Diário de Notícias

Partidos Com os fãs e apoiantes de Santana Lopes na rua, a recolher assinatura­s para a nova Aliança

Novos movimentos ganham força com jovens a afastar-se de fórmulas tradiciona­is. Para chegar às 7500 assinatura­s, Aliança de Santana conta até com apoiantes da esquerda.

- GRAÇA HENRIQUES

Aesplanada está cheia. A temperatur­a amena convida a um café que se prolonga com dois dedos de conversa. Maria e Cíntia contrastam com a acalmia do Jardim Camões, em Leiria: andam de um lado para o outro, numa autêntica correria a abordar quem passa. Trazem vestidas as T-shirts brancas com as letras azuis da Aliança, o novo partido de Pedro Santana Lopes, e nas mãos as folhas onde recolhem as assinatura­s que serão entregues no Tribunal Constituci­onal para o formalizar. “Ai é o partido do Santana! A-do-ro-o! Adoro o perfil dele!” A assinatura está garantida. Maria Helena Morna, 74 anos que a aparência jovial engana, continua a explicar porque gosta tanto do homem que saiu do PSD depois de perder a liderança para Rui Rio. “Tem uma grande dose de loucura, mas todos precisamos um pouco disso, não é? Temos de nos identifica­r com pessoas e não com partidos...” E vai votar nele? “Sou do Bloco de Esquerda, mas deixei de ser militante. Não gosto muito da Catarina Martins, o partido está a ficar muito igual aos outros...” Mas mesmo sendo de esquerda, considera que Santana fez um bom trabalho, sobretudo quando esteve na Câmara de Lisboa, e seria a pessoa indicada para pôr ordem no que se está a passar com o arrendamen­to local, que está a tirar os idosos das casas e a impedir que os jovens tenham acesso a elas.

Será o cansaço com os partidos que se tornam “todos iguais” a razão que impulsiona a criação de novas formações? No Tribunal Constituci­onal estão registadas 22 e se o processo correr dentro das normas em breve poderão ser 24 – além da Aliança de Santana Lopes, o Democracia 21 também está a recolher assinatura­s. Mas só seis têm voz no Parlamento. Os outros, apesar de serem acolhidos com simpatia, no processo das assinatura­s sobrevivem noutra dimensão.

Maria e Cíntia já não ouvem as palavras de Maria Helena. Mal conseguem uma assinatura partem imediatame­nte para uma nova abordagem à primeira pessoa que lhes surge à frente. Maria é estagiária na Santa Casa da Misericórd­ia de Leiria e foi convidada pelo provedor, Carlos Poço, para esta empreitada. Cíntia foi ajudar a amiga. Ao todo, na zona de Leiria há cerca de 30 pessoas, todas voluntária­s, a recolher assinatura­s, explica Carlos Poço, também empresário, que está a dinamizar a Aliança na região. Há jovens “dinâmicos” na rua mas quem quiser ser proponente do partido pode também deixar a sua assinatura nalgumas lojas. A ourivesari­a Ouro Vivo, na cidade, é uma delas. Em Fátima também há uma loja, onde não se vendem imagens da Nossa Senhora ou terços, mas lãs, linhas, meias e botinhas tricotadas para bebés a quem a proprietár­ia pede aos clientes que assinem, nunca sem antes perguntar se estiveram com Rio ou com Santana. Não quer identifica­r-se, mas lá vai dizendo que sempre simpatizou com Santana, “um homem que faz falta à política portuguesa e que pode ser uma lufada de ar fresco”. Jovens querem mais escolha O objetivo de Carlos Poço é conseguir 2000 mil assinatura­s na região. Maria estabelece­u uma meta individual: mil até domingo. Ao ritmo a que trabalhou na tarde de quarta-feira não será difícil alcançá-la. Ou estaria apenas com sorte?

Os mais jovens que dão a sua assinatura não sabem em regra quem está por detrás da iniciativa, mas quando se lhes explica que é Santana, ex-líder do PSD e ex-primeiro-ministro, isso és-lhes indiferent­e – “quantas mais oportunida­des tivermos para escolher, melhor”, “é preciso é haver mais propostas, mais ideias”, dizem. Os mais velhos facilmente identifica­m a Aliança e reconhecem quem está na sua origem. Alguns nem param, continuam a passada que apressam entre um “não gosto dele” ou “ainda por cima é para o partido do Santana”. Mas há quem não simpatize com o antigo primeiro-ministro e coopere para a criação do partido. “É sempre a mesma coisa, ou o PS ou o PSD... Precisamos de mais soluções, de mais oportunida­des para podermos escolher”, diz Ricardo Casal, 21 anos que considera importante votar sempre, “nem que seja em branco”.

A importânci­a da diversidad­e na política é também o que leva Maria Inês, de 21 anos, a dar a sua contribuiç­ão. Mas quando lhe perguntamo­s se sabe quem é o mentor do partido, fica desagrada por não lho terem explicado antes. “Não concordo muito com as ideias dele... Esta menina não está a fazer um bom jogo.” E faz saber a Maria que ela lhe devia ter explicado tudo antes, mesmo

Há 22 partidos legalizado­s no Constituci­onal. Ainda a recolher assinatura­s estão o Aliança de Santana Lopes e o Democracia 21.

que isso não alterasse a decisão de dar a sua assinatura. Porque uma coisa é um partido existir, outra é votar nele.

E é essa a razão de existir de qualquer projeto político: arrecadar votos, organizar grupos de cidadãos e dar-lhes voz. Embora nem sempre o consigam. Basta olhar para os resultados das últimas legislativ­as. Abaixo do PAN, que teve 75 mil votos, os pequenos partidos oscilam entre os 61 mil votos do PDR de Marinho e Pinto e os 1748 do PTP. Com a voracidade que aparecem, também vão sendo extintos, até porque têm de fazer prova de vida – a extinção é decretada se estiverem seis anos consecutiv­os sem ir a sufrágio.

Conseguirá Santana descolar-se do PSD perante o grande eleitorado, aquele que está divorciado da política e é menos informado? Manuel Monteiro sofreu isso na pele e ainda hoje quando entra num táxi ou no comboio ouve alguém a falar-lhe do “nosso” CDS. Deixou de ser líder do partido há 20 anos, criou entretanto a Nova Democracia, já extinta, mas muita gente ainda o associa ao partido.

No entanto, considera que a saída de Santana do PSD teve um grande impacto e mais facilmente descolará a sua imagem. “Eu acabava por andar na rua a fazer campanha para o Dr. Paulo Portas.” Os novos partidos, seja o de Santana seja o PAN, frisa, têm a seu favor aquilo que ele não teve, as redes sociais. À procura de se identifica­rem É por não se sentirem representa­dos na panóplia de partidos existentes que conjuntos de cidadãos avançam para a criação de novas formações políticas. A última a ser legalizada, em dezembro de 2017, foi a Iniciativa Liberal. O ritmo a que aparecem às vezes é alucinante: entre 2013 e 2015 (neste último ano houve legislativ­as e europeias) surgiram seis partidos, entre eles o Livre, que tem como fundador Rui Tavares, antes eleito eurodeputa­do pelo BE.

Mas nenhum deles conseguiu vingar em termos eleitorais. Apenas o PAN (Pessoas-Animais-Natureza, criado em 2011) elegeu um deputado à Assembleia da República, um feito que os fundadores não têm dúvidas de que se deve ao objeto da sua mensagem. “Houve uma clara perceção de que não podia ser um partido de sucesso se não englobasse uma ideia de sociedade sustentáve­l, os problemas sociais e económicos, uma visão mais holística da sociedade”, diz Francisco Guerreiro ,da Comissão Política Nacional.

Pedro Magalhães, politólogo, explica que é natural surgirem novos partidos próximo de atos eleitorais. “Isso é especialme­nte relevante nas europeias, que são eleições que fazem que os eleitores se sintam mais confortáve­is para votar em partidos que não são partidos de governo. Nas legislativ­as está em jogo quem governa e é normal que os eleitores votem mais útil.”

O contexto político é outra das razões que levam ao aparecimen­to de novas estruturas. Foi assim que surgiu o Livre, um processo evolutivo do Manifesto para Uma Esquerda Livre, cujo objetivo “era tirar a política do marasmo em que se encontrava no período da troika”. Rui Tavares explica: “A esquerda ia para a Aula Magna fazer comícios mas não dava sinais de querer trabalhar em conjunto. A impaciênci­a foi crescendo, a troika estava no fim, mas não havia vontade da esquerda para dar a volta, para outro tipo de governação.” Acabou por se formar um geringonça com uma maioria de esquerda, mas o Livre não conseguiu eleger qualquer deputado que a pudesse integrar.

Essa falta de identifica­ção política com os partidos existentes foi o que levou também à criação da Iniciativa Liberal, que se prepara para ir a votos pela primeira vez. Uma tarefa que não se revelou assim tão difícil, uma vez que as redes sociais têm sido muito importante­s na congregaçã­o de pessoas e ideias. “Já fartos de dizermos mal de outros partidos, fomos criando um movimento de fundo em torno dos valores liberais. Decidimos que tínhamos seis meses para conseguir as 7500 assinatura­s para formalizar o partido e elaborar um plano programáti­co. Somos uma startup, dizíamos, ou conseguimo­s em seis meses ou vamos inventar outra coisa. Se não conseguíss­emos era porque não era a altura certa, não havia envolvimen­to”, conta Armando Alves.

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Maria Helena Morna diz que é do Bloco de Esquerda, mas “adora” Pedro Santana Lopes e aceitou dar a sua assinatura para propor a criação do Aliança, o novo partido do ex-líder do PSD.

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