entre a extrema-direita e os populistas do PPE são cada vez mais difíceis de estabelecer. Os primeiros tentam levar a sua mensagem até ao mainstream e mudam o discurso público. Os últimos tentam não perder mais votos para os radicais de direita”, diz ao DN o analista italiano Marco Giuli, do think tank European Policy Centre. Salvini ou o rei dos populistas Apesar da subida da extrema-direita, em países como a Alemanha, não são os populistas de direita que, de facto, dominam a agenda mediática atualmente? Veja-se o caso de Salvini e das suas políticas anti-imigração, em Itália, que vão ao ponto de abandonar barcos cheios de migrantes e refugiados à deriva no Mediterrâneo sem os deixar atracar nas costas italianas. E lançando-se numa espécie de jogo do empurra com os países vizinhos nesta questão.
“Há elementos muito fortes de oportunismo no que toca à Liga de Salvini. O partido está a fazer da xenofobia o centro da política que tem para oferecer – até agora com grandes ganhos. As sondagens dão a Liga como primeiro partido em Itália, com cerca de 30% das intenções de voto. A mudança na orientação da Liga surgiu com o facto de o seu antigo aliado Força Itália [do ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi] ter demonstrado abertura para uma aliança centrista com o Partido Democrático [do ex-primeiro-ministro Matteo Renzi]. A Liga reagiu reforçando a sua identidade extremista de direita e abriu-se a outras opções – algo que se materializou na atual coligação com o Movimento 5 Estrelas. Até agora isso tem re- sultado”, constata aquele analista do European Policy Centre.
Ver a extrema-direita e o populismo de direita na Europa, como um todo, é um exercício difícil de fazer, uma vez que há algumas divisões internas importantes. Um exemplo disso é a Finlândia, onde outrora o ex-líder dos Finlandeses Verdadeiros Timo Soini chegou a pôr em perigo a aprovação do resgate para Portugal. Nas legislativas de 2015, o partido, entretanto renomeado apenas de Finlandeses, elegeu 38 deputados. Em 2017 houve uma cisão. E hoje conta apenas com 17 eleitos na sua bancada parlamentar. Le Pen e o tormento de Merkel Sempre que se fala de extrema-direita na UE, o apelido Le Pen é incontornável. Desgastado por lutas entre pai e filha, o partido de Marine mudou de nome: de Frente Nacional passou a União Nacional. A mulher que em 2017 disputou com Emmanuel Macron a segunda volta das presidenciais deixou entretanto o lugar de eurodeputada. Hoje é um dos seis deputados do partido com assento no Parlamento francês. Entretanto viu um dos seus discípulos, Florian Philippot, sair e criar Os Patriotas. “Não é ainda claro até que ponto esse novo partido pode prejudicar de alguma forma Marine Le Pen”, afirma Marco Giuli.
No outro membro do eixo que sempre sustentou a UE, a Alemanha, Angela Merkel vê-se atormentada pela subida da AfD. A liderar uma frágil coligação CDU/CSU-SPD, a chanceler tem sido fortemente pressionada pelo ministro do Interior, Horst Seehofer, a adotar medidas mais duras em relação a migrantes e refugiados. O líder da CSU, que ameaçou mesmo demitir-se, teme o resultado da AfD nas eleições regionais de 14 de outubro na Baviera. “A jogada de Seehofer foi vista como sendo motivada pelo ego e procurando o caos político. Mas fez muito pouco para travar a subida da AfD”, refere aquele analista. No meio destes cenários, Espanha e Portugal são ilhas no meio do apoio à extrema-direita. Em março, no Parlamento Europeu, António Costa disse, num discurso sobre o futuro da Europa: “A globalização não se enfrenta fechando fronteiras ou erigindo muros, retrocedendo numa lógica protecionista ou deriva xenófoba.”
Steve Bannon, ex-conselheiro do presidente dos EUA Donald Trump, prepara-se para lançar um think tank destinado a apoiar movimentos e partidos de extrema-direita ou populistas de direita na Europa (sobretudo UE, mas pelos vistos pretende ficar só por aí).