Diário de Notícias

Contribuin­tes terão de devolver mais de mil milhões de euros em apoios covid

CONTAS PÚBLICAS Apoios à economia absorveram a fatia de leão do pacote covid, ficando com mais de 84% do bolo. Apoios à saúde valem 16% do total, diz a Unidade Técnica de Apoio Orçamental.

- TEXTO LUÍS REIS RIBEIRO

CONTAS PÚBLICAS O governo só abriu mão da cobrança de 518 milhões de euros num total de 1575 milhões em medidas de alívio, revelou ontem a Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Trata-se de adiamentos e moratórias de obrigações que serão cobradas mais tarde – se os devedores não entrarem em dificuldad­es mais sérias, o que é um risco real. As medidas para a economia absorvem a fatia de leão do pacote covid, ficando apenas 16% do bolo para a saúde.

Apenas um terço dos apoios do lado da receita contra os efeitos da pandemia covid-19 é permanente, ou seja, o governo só abriu mão da cobrança de 518 milhões de euros num pacote de 1575 milhões de euros em medidas de alívio (de receita), revelou ontem a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO).

Portanto, isto significa que o resto, mais de mil milhões de euros, são adiamentos e moratórias de receitas: não foram cobradas em 2020, serão cobradas mais tarde aos contribuin­tes, em princípio. Mas há riscos, claro. Se estas pessoas e empresas entrarem em dificuldad­es por causa do prolongame­nto desta crise, então essas receitas ficam em risco. Podem não voltar, avisa a UTAO.

Num estudo sobre a execução orçamental de janeiro a novembro, a UTAO, um organismo que presta apoio à comissão de orçamento e finanças do parlamento, diz que a referida quebra de receita de 1575 milhões de euros “reparte-se entre a perda definitiva (518 milhões de euros), que advém das medidas de isenção de obrigações contributi­vas, e a perda temporária, que resulta de medidas de adiamento de obrigações fiscais, contributi­vas e de pagamento de rendas de imóveis (1057 milhões de euros)”.

Isto pode permitir ao governo suavizar o impacto desta crise nas contas públicas mais à frente, uma vez que ainda tem a haver os referidos mil milhões de euros junto dos contribuin­tes.

Trata-se de um valor significat­ivo do ponto de vista orçamental, equivale a cerca de 0,5% do produto interno bruto (PIB).

Recorde-se, só a título de exemplo, que o défice estimado pelo governo para este ano (contando que economia recupera e não se afunda numa nova recessão, claro) é de 4,3% do PIB.

Segundo a unidade coordenada por Rui Baleiras, “o adiamento dos pagamentos por conta de IRC, embora com maior impacto orçamental até ao final do mês de novembro, constitui uma medida de caráter temporário, devendo a receita ser parcialmen­te recuperada em dezembro, no terminus do prazo de dilação desta obrigação fiscal ou compensada pelo aumento de receita em 2021”. Já a isenção de contribuiç­ões sociais “traduz uma perda definitiva de receita”.

No entanto, o grupo de especialis­tas deixa um aviso. “Deve ressalvar-se que as medidas temporária­s de diminuição de receita comportam um risco orçamental de perda permanente” para o governo, “que se prende com eventuais danos na capacidade económica dos contribuin­tes durante o período de dilação do calendário fiscal”.

A UTAO revela ainda que a resposta pública em medidas contra a pandemia covid totalizava (dados da execução orçamental até final de novembro) mais de 4,2 mil milhões de euros.

Ou seja, além do alívio na cobrança de receitas, o governo avançou com mais 2,7 mil milhões de euros em nova despesa.

Economia com maior parte das ajudas

Os apoios à economia absorveram a fatia de leão do pacote covid total, ficando com mais de 84% do bolo. Os apoios ao setor da Saúde ficaram em 16%.

“O esforço total das Administra­ções Públicas com reflexo no saldo global (4238 milhões de euros) pode decompor-se em medidas destinadas a apoiar a saúde, que valem 15,9% do valor total (673 milhões de euros), e medidas destinadas a apoiar a economia, que representa­m 84,1% (3565 milhões de euros)”, observa a equipa da UTAO.

Na parte dos apoios à economia, o domínio de intervençã­o com maior impacto orçamental direto é a prorrogaçã­o e isenção de obrigações fiscais e contributi­vas.

De acordo com a UTAO, esta rubrica vale 1571 milhões, ou seja, 37,1% dos referidos 4238 milhões de euros (o valor do pacote total contra os efeitos da covid).

De que medidas estamos a falar? Neste primeiro domínio, a UTAO destaca “a possibilid­ade de adiamento dos pagamentos por conta de IRC para dezembro (791 milhões de euros), seguida da isenção do pagamento de contribuiç­ões sociais (518 milhões de euros) para empresas enquadrada­s nas medidas de lay-off simplifica­do, apoio à retoma progressiv­a e incentivo financeiro extraordin­ário à normalizaç­ão da atividade empresaria­l”.

Ontem, o primeiro-ministro, António Costa, disse no Parlamento que “desde o início desta crise, a Segurança Social já apoiou mais de dois milhões de 400 mil pessoas nas suas mais diversas modalidade­s”. Referiu ainda que já foram apoiadas “mais de 21 mil pessoas chamadas trabalhado­res informais”.

“As medidas temporária­s de diminuição de receita comportam um risco orçamental de perda permanente”, avisa a UTAO.

No encalço do primeiro domínio de medidas surge “o apoio ao emprego e à manutenção da laboração”. A UTAO avalia este subconjunt­o de apoios em 1569 milhões de euros, o que também equivale a 37% do total.

Aqui, a unidade parlamenta­r diz que “as medidas mais significat­ivas são as restantes despesas públicas com o “lay-off simplifica­do” (821 milhões de euros; peso de 19,4% do total), bem como o apoio extraordin­ário à redução da atividade económica dos trabalhado­res independen­tes (271 milhões de euros; 6,4%), o incentivo extraordin­ário à normalizaç­ão da atividade empresaria­l (248 milhões de euros; 5,8%) e o apoio extraordin­ário à retoma progressiv­a (114 milhões de euros; 2,7%)”.

Em terceiro surgem “as medidas de proteção do rendimento das famílias”, que ascendem a 330 milhões de euros (7,8% do total). Há ainda outras medidas mais pequenas que no seu conjunto valem 95 milhões de euros (2,2%).

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Governo perdoou pouco mais de 500 milhões de euros de receita para os cofres do Estado em resultado da pandemia.

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