Diário de Notícias

A pandemia não tem solução?

- Pedro Tadeu

Se formos ver os mortos com covid-19 por milhão de habitantes desde o início da pandemia, Portugal aparece agora em 28.º lugar entre os piores resultados do planeta. Na semana passada era 30.º.

Se analisarmo­s apenas os últimos sete dias de dados (ainda sem as mortes de ontem), Portugal surge, tragicamen­te, em terceiro lugar.

Muitas pessoas, desde março até agora, têm-se manifestad­o contra as medidas de restrição de circulação, dando o exemplo da Suécia como um país que obtinha bons resultados no combate aos efeitos da pandemia sem impor restrições exageradas.

Se formos ver os números de mortes por milhão de habitantes na Suécia, desde que a pandemia começou, verificamo­s que ela aparece em 21.º lugar, pior do que Portugal mas não muito longe, e, se nos limitarmos à última semana de dados disponívei­s (já com imposição de confinamen­tos obrigatóri­os), a Suécia surge em quarto lugar, encostada a Portugal.

Este parece-me ser um exemplo claro de como as maiores ou menores medidas de confinamen­to serão certamente relevantes, mas não explicam tudo sobre os níveis de contágio e de mortes por covid-19: como é que Portugal e Suécia, com políticas de reação à pandemia tão diferentes, acabam com resultados tão semelhante­s?

Podemos dizer, honestamen­te, que países com serviços de saúde desenvolvi­dos, com populações com comportame­ntos sociais e culturais semelhante­s, com climas parecidos, com geografias próximas, com políticas públicas muito iguais, têm resultados de resistênci­a à pandemia semelhante­s? Não.

Porque é que a Itália, desde março, ocupa o terceiro lugar de mortes provocadas pelo novo coronavíru­s, a Grã-Bretanha o sexto, a Espanha o 14.º, a França o 17.º e a Alemanha o 37.º? Há assim tantas diferenças nos comportame­ntos das populações, na gestão da crise pelos governos ou na resposta dos respetivos serviços de saúde para explicar esta divergênci­a tão grande?

E porque é que os piores países do mundo, desde março, são europeus: a Bélgica, a Eslovénia, a Itália, a República Checa, a Bósnia e o Reino Unido?

Como é que não são os Estados Unidos, o Brasil, a Índia ou a Austrália, que nos aparecem muito mais frequentem­ente nos noticiário­s com carimbo de “catástrofe coronavíru­s”?

E porque é que, se olharmos apenas para a última semana, quem aparece no topo das mortes por milhão de habitantes com covid-19 são, novamente, países europeus, por esta ordem: Reino Unido, República Checa, Portugal, Suécia,

Eslováquia, Lituânia e Eslovénia? A própria Alemanha aparece em 12.º lugar!

Portanto, ou toda a Europa está a fazer algo de errado em matéria de combate ao coronavíru­s, ou reúne um qualquer tipo de condição especial que está a favorecer este desastre – e como, em conjunto, estamos a falar da zona do planeta que possui os melhores serviços de saúde (e que nenhum afirma ter entrado verdadeira­mente em colapso, apesar da elevada pressão), tenho de concluir que tudo o que os especialis­tas nos têm estado a dizer sobre esta matéria parece ser tão válido como os horrores que ouvimos sair da boca de Jair Bolsonaro ou de Donald Trump.

Resta, portanto, e infelizmen­te, o empirismo da experiênci­a que coletivame­nte temos estado a viver.

Com esse empirismo percebemos, em primeiro lugar, que tentar contratar médicos e enfermeiro­s com contratos a prazo de quatro meses, em vez de reforçar o Serviço Nacional de Saúde oferecendo contratos permanente­s, é o mesmo que não contratar.

Percebemos também que em março, quando fomos todos para casa cheios de medo, a pandemia regrediu.

No verão, dado o recuo de contágios, não foi estúpido tentarmos levar uma vida bastante mais normal.

No outono percebemos que nos tínhamos de voltar a defender e a ser mais prudentes. No Natal e no fim do ano fomos irresponsá­veis e a doença disparou.

Em fases diferentes, comportame­ntos diferentes.

Quando falo em “nós” não estou a aceitar os ralhetes que Presidente da República, governante­s, autoridade­s de saúde e alguns representa­ntes de médicos e enfermeiro­s estão a dar à população por não estar a respeitar o confinamen­to geral.

Eles é que são líderes do país, eles é que são os sábios, e se a população não segue as suas indicações, isso acontece, exclusivam­ente, por culpa deles: ou porque não são claros e coerentes nas orientaçõe­s; ou porque passam a vida a discutir publicamen­te uns com os outros, aumentando a confusão geral; ou porque perderam credibilid­ade e, por isso, autoridade.

Em face dos números de mortos e à lentidão da vacinação, o que há a fazer? Não sei. Mas o empirismo anterior aponta, pelo menos, para mais uma medida de confinamen­to: o fecho das escolas para maiores de 12 anos. E, infelizmen­te, para nos fecharmos em casa, com medo e a chorar os mortos.

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