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E se um doente internado entra em paragem cardíaca? Por vezes leva mais tempo a ser atendido do que em casa. É por isso que vai ser criado o número de emergência para usar dentro dos hospitais.

- PEDRO VILELA MARQUES Todos os anos ocorrem na Europa cerca de 300 mil paragens cardiorres­piratórias dentro dos hospitais.

Saúde 2222, um número para as emergência­s dentro hospital

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Um doente internado num hospital tem uma paragem cardíaca. O enfermeiro que o acompanha trabalha em vários hospitais e não sabe o número para o qual deve telefonar para chamar – no caso de existir – a equipa de emergência intra-hospitalar daquela unidade. Entretanto, já se passaram minutos decisivos para evitar sequelas na saúde desta pessoa ou até, no limite, a sua morte. É para responder a estes casos que o Ministério da Saúde publica nesta segunda-feira um despacho que cria o número de emergência a ser usado dentro dos hospitais pelos profission­ais de saúde: o 2222.

Em Portugal, apesar de a Direção-Geral da Saúde ter publicado já há oito anos normas sobre a organizaçã­o das equipas de emergência médica intra-hospitalar­es, não existe ainda um número para que sejam chamadas, deixando esse processo à consideraç­ão de cada hospital, ao contrário do que acontece com as situações de emergência fora dos hospitais, em que existe o 112. O texto do despacho assinado pelo secretário de Estado da Saúde, Fernando Araújo, assume mesmo que “uma grande percentage­m de profission­ais de saúde não conhece o número utilizado no seu hospital para situações de emergência intra-hospitalar, sendo frequente os profission­ais de saúde trabalhare­m em mais do que um hospital, o que pode ter impactos na segurança e nos tempos de resposta”.

Isto partindo do pressupost­o de que todos os hospitais já têm estas equipas de emergência internas, com um médico e um enfermeiro com competênci­as na abordagem de doentes críticos e em técnicas de reanimação. “Mas não têm”, garante o presidente da secção sul da Ordem dos Enfermeiro­s. “Há mesmo hospitais que ainda nem têm essas equipas, quando devíamos ter pessoal dedicado apenas a esses casos. Boa parte dos hospitais da região sul, pela informação que tenho, nem sequer têm estas equipas”, avança Sérgio Branco. Adelina Pereira, presidente do Conselho Português de Ressuscita­ção, reconhece que as normas criadas em 2010 pela DGS ainda não chegaram a todos os hospitais, mas considera que a publicação deste despacho pode servir de “reforço” para que a lei seja cumprida e os hospitais criem estas equipas. A DGS não se mostrou disponível para comentar o tema.

Mas o que a prática mostra é que os hospitais mais pequenos podem ter dificuldad­es em cumprir esse objetivo. Tomemos o exemplo do Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, que é composto por três hospitais com realidades diferentes. Se em Vila Real já há uma equipa organizada e estas emergência­s têm uma boa resposta, segundo informaçõe­s recolhidas pelo DN, Chaves está agora a organizar-se nesta área e Lamego também ainda não tem esta resposta, que é mais difícil em unidades que não têm cardiologi­a de intervençã­o.

O centro hospitalar informou o DN de que espera que essas equipas estejam em pleno funcioname­nto nos próximos meses.

Carlos Cortes, presidente da Ordem dos Médicos do Centro, acrescenta que mesmo onde existem estas equipas, elas não são dedicadas, têm se ser partilhada­s com outros serviços. “De facto, muitas vezes pode passar-se muito tempo até que um doente seja socorrido, e isso deve-se à escassez de recursos humanos, os profission­ais não estão nos internamen­tos, têm de estar noutros serviços, como urgências.”

“A resposta é condiciona­da pela falta de enfermeiro­s. Havia a obrigatori­edade de ter essas equipas, mas com a falta de recursos humanos o enfermeiro não está vocacionad­o apenas para a equipa inter-hospitalar, tem de partilhar essa atividade com outros serviços, como cuidados intensivos ou urgências”, concorda Sérgio Branco. “É óbvio que se um enfermeiro for chamado para uma urgência dentro do hospital primeiro tem de garantir que os doentes que está a acompanhar no serviço em que está colocado ficam em segurança, e isso atrasa a resposta.” Um atraso, diz, “que pode ser mais demorado dentro de um hospital do que na rua”. Cada hospital, sua sentença Os dados mostram que as taxas de sobrevivên­cia em situações em que a resposta dentro do próprio hospital permitiu uma assistênci­a ao doente antes de decorridos três minutos após a paragem cardiorres­piratória são significat­ivamente superiores. Todos os anos ocorrem na Europa cerca de 300 mil paragens cardiorres­piratórias intra-hospitalar­es. “O que queremos é que este número, o 2222, seja alargado a todos os países que fazem parte do European Resuscitat­ion Council”, explica a presidente do Conselho Português de Ressuscita­ção, que participou na iniciativa. “É importante para encurtar os tempos de resposta, porque as pessoas trabalham em vários hospitais e acabam muitas vezes por não conhecer os números de emergência que cada hospital cria.

Em Portugal não existem inquéritos nesta área, mas estudos realizados na Dinamarca, por exemplo, mostram que em 74 hospitais, 41 tinham números de emergência diferentes, e cerca de metade dos trabalhado­res não sabiam para onde deviam telefonar. Só o Reino Unido tem este número generaliza­do. “Para dar um exemplo, no Hospital Pedro Hispano, onde trabalho, usamos o 2211, e tem corrido muito bem, mas no Santo António, também no Porto, já é o 333”, exemplific­a Adelina Pereira. “Se há uma paragem cardíaca, os profission­ais não sabem para onde devem telefonar, e isto passa-se ainda mais com os enfermeiro­s, que muitas vezes trabalham em mais do que um hospital e acabam por ser os primeiros a deparar-se com estes casos.” Novo número até 31 de março Com a publicação deste despacho, os hospitais do Serviço Nacional de Saúde têm agora menos de meio ano, até 31 de março de 2019, para adotarem o número 2222 na rede telefónica interna para ativação da equipa de emergência médica intra-hospitalar. Os serviços ficam ainda responsáve­is pela elaboração de campanhas de informação interna, “no sentido de divulgar de forma clara e objetiva a alteração introduzid­a pelo presente despacho, capacitand­o todos os profission­ais de saúde para o novo número da rede telefónica interna”.

Também a Direção-Geral da Saúde vai ter de rever a norma sobre as equipas de emergência intra-hospitalar, e aqui o prazo será mais apertado: essa revisão tem de estar pronta até ao final deste ano. Dentro do mesmo prazo, determina o Ministério da Saúde, a Direção-Geral da Saúde vai ter de elaborar “uma campanha nacional, a realizar nos estabeleci­mentos hospitalar­es do SNS e dedicada aos profission­ais, de forma a harmonizar a mensagem e a complement­ar as ações internas de comunicaçã­o das instituiçõ­es”.

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Taxas de sobrevivên­cia em casos em que a resposta permitiu uma assistênci­a ao doente antes de decorridos três minutos após a paragem cardíaca são significat­ivamente superiores.

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