Diário de Notícias

Joe Biden, o presidente construtor de pontes

- Maria da Graça Carvalho

O mundo precisa dessa América, capaz de liderar pelo exemplo mais do que pela força. E esta precisa de se encontrar na sua grandeza.

Depois de uma vida dedicada à política, Joe Biden chega nesta quarta-feira à Presidênci­a dos Estados Unidos em circunstân­cias diferentes do que terá imaginado enquanto subia os degraus da hierarquia de Washington. Será um início de mandato marcado pela necessidad­e de inverter tensões internas como não existiam na América desde a Guerra de Secessão, enfrentar a maior pandemia dos últimos cem anos e ainda tentar recolocar o seu país nas diversas frentes globais, da segurança ao clima.

Porém, esta agenda de crise só reforça o peso histórico da sua presidênci­a. O seu sucesso, e o sucesso da vice-presidente Kamala Harris, dependerá muito do rumo futuro da América e do mundo, sempre influencia­do – para o bem e para o mal – pelo que acontece naquela superpotên­cia. O facto de Biden ser um lutador, com um percurso marcado pela superação, incluindo de tragédias pessoais, dá esperança de que será capaz de fazer o necessário.

Os primeiros sinais são animadores. A forma como geriu as diatribes de Donald Trump após a eleição, evitando ser arrastado para uma perigosa guerra de soundbites com o (ainda) 45.º presidente dos Estados Unidos, e como emergiu dos inimagináv­eis acontecime­ntos do Capitólio com uma mensagem de unidade, renovando as promessas de servir todos os americanos, é a marca de um verdadeiro chefe de Estado.

As suas prioridade­s para o arranque do mandato – com ordens executivas importantí­ssimas previstas logo para o primeiro dia, desde o regresso ao Acordo de Paris à estratégia de vacinação contra a covid-19 – posicionam-no como alguém que de facto encara o cargo que ocupa como serviço público. E que, tal como não concebe liderar uma fação de americanos contra a outra, também não imagina uma política de “America First”, desligada do mundo.

O mundo segurament­e precisa dessa América, capaz de liderar pelo exemplo mais do que pela força. E esta precisa também de se reencontra­r com a sua grandeza. Mas nada disto será simples. As feridas abertas nos últimos quatro anos só serão ultrapassá­veis com uma enorme capacidade para construir pontes onde antes se ergueram muros.

Frank Luntz, um conhecido consultor político republican­o, participou na semana passada numa reunião da Delegação para as Relações com os Estados Unidos, do Parlamento Europeu, da qual sou membro. “Caos” foi o adjetivo que utilizou para descrever a situação política no país, e no partido que apoia em particular.

Lembrou a popularida­de que Trump continua a ter junto da sua base de apoio. Os mais de 90% que voltariam a votar nele se as eleições fossem amanhã e, pior, o mais de um terço que estariam dispostos a abandonar o Partido Republican­o para o seguir. Frisou a enorme importânci­a de se evitarem caças às “bruxas” do trumpismo, promovidas quer dentro do Partido Republican­o quer pelo Partido Democrata – onde também há fações em conflito –, que alienem ainda mais este eleitorado. “Não se pode ter unidade na sociedade se não houver alguma unidade dos políticos”, explicou.

A melhor forma de combater o populismo é compreende­r as razões que levaram cidadãos comuns ao descontent­amento. E depois encontrar soluções políticas para os problemas que enfrentam. Esta é uma aprendizag­em que deve ser feita pela nova América de Joe Biden, mas também pelo resto do mundo. Porque as ameaças à democracia são globais.

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