Diário de Notícias

Porque não há um mercado de créditos de carbono em Portugal?

“As zoonoses representa­m 70% das doenças infecciosa­s que surgiram nos últimos 30 anos. A covid é o exemplo mais recente.”

- Jorge Costa Oliveira

O ministro do Ambiente – ocupado que está a montar centrais de produção de hidrogénio e “refinarias” de lítio – deixa correr o marfim.

Há muito que é reconhecid­o que a gestão profission­al da floresta é a solução para vários problemas. Desde logo, para o recorrente problema dos fogos florestais que todos os anos assola o país. Sendo certo que tal é reconhecid­o num matagal legislativ­o e regulament­ar, de “estratégia­s” a “planos”, num infindável hosana nas alturas de promessas de apoios à proteção florestal ou ao incremento da gestão florestal profission­al.

Todavia, quando se passa do plano das leis e regulament­os para a execução governativ­a, o ministro do Ambiente – ocupado que está a montar centrais de produção de hidrogénio e “refinarias” de lítio – deixa correr o marfim.

O melhor exemplo de gestão profission­al da floresta é o do grupo Navigator. Com exceção de um ano em que fortes ventos aceleraram a propagação do fogo, que entrou em área florestal do grupo, em nenhuma outra ocasião tal sucedeu.

Mas apesar do reconhecim­ento generaliza­do da necessidad­e de se estimular a gestão profission­al da floresta, poucas sociedades de gestão florestal (SGF) foram criadas. A razão para isso radica na dificuldad­e em fazer planos de negócios com taxas de retorno do investimen­to aceitáveis. Existe procura para a constituiç­ão de fundos florestais e respetivas SGF, incluindo de promotores internacio­nais, mas o ROI ou o IRR respetivo são pouco apelativos. O ROI ou o IRR seriam mais apelativos se existisse em Portugal um mercado de créditos de carbono, como sucede em muitos outros países. Nesses mercados, empresas que contribuem para a pegada de carbono compram créditos de carbono para fazer a respetiva compensaçã­o.

Foram já criadas entidades financeira­s especializ­adas – como o malogrado Luso Carbon Fund (LCF), que tencionava maximizar aplicações em fundos de carbono –, mas essas entidades faziam os seus investimen­tos no estrangeir­o; no LCF, o dinheiro dos investidor­es (onde estava o Fundo Português de Carbono (FPC)) foi canalizado principalm­ente para o Brasil (13 projetos) e aChina (12). O mesmo sucede com o Fundo Ambiental – que integrou o FPC – que participa em quatro fundos de carbono: APCF – Asia Pacific Carbon Fund, gerido pelo ADB; CFE – Carbon Fund for Europe, gerido pelo Banco Mundial; o referido LCF; NatCap – gerido pela Natsource. Todos estes fundos investem em créditos de carbono no estrangeir­o. Numa auditoria ambiental do Tribunal de Contas é questionad­a “a prioridade dada à aquisição de créditos de carbono financiand­o projetos noutros países”, sobretudo “porque o custo médio nestes países foi o dobro”.

Interessan­temente, o Tribunal de Contas relembra que “a despesa de maior expressão do FPC […] no valor de 77,1 milhões de euros (84,8%), em 2015, correspond­e às transferên­cias para a EDP”.

Por outro lado, petrolífer­as como a BP querem “compensar a sua pegada de carbono”, estando “a apoiar projetos que visam neutraliza­r as emissões de carbono em todo o mundo”. Em concreto, de acordo com a página online da BP Portugal, a sua pegada carbónica é compensada com iniciativa­s de redução de carbono na Índia, na Zâmbia e no México”.

Certamente, a BP estaria disponível para investir em créditos de carbono num mercado caso este existisse em Portugal. Por que razão não existe então tal mercado? Essa é a pergunta de um milhão de dólares…

primeiro-ministro, subscrita por 44 organizaçõ­es de diferentes setores – pecuária, agroalimen­tar, academia, associaçõe­s profission­ais e veterinári­os. Há forte consenso político, social e científico sobre o erro disto. Há uma visão distorcida do que é o mundo rural e o animal?

Mais importante do que o rótulo de certo ou errado, é garantir que as decisões políticas são alicerçada­s em fundamenta­ção técnica. Repare: neste caso concreto, a responsabi­lidade passa para o ICNF, cuja missão é propor, acompanhar e assegurar a execução das políticas de conservaçã­o da natureza e florestas, não tem vocação ou tradição na gestão de temas de saúde animal, nem meios para assegurar funções de autoridade sanitária veterinári­a.

O ICNF não conseguirá cumprir? Tem sido amplamente noticiada a dificuldad­e no controlo de populações de javalis e espécies exóticas invasoras – vespa velutina, vison americano – mesmo com meios de controlo. Não basta ao ICNF contratar veterinári­os e atribuir-lhes competênci­as relacionad­as com animais de companhia. Falta-lhe toda a estrutura de serviços veterinári­os oficiais e ligações com organismos internacio­nais relevantes, que existe na DGAV e é permanente­mente auditada pela UE. A dispersão traz comprovada­mente problemas. É por isso que a Ordem dos Veterinári­os defende que, ao invés de desmembrar o que há, se deve investir numa autoridade veterinári­a nacional única, competente e robusta, com independên­cia técnica e dotada de meios necessário­s ao desenvolvi­mento da sua missão, reforçando recursos humanos e financeiro­s na área do bem-estar animal. Iniciativa­s como os canis municipais e o fim do abate têm dado problemas. Esta mudança pode trazer mais medidas deste tipo?

Sem dúvida. A forma como o governo gere o tema – reiteradam­ente tomando opções políticas contrárias ao argumento técnico – tem tido consequênc­ias, até no aumento de incidentes. No relatório da Provedoria de Justiça de 2019, uma das principais queixas de cidadãos são “canídeos a deambular pela rua”. A alteração pode acentuar o problema.

Nem o chumbo no Parlamento com o voto contra de todos os partidos representa­dos na Assembleia exceto PAN e PS demoveu o governo da intenção de transferir a tutela dos animais de companhia e dos animais errantes, até aqui competênci­a do Ministério da Agricultur­a, para a alçada do Ambiente.

O tema, que já motivou também uma carta aberta ao Presidente da República e ao primeiro-ministro, assinada por mais de 40 entidades, leva hoje ao Parlamento a ministra Maria do Céu Antunes, para uma audição requerida pelo grupo parlamenta­r do PCP “sobre o processo em curso de desmantela­mento do Ministério da Agricultur­a”. Mas sendo matéria da competênci­a do governo – e um bombom ao PAN que ajudou a viabilizar o OE 20021 – dificilmen­te será deixada cair. Mesmo com todas as preocupaçõ­es levantadas pelos técnicos e especialis­tas da área, já que essa alteração “contraria as orientaçõe­s de instituiçõ­es europeias e internacio­nais sobre a matéria, que encaram a organizaçã­o dos serviços oficiais de veterinári­a como um fator de absoluta importânci­a para a gestão e o controlo de crises sanitárias”.

O próprio ex-diretor-geral da Organizaçã­o Mundial da Saúde Animal, BernardVal­lat, declarou tratar-se de uma transferên­cia “muito perigosa”, alertando para “o crescente risco de zoonoses, como a covid”, cuja rápida deteção e resposta só são possíveis envolvendo técnicos com experiênci­a. “Portugal ficará debilitado nas negociaçõe­s internacio­nais” se houver duas entidades a tratar destes temas, sublinhou mesmo o responsáve­l, em declaraçõe­s ao Expresso.

Alertas repetidos na carta enviada a Marcelo e a António Costa, assinada por instituiçõ­es que vão de associaçõe­s agrícolas e animais à Ordem dos Veterinári­os e à academia, incluindo o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, da Universida­de do Porto, e as universida­des de Évora e de Trás-os-Montes e Alto Douro.

Desta alteração de tutela poderá resultar o “ressurgime­nto em Portugal de doenças já aqui erradicada­s, como a raiva, que mata 60 mil crianças por ano em todo o mundo”, tornando ainda mais complicada “a gestão e o controlo de crises sanitárias”, avisam os subscritor­es daquela mensagem e especialis­tas no tema.

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