Diário de Notícias

O desenho do confinamen­to: escolher entre mortes ou dívida

- Daniel Deusdado

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Os dados que a consultora PSE tem partilhado ajudam a explicar se a esmagadora maioria dos portuguese­s está a falhar neste segundo confinamen­to ou não. A resposta parece ser “não”. No primeiro confinamen­to estavam em casa, em média, 65% a 70% dos portuguese­s. No domingo de Páscoa (12 de abril) chegou-se a um recorde: 79%. A verdade é que nas grandes cidades, onde os serviços imperam, a redução de atividade vê-se a olho nu (e nos telejornai­s). Mas não é assim onde predomina a indústria e a agricultur­a. Mais de um terço dos portuguese­s tiveram de trabalhar sempre, apesar da pandemia.

2 Os especialis­tas têm estimado 2,5 milhões de pessoas em mobilidade nas “escolas e universida­des”. Em abril estavam em casa 65% a 70%, das pessoas (incluindo escolas). Agora 40%. Desobediên­cia ou demasiadas exceções? Nenhuma das duas. Escolas + indústria + construção + produção essencial valeram na segunda-feira 60% da mobilidade dos portuguese­s.

3 Se queremos descer o número de infetados e mortalidad­e apenas à custa do grupo de casa (A), teremos de esperar muitas e muitas semanas (como ficou demonstrad­o no Infarmed por Baltasar Nunes e Manuel Carmo Gomes). É que estamos a pretender levar quase a “zero” a covid no grupo A, embora deixemo-la potencialm­ente a 100% nos grupos C e D. O desenho do confinamen­to foi feito para aceitarmos um valor médio/razoável de infetados e mortos.

4 Este desvio social nasceu de um problema económico: parar indústria e construção seria altamente dispendios­o para o Orçamento do Estado, apesar de altamente eficaz para combater a covid, como aconteceu nos países ricos da Europa. Aceitamos que morram (C+D) porque não podemos pagar para quase todos pararem (A+B+C). Em contracicl­o, pedimos aos que não trabalham (A) para que definhem economicam­ente. Estes têm saúde quase garantida e apoios, mas não podem morrer. Só podem falir.

5 É exatamente por isso que o segmento B– escolas e universida­de s–é tão crítico: ele reúne filhos de pessoas de todas as categorias( AeCeD).Aes colar edistribui­covidp ara todos os segmentos (desconhece­ndo-se cientifica­mente qual o grau de transmissi­bilidade em virtude da estirpe ). Ora, sem se abrandar a infeção por via deste grupo-alvo, não há estanquida­de no combate.

6 Podemos abrandar a pandemia mais depressa parando indústria e construção, além de escolas? É a grande questão de António Costa: dívida colossal ou óbitos colossais. Parece fácil decidir, mas não é.

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