“UE perde 1% do PIB em filas de trânsito”
Entrevista à comissária dos Transportes
Violeta Bulc veio a Portugal nesta sexta-feira e ficou a perceber porque é que o aeroporto de Lisboa teve, em agosto, o 21.º pior registo de pontualidade: o seu voo chegou com três horas de atraso. Cancelamentos, atrasos e filas gigantes tornaram-se neste verão sinónimo de Humberto Delgado, um aeroporto a viver acima das suas possibilidades. Para desespero dos turistas. Mas também dos nacionais.
“Os aeroportos encontraram modelos de negócio diferentes uns dos outros, como serem sustentáveis a longo prazo. Convido Portugal a comprometer-se em fornecer capacidade adequada a nível da aviação, porque este é um meio de transporte importante para o turismo, assuntos sociais ou os económicos. Não sei os detalhes do aeroporto de Lisboa mas espero que os acionistas deem passos responsáveis”, disse ao DN a comissária europeia dos Transportes. Em junho o diretor do aeroporto indicou que “estão reunidas todas as condições” para o governo decidir avançar com a alternativa do Montijo.
A juntar a isto, há as greves, sobretudo as da Ryanair. A próxima é no dia 28. Pilotos e tripulações denunciam condições de trabalho desumanas e a empresa teima que a legislação aplicável aos contratos de trabalho é a do país onde tem sede, ou seja, Irlanda. O Tribunal da UE decidiu que a Ryanair não poderá continuar a impor a lei irlandesa aos seus trabalhadores. Estes exigem que os contratos sejam feitos de acordo com a lei laboral dos seus países.
“Aqueles que reinam no céu também têm de reinar em terra. A Ryanair é agora a maior companhia aérea da UE, com o maior número de passageiros, então precisa ter responsabilidade social. É obrigatório respeitar as regras sociais. Então, penso que seremos bem-sucedidos para que a UE seja, em todas as áreas, um triplo A, incluindo na área social”, declarou a comissária europeia, nascida há 54 anos na Eslovénia, no tempo da Jugoslávia.
E se a tudo isto juntarmos ainda um cenário de caos em caso de não haver acordo sobre o brexit entre Londres e a UE na data-limite de 29 de março de 2019? “No que toca aos transportes [sejam eles o aéreo, o marítimo, o rodoviário, o ferroviário], há um grande desafio [com o brexit]. Mas é muito irresponsável, a nível político, assustar as pessoas porque isso causa pânico e reações extremas. A UE está a preparar-se, tem todas as simulações feitas, a situação na aviação é conhecida desde o primeiro dia da declaração do brexit, por isso, quem disser que isto é uma surpresa, está só a provocar dificuldades desnecessárias”, sublinhou Violeta Bulc, que participou em Lisboa no Oceans Meeting 2018.
No entender da comissária, é preciso que as ligações ferroviárias voltem a ser de novo uma prioridade na UE. Motivos: “24% da poluição vem dos transportes, é preciso tirar as cargas da estrada para os comboios, a UE perde por ano 1% do seu PIB em filas de trânsito [cem mil milhões de euros] e ainda morrem 25 mil pessoas nas estradas da UE e, por isso, é preciso libertar as estradas.”
Mais uma vez a comissária é confrontada com a realidade em Portugal: de um lado há investimentos de milhões na ferrovia e de outro falhas de serviço, supressão de comboios, redução de horários e problemas comerciais. O governo não quer ouvir a palavra privatização. Bulc, porém, só comenta a primeira parte: “No desenvolvimento das ligações ferroviárias, Portugal tem tido um papel importante. Aplaudo os planos anunciados e agora esperamos para ver os trabalhos de construção começar.”
O fim da mudança da hora na UE é outro dos dossiês que a comissária, que é cinturão negro de taekwondo e tem formação em práticas xamânicas, tem entre mãos. Segundo ela, na consulta popular, os portugueses que votaram foram maioritariamente favoráveis a ficar na hora de verão. “Vamos propor que a última vez que se muda a hora seja em 2019. Mas não decidimos que países ficam na hora de verão ou na hora de inverno. Quem decide com que hora fica são os Estados. Têm até abril. Depois a Comissão só diz: ou fazemos isto todos ao mesmo tempo ou não o fazemos.”
“Convido Portugal a fornecer capacidade adequada ao nível da aviação.”