O interior: o seu conceito e a sua realidade
Efacilmente aceitável por todos que o sucesso de uma iniciativa política decorre, com frequência, também da sua capacidade de concretizar a aceitação coletiva e consensual de uma mudança. Mas em poucos casos isso será tão evidente como com toda e qualquer iniciativa política ligada ao interior e à sua valorização. E porquê? Porque o desafio, nesta área, consiste não só na aferição das melhores respostas, concertadas e com visão de curto, médio e longo prazo, a uma questão que é profundamente estrutural, mas também no redesenhar de um conceito profundamente enraizado no imaginário português – o conceito de “interior”. Para alterar o conceito que temos do interior, urge alterar-lhe a realidade.
O nosso conceito de “interior” alterou-se significativamente com dois momentos da nossa história recente: com Abril e com a abertura à Europa. Estes dois momentos permitiram a Portugal quer reequacionar – pela conquista da liberdade – a relação entre o poder central e o poder local quer ter acesso a fundos que nos permitiram começar a afastar o estigma da assimetria territorial. Hoje, é claramente necessário continuar a lutar pelo abandono da trajetória insustentável da desarticulação. Porquê? Porque creio que a assimetria de oportunidades, quando instalada, pode ser facilitadora de fenómenos tão prejudiciais à democracia como é, por exemplo, a demagogia do populismo. A luta pela equidade regional e o combate à litoralização progressiva e excessiva devem ser, nesta medida, entendidos também como garante da democracia.
A desconstrução da ideia de que a interioridade de um território lhe desvirtua o potencial não se resolve com a mera construção de uma estrada que o atravesse. É necessária a (re)afirmação positiva do interior, articulando as medidas e as políticas com a especificidade dos territórios, criando assim condições para a vitalidade que apenas a fixação das pessoas pode trazer. E como fazer tudo isto?
A valorização do território é, indiscutivelmente, um desígnio do atual governo. O elenco das medidas eleitas é vasto e variado e assenta em vetores estratégicos como a coesão, a competitividade, a sustentabilidade e a qualificação. O reforço dos mecanismos de transferência de serviços públicos para o interior, com incentivos à mobilidade geográfica, em particular de funcionários públicos, os apoios e incentivos para a captação de investimento estratégico, a aprovação do estatuto da agricultura familiar e o alargamento do ensino superior no interior, garantindo a redistribuição regional de vagas nas universidades e nos institutos politécnicos públicos, são apenas alguns dos muitos exemplos.
Esta linha de atuação resultou da aposta num nível mais elevado de mobilização das comunidades para o processo democrático e para a definição de estratégias e soluções, possível apenas pela capacidade de aproximação do poder de decisão aos cidadãos e às instituições. Continuemos, então, a lutar juntos por um interior melhor para todos. Um interior que seja próximo e igual em oportunidades. Mas o que é então o interior, um território de baixa densidade populacional? Tenho dúvidas e não gosto deste conceito.