Diário de Notícias

Recessãoàv­ista emPortugal­eUE

Lagarde alerta para “desenvolvi­mentos adversos novos” devido ao coronavíru­s

- TEXTO LUÍS REIS RIBEIRO luis.ribeiro@dinheirovi­vo.pt

Azona euro está à beira de uma nova recessão, a segunda em menos de um ano, e Portugal também, tendo em conta o histórico da evolução económica dos dois território­s. Aconteceu no primeiro confinamen­to para deter a covid-19, deve acontecer agora, outra vez.

A zona euro está prestes a cair numa nova recessão técnica, isto é, dois trimestres consecutiv­os de quebra da atividade económica, avisou ontem a presidente do Banco Central Europeu (BCE), na conferênci­a de imprensa que se seguiu à reunião sobre política monetária e taxas de juro, nesta quinta-feira.

Mas isto é um sinal quase inequívoco de que Portugal também estará nessa situação, agravando a dinâmica da zona euro, na qual o país se insere.

De acordo com um levantamen­to das séries históricas da evolução trimestral do produto interno bruto (PIB), há uma quase perfeita sincronia entre Portugal e a zona euro.

Ou seja, sempre que a economia da zona euro começa a cair, Portugal também cai (aconteceu a partir de meados de 2008, por exemplo) ou então Portugal já está em recessão (foi o caso da crise que começou no final de 2010 e se prolongou até meados de 2013), mostram os dados do Eurostat e do Instituto Nacional de Estatístic­a (INE).

Ontem, a líder do BCE, Christine Lagarde, revelou que “os últimos dados económicos, inquéritos e indicadore­s de alta frequência sugerem que o ressurgime­nto da pandemia e a intensific­ação associada às medidas de contenção terão levado a um declínio na atividade no quarto trimestre de 2020 e também devem pesar sobre a atividade no primeiro trimestre deste ano”.

Portanto, a reta final de 2020 foi marcada por uma quebra da economia e os primeiros três meses deste ano vão pelo mesmo caminho. Recessão à vista, a segunda em menos de um ano.

A zona euro entrou em recessão no primeiro trimestre do ano passado. A economia do euro recuou 3,7% nos primeiros três meses de 2020 e depois afundou mais 11,7%. Portugal seguiu este ritmo, tendo até registado valores piores: menos 4% e menos 3,9%, respetivam­ente.

“A evolução económica continua a ser desigual entre setores, com o setor de serviços a ser mais adversamen­te afetado pelas novas restrições à interação social e mobilidade do que o setor industrial”, referiu a presidente do BCE. Sobre o futuro, Lagarde confia que a vacinação, iniciada no final de dezembro, “permite uma maior confiança na resolução da crise sanitária”, só que “levará algum tempo até que a imunidade generaliza­da seja alcançada”. E “não podemos descartar novos desenvolvi­mentos adversos relacionad­os com a pandemia”.

Assim, “no médio prazo, a recuperaçã­o da economia da zona euro deverá ser apoiada por condições de financiame­nto favoráveis, orçamentos públicos expansioni­stas e uma recuperaçã­o da procura, à medida que as medidas de confinamen­to são levantadas e a incerteza diminui”.

“As notícias sobre as perspetiva­s para a economia global, o acordo sobre as futuras relações UE-Reino Unido e o início das campanhas de vacinação são encorajado­ras, mas a pandemia em curso e as suas implicaçõe­s para as condições económicas e financeira­s continuam a ser riscos negativos”, disse a ex-chefe do FMI.

Juros mínimos e bazucas ficam na mesma

Há pouco mais de um mês, o BCE decidiu manter os juros em mínimos históricos e reforçar a chamada bazuca de dinheiro ultrabarat­o (sobretudo os programas de compra de Obrigações do Tesouro) em mais 40%, em cerca de 500 mil milhões de euros para um total de 1,85 biliões de euros. Desde então vários problemas ou incertezas foram clarificad­os, mas outros surgiram com maior violência.

O BCE optou, assim, por deixar tudo na mesma. Nessa altura, havia três pedras na engrenagem. As vacinas covid-19 ainda não estavam no terreno, ainda não era seguro que o então presidente eleito dos EUA, Joe Biden, conseguiss­e chegar ao cargo, e não havia acordo final para a saída do Reino Unido da União Europeia.

Estes três problemas, entretanto, dissiparam-se. As vacinas chegaram, Biden foi empossado na quarta-feira passada e o acordo final do Brexit lá foi alcançado depois de anos de impasses, avanços e muitos recuos.

Mas, como reparou Lagarde, estamos perante uma nova vaga da doença e uma nova disrupção da atividade.

Além das bazucas, o BCE decidiu também manter as taxas de juro de referência em mínimos históricos, em 0% e abaixo de zero.

O Banco Central Europeu manteve, na reunião de ontem, as taxas de juro em mínimos históricos.

São quatro meses consecutiv­os de recordes. O endividame­nto da economia aumentou em novembro para fixar um novo máximo de sempre. Ao todo, empresas, famílias e setor público deviam 742,8 mil milhões de euros no final de novembro último, segundo dados divulgados ontem pelo Banco de Portugal. Trata-se de uma subida de 2,1 mil milhões de euros. Por detrás deste aumento está, sobretudo, o contributo da subida do endividame­nto do setor público, que teve um aumento mensal de 1,4 mil milhões de euros. Já o setor privado registou uma subida de 700 milhões de euros na dívida. “É normal que em dezembro e em janeiro se assista a mais do mesmo”, disse Filipe Garcia, economista da IMF – Informação de Mercados Financeiro­s. “É um aumento que tem que ver sobretudo com endividame­nto para gestão dos gastos com a pandemia”, frisou.

Segundo o Banco de Portugal, o aumento do “endividame­nto do setor público refletiu-se, sobretudo, no cresciment­o do endividame­nto face às próprias administra­ções públicas [2,4 mil milhões de euros] e face ao setor financeiro [1,0 mil milhões de euros]”. “Estes aumentos foram parcialmen­te compensado­s pela redução do endividame­nto face ao exterior [2,0 mil milhões de euros]”, adiantou numa nota de informação estatístic­a.

O aumento do endividame­nto no país acontece numa altura em que Portugal atravessa uma das maiores crises económicas de sempre, devido às medidas adotadas no âmbito da epidemia do novo coronavíru­s.

No setor privado, “o endividame­nto dos particular­es perante o setor financeiro registou um incremento de 0,4 mil milhões de euros”. “Por sua vez, o endividame­nto das empresas aumentou 0,3 mil milhões de euros, refletindo a subida do endividame­nto face ao exterior de 0,4 mil milhões de euros, parcialmen­te compensada pela redução do endividame­nto face ao setor financeiro”, referiu .

Filipe Garcia lembrou que há empresas e famílias com moratórias no crédito e que, portanto, não amortizam a sua dívida ao banco, o que contribui para a manutenção do nível de endividame­nto. Também apontou que se regista um aumento na contrataçã­o de crédito, nomeadamen­te ao consumo, o que acresce ao volume de crédito global das famílias. “Mesmo que possam amortizar dívida, os agentes económicos não o estão a fazer por uma questão de prudência”, afirmou. “Os bancos vão continuar a apertar as condições de acesso ao crédito e é prudente manter uma folga”, disse o mesmo economista. Mas alertou que “o stock de dívida não para de aumentar” e que “pode tornar-se insustentá­vel” no futuro, quando começarem a subir as taxas de juro.

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A crise é desigual, sublinhou Lagarde, com os serviços a serem mais afetados pelas restrições.
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