Diário de Notícias

A MINHA CIDADE VAZIA

Paulo Brandão não tem dúvidas de que as salas de espetáculo vão abrir em breve, mas receia pela “saúde mental fragilizad­a” da população.

- TEXTO PAULO LOURENÇO

Durante muito tempo, eu não tinha a certeza se a minha cidade era mesmo a minha cidade, como se o nevoeiro tivesse tomado conta de todas as ruas e estradas e não deixasse as pessoas caminhar ou conduzir o carro. Não havia realmente ninguém, só chuva e chuva. E Deus, que tudo comanda, parecia ter visto o filme do Buñuel, O Anjo Exterminad­or, em que as personagen­s se veem presas numa sala após um jantar. Não há nada de físico que as impeça de sair, mas na verdade não conseguem!

Quando tive a notícia de que a cidade estava deserta, virei clandestin­o. Quis não tanto confirmar se era verdade, mas tão-só sentir o silêncio, não só nos ouvidos mas também nos olhos. Durante meses, fui passeando a Tara ea Mina, duas fêmeas whippet e que se revelaram as companheir­as dos confinamen­tos.

Na minha cidade vazia todas as pessoas estão em casa. Braga é uma cidade de pessoas cientes e sabe que não respeitar as regras é não respeitar os outros. Aparenteme­nte, tudo está bem! Mas estará? Há muitas lojas que encerraram, algumas de vez, muitos amigos e conhecidos perderam rendimento, não podemos tomar café ou convidar alguém para jantar fora e o futuro pode estar em causa. O futuro pode mesmo manter a minha cidade vazia se a crise se instalar e as pessoas criarem até outros hábitos, como achar que o covil de cada um é o seu melhor reduto e que aquele abraço apertado é suficiente em virtual!

Tenho receio pela cultura. Não tenho receio da recuperaçã­o, pois sei que muito em breve as salas de espetáculo vão abrir e os concertos ao ar livre voltar. Haverá novamente turistas e muitas coisas novas a acontecer, mas a nossa saú

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