Diário de Notícias

“Vetos” ao alojamento local em Lisboa não chegam a uma dezena

Habitação. Nova lei permite que uma maioria de condóminos peça o encerramen­to de um alojamento local. Câmara recebeu cerca de uma dezena de pedidos e cancelou a maioria.

- SUSETE FRANCISCO

Passado mais de meio ano sobre a entrada em vigor da nova lei do alojamento local (AL), a Câmara de Lisboa recebeu uma dezena de queixas de condóminos, que pediam o encerramen­to de unidades de alojamento local nos seus prédios. Sem especifica­r o número concreto, a autarquia diz que na “maioria dos casos” a decisão foi no sentido do cancelamen­to.

A possibilid­ade de os condóminos pedirem o encerramen­to de estabeleci­mentos de alojamento local foi uma das questões mais controvers­as da nova lei. O debate começou, aliás, exatamente por este ponto, quando dois vice-presidente­s do PS avançaram com um projeto que permitia aos condóminos vetar a abertura de AL no seu prédio. A medida provocou polémica entre os socialista­s, que acabaram a apresentar um segundo projeto com uma versão muito mitigada

daquela proposta. O novo regime estabelece que a assembleia de condóminos “pode opor-se ao exercício da atividade de alojamento local”, uma decisão que tem de ser tomada por maioria, e como decorrênci­a da “prática reiterada e comprovada de atos que perturbem a normal utilização do prédio, bem como de atos que causem incómodo e afetem o descanso dos condóminos”. Uma vez tomada a decisão, o pedido tem de ser dirigido à câmara municipal. A lei atribui esta competênci­a diretament­e ao presidente que, no caso de Lisboa, a delegou no vereador do Urbanismo.

O DN questionou a autarquia sobre o processo que está a ser seguido nestes casos. Na resposta, a autarquia refere que é pedido ao visado – o proprietár­io da fração de AL – que se pronuncie sobre os factos alegados pelos condóminos (uma audição que é exigida por lei), a par de “ações de fiscalizaç­ão”. A câmara refere também que “está a contratar mais recursos humanos” para a fiscalizaç­ão do cumpriment­o do novo regime do AL, admitindo vir a realizar contratos com entidades externas, uma possibilid­ade que está prevista no novo regulament­o de AL da autarquia.

“As pessoas entendem-se”

Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), considera que estes números vêm provar que não existe um conflito entre o arrendamen­to de curta duração e a habitação tradiciona­l: “A prática veio demonstrar que esta questão tem uma dimensão menor do que se quis fazer crer.” Criticando a primeira versão da proposta do PS, que permitia a oposição dos condóminos a priori e “porque quero”, Miranda diz que a atual lei tem mais razoabilid­ade: “Na prática, as pessoas acabam por se entender. Mesmo que haja questões com algum caso em concreto, o facto de ter de haver uma decisão fundamenta­da da assembleia de condóminos obriga a que as pessoas conversem, a abrir um diálogo.”

Carla Madeira, presidente da Junta de Freguesia da Misericórd­ia – uma das áreas abrangidas pela proibição de abertura de novos alojamento­s locais –, diz ao DN que o fenómeno do AL estabilizo­u desde que boa parte da freguesia foi declarada como zona de contenção. O problema de queixas na convivênci­a entre moradores e ocupantes ocasionais é uma questão que não lhe tem chegado, afirma, antes de sublinhar que boa parte dos edifícios da freguesia com frações alocadas a arrendamen­to de curta duração têm um único proprietár­io.

Depois da corrida, a acalmia

Os últimos números do AL em Lisboa mostram uma quebra significat­iva na abertura de novas unidades. De acordo com números da ALEP, no primeiro trimestre deste ano, em comparação com igual período de 2018, o número de novas unidades “caiu 60%”. Uma quebra que se segue ao enorme aumento de registos que se verificou no ano passado, nos meses que antecedera­m a entrada em vigor da nova lei, com especial incidência em outubro, em que foram registados 1740 novas unidades (ver infografia). De acordo com dados da câmara, em janeiro e fevereiro deste ano abriram na capital 226 novas unidades de alojamento local.

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Na Travessa do Fala-Só, na freguesia lisboeta de Santo António, há cerca de 400 camas de alojamento local onde anteriorme­nte residiam 150 moradores.
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