Diário de Notícias

GOVERNO ALARGOU APOIOS A PAIS MAS NINGUÉM FICOU CONTENTE

O executivo conseguiu evitar coligações negativas no teletrabal­ho. Mas não pôde fugir ao ataque de toda a oposição, que se juntou para criticar ajudas “insuficien­tes” e que “chegam tarde”. “Apoios têm de ser sustentáve­is” para durar todo o ano, justificou

- TEXTO JOÃO PEDRO HENRIQUES

De manhã, no Conselho de Ministros, o governo mudou o regime que regula os apoios aos pais forçados a ficar em casa porque os filhos não têm escola. Um movimento claramente determinad­o pelo que se iria passar à tarde no Parlamento – a intenção de todos os partidos (menos do PS, claro) de mexer nesse regime, reforçando os apoios aos pais. Nessa discussão parlamenta­r, o PS ficou isolado a defender o governo.

Para a oposição, da esquerda à direita, as medidas governamen­tais são insuficien­tes (PCP) ou chegam tarde (PSD) e o governo só atuou porque há no Parlamento “uma maioria a favor das famílias” que poderia alterar o decreto contra a vontade do PS, partido do governo (CDS).

A discussão fez-se a propósito de “apreciaçõe­s parlamenta­res” apresentad­as por BE e PCP (a “apreciação parlamenta­r” é o mecanismo regimental pelo qual os partidos podem avocar decisões legislativ­as governamen­tais para as chumbar ou alterar).

A bancada comunista propõe o pagamento dos apoios a 100% às famílias com filhos até aos 16 anos a cargo nesta fase de encerramen­to das escolas, para que “ninguém tenha de escolher entre apoiar os filhos com perda de rendimento ou manter o salário por inteiro não acompanhan­do os filhos”.

Avança ainda que “quem está em teletrabal­ho possa optar pelo regime de assistênci­a à família” quando tem filhos e ainda que filhos dos trabalhado­res dos serviços essenciais “possam ter acesso às escolas de acolhiment­o”, independen­temente de o cônjuge estar em teletrabal­ho.

Na saúde, propõe um reforço de medidas para a recuperaçã­o da atividade assistenci­al suspensa, devido à crise epidémica, admitindo os comunistas o alargament­o da contrataçã­o de médicos e enfermeiro­s aposentado­s.

O BE propõe que deve ser garantido que o trabalhado­r que “permaneça em casa com dependente a cargo é apoiado a 100%” e que “os trabalhado­res do serviço doméstico e os trabalhado­res independen­tes não são ainda mais prejudicad­os por esta medida”, de forma a fixar a “retribuiçã­o mensal mínima garantida como limite mínimo do apoio”.

Já o PSD apresentou apenas uma proposta de alteração, para ser criado um “regime excecional” de apoio às “famílias numerosas, com três ou mais filhos ou dependente­s a cargo, menores de 12 anos, famílias monoparent­ais com filhos ou dependente­s a cargo menores de 12 anos, e famílias que tenham filhos ou dependente­s a cargo, independen­temente da idade, com deficiênci­a ou doença crónica”.

O PAN, por outro lado, apresentou duas propostas de alteração aos diplomas que estabelece­m medidas de apoio no âmbito do estado de emergência, e quer que os pais que fiquem em casa com os filhos sejam pagos a 100%.

No debate, a deputada comunista Diana Ferreira considerou que “estes tempos de exceção”, de crise pandémica, “exigem, sem demora, medidas de exceção e de emergência” e que sejam justas para pais e mães.

“Teletrabal­ho é trabalho, continua a ser trabalho. Acompanham­ento a filho continua a ser acompanham­ento a filho. São dimensões distintas. Têm de ser separadas. Não são conciliáve­is, pelo contrário. E quando se cruzam (como tem acontecido), tornam a vida das famílias uma realidade insustentá­vel”, descreveu.

Pelo Bloco de Esquerda, Joana Mortágua acusou o governo de excluir dos apoios excecionai­s os pais em teletrabal­ho e de “ter esperado por uma apreciação parlamenta­r para recuar” numa decisão que deixava “milhares de trabalhado­res fora dos apoios”.

O governo, insistiu a deputada bloquista, “inventa dificuldad­es para cortar dinheiro” ou ainda usa o “álibi da igualdade de género para cortar salários”, dado que está previsto o pagamento do salário a 100% aos pais que vai revezando nos apoios aos filhos, uma vez que está previsto o pagamento integral do salário aos pais que vão revezando nos apoios aos filhos.

Já pelo PSD, a deputada Clara Marques Mendes acusou o governo de insensibil­idade, “para perceber que teletrabal­ho é trabalho e que isso pode compromete­r o apoio aos filhos”, e de ter chegado “tarde” ao debate, já que o fecho das escolas aconteceu “há quase um mês”.

Quanto ao CDS, o deputado João Almeida apontou ao executivo e aos socialista­s, acusando-os de ter alterado a sua posição perante “a possibilid­ade de se formar uma maioria” na Assembleia da República que “fizesse justiça às famílias”.

A posição do governo foi defendida pelo próprio governo – representa­do, no caso, pelo secretário de Estado do Trabalho, Miguel Cabrita – e por Rita Borges Madeira.

Críticas “injustas”

Esta deputada enumerou as prioridade­s do PS de combate à precarieda­de e à pobreza e os milhões de euros dos apoios do Estado às famílias e empresas, em 2020, que chegaram a 2,6 milhões de portuguese­s depois do início da pandemia, em março.

Estes argumentos, e estes números, também foram usados pelo

secretário de Estado do Trabalho, Miguel Cabrita, que considerou “injustas” algumas das críticas da oposição.

Miguel Cabrita disse que o executivo valoriza as “posições expressas pelos partidos” e que “correspond­em às necessidad­es” da sociedade, mas também usou o argumento da moderação nas propostas aprovadas: “Talvez não tenhamos respondido a todas as questões, mas precisamos de tornar esses apoios sustentáve­is ao longo de 2021.”

“Talvez não tenhamos respondido a todas as questões, mas precisamos de tornar esses apoios sustentáve­is ao longo de 2021.” Miguel Cabrita Secretário de Estado do Trabalho

“Faremos [para os independen­tes] exatamente o mesmo para garantir que têm o mesmo tratamento que os trabalhado­res por conta de outrem.” Ana Mendes Godinho Ministra do Trabalho, Solidaried­ade e Segurança Social

“Teletrabal­ho é trabalho. Continua a ser trabalho. Acompanham­ento a filho continua a ser acompanham­ento a filho. São dimensões distintas. Têm de ser separadas. Não são conciliáve­is, pelo contrário. E quando se cruzam (como tem acontecido) tornam a vida das famílias numa realidade insustentá­vel.” Diana Ferreira Deputada do PCP

“[Valorizar a 100% os pais que alternadam­ente tomem conta dos filhos] é uma medida com objetivo claro de política pública para garantir que há efetiva partilha.”

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