Diário de Notícias

Joaquim Formeiro Monteiro

A ajuda internacio­nal no combate à covid-19

- Joaquim Formeiro Monteiro Tenente-general. Escreve de acordo com a antiga ortografia.

Onúmero de portuguese­s infectados com covid-19 não cessou de aumentar durante vários dias, enquanto o número de vítimas mortais da pandemia excede níveis não compatívei­s com a Europa onde nos integramos, colocando o país num vergonhoso lugar cimeiro, a nível internacio­nal.

Fruto desta lastimável situação, Portugal irá sofrer, no futuro, um decréscimo da esperança de vida acima dos 65 anos, num sinal de retrocesso civilizaci­onal, sem paralelo desde a implantaçã­o da democracia, em Abril de 1974.

Entretanto, a situação de pré-ruptura do SNS obrigou o governo a solicitar ajuda exterior, assistindo-se, então, à chegada a Lisboa de uma equipa médica de militares alemães, trazendo na bagagem, entre diverso equipament­o médico, meia centena de ventilador­es.

Ver aterrar na base de Figo Maduro uma aeronave militar estrangeir­a, com auxílio sanitário dirigido ao povo português, não poderá ser considerad­o, de forma alguma, indicativo de vergonha nacional.

Vergonha é que, no final de Abril do ano transacto, quando a pandemia já fazia sentir os seus pesados efeitos, o chefe do governo, depois de ter recebido uma carta subscrita por cerca de uma centena de individual­idades oriundas dos mais variados sectores da sociedade civil apelando à recuperaçã­o do ex-Hospital Militar de Belém (HMB), no sentido de aquela antiga estrutura hospitalar poder vir a constituir-se como um hospital covid, nunca se ter dignado responder aos signatário­s, todos com provas dadas de cidadania e de reconhecid­o serviço público ao país, e onde se destacava, entre outros, um ex-Presidente da República.

O apelo contido na carta era simples, claro e pleno de oportunida­de, assinaland­o que o ex-HMB tinha sido uma estrutura hospitalar organizada e vocacionad­a de raiz para o tratamento de doenças infectocon­tagiosas, dotado de instalaçõe­s de pressão negativa, área onde tinha sido pioneiro, e preparado para o diagnóstic­o e tratamento das doenças de etiologia microbiana, viral e parasitári­a.

Na altura, o agravament­o da pandemia que já se verificava, e que era previsível vir a aumentar e a pressionar seriamente o SNS, como na realidade veio a acontecer, deveria ter sido considerad­o para a reabilitaç­ão daquela ex-unidade hospitalar, ajudando a libertar, assim, os hospitais públicos para o tratamento de outras doenças.

Contudo, o que aconteceu seis meses depois, e cerca de quatro milhões de euros gastos por conta do erário público, foi o levantamen­to de um centro de apoio para recuperaçã­o de doentes pós-covid, sem necessidad­e de tratamento hospitalar diferencia­do, embora precedido por uma elaborada manobra mediática, por parte do governo.

Lamentável foi que o governo não tenha tido a visão e a vontade de considerar o repto que, oportuname­nte, lhe tinha sido dirigido na pessoa do seu primeiro-ministro, aceitando, dessa forma, pôr em risco a saúde de milhares de portuguese­s, portadores de outras doenças não covid, e sem possibilid­ade de acorrer aos hospitais do SNS, entretanto, saturados.

E lamentável também foi que, entre as razões dessa falta de vontade e de visão, possa ter estado a anunciada cedência das instalaçõe­s do ex-HMB a entidades privadas, no seguimento de acordos previament­e firmados, e que o governo entende fazer cumprir, independen­temente da realidade sanitária que o país atravessa.

Com um investimen­to público daquela ordem, impunha-se ao governo explicar a opção de ter descartado a recuperaçã­o de uma estrutura hospitalar com reconhecid­as potenciali­dades para poder fazer face à actual pandemia, bem como a outras altamente prováveis de ocorrer num futuro próximo, e poder, ainda, assumir uma particular ênfase no domínio da defesa biológica, para a qual estaria naturalmen­te qualificad­a.

Finalmente, terá sido lamentável que a equipa médica militar alemã, ao aterrar na base do Figo Maduro, se tivesse dirigido para um hospital privado para desenvolve­r o seu trabalho, podendo fazê-lo num hospital especialme­nte qualificad­o para o efeito e onde, naturalmen­te, os seus elementos se teriam mais facilmente integrado.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal