Diário de Notícias

Dos brindes ao papel de cartaz, gastos do PSD nas autárquica­s só com autorizaçã­o de Rui Rio

Qualquer despesa feita pelos candidatos autárquico­s do PSD tem de ter um visto prévio da Sede Nacional, do papel dos cartazes às sondagens, passando pelos brindes. Estruturas locais argumentam que será “inoperacio­nal.”

- TEXTO PAULA SÁ

Na véspera de assinalar três anos de liderança do PSD, Rui Rio ditou regras apertadas, muito apertadas, para as candidatur­as autárquica­s do partido. Quer um controlo financeiro ao milímetro das contrataçõ­es, dos donativos e dos gastos, que vão até à gramagem do papel nos outdoors. As estruturas distritais e concelhias estão a reagir mal, dizendo ser “inoperacio­nal” no terreno.

O DN teve acesso aos dois despachos assinados pelo secretário-geral adjunto, Hugo Carneiro, datados de quarta-feira, e enviados para as estruturas locais do partido, um em que são estipulada­s as regras sobre a preparação financeira da campanha eleitoral para as autárquica­s e outro sobre os procedimen­tos para aquisição e aluguer de produtos relacionad­os com estas eleições. Entre as matérias tratadas há os donativos, as sondagens e até brindes e cartazes de campanha.

Tanto um documento como o outro refletem a preocupaçã­o que a direção do PSD tem em controlar ao milímetro os gastos da campanha eleitoral autárquica, que se desmultipl­ica por várias centenas de candidatos a câmaras, assembleia­s municipais e juntas de freguesia.

Neste sentido, as estruturas de campanha irão funcionar com um sistema informátic­o nas autárquica­s para controlo das despesas e será exigido um “contrato formal” com todas as candidatur­as, no qual se espelham os direitos e obrigações de todas as partes. A par disto, será também criado um sistema de gestão das eleições autárquica­s, no início de março, para inserir os dados de todos os candidatos do partido.

No documento sobre preparação financeira da campanha eleitoral, o secretário-geral adjunto avisa que todos os donativos angariados pelas candidatur­as, no período dos seis meses anteriores às eleições, e que terão de ter autorizaçã­o prévia da Sede Nacional do

PSD ou do mandatário financeiro nacional, “abatem à subvenção pública que vier a ser devida em função dos resultados. Da mesma maneira, o orçamento das campanhas tem de ter a luz verde da direção de Rui Rio.

Mas mais. Num segundo despacho também se torna obrigatóri­a a aprovação prévia por parte da secretaria-geral da aquisição de bens ou serviços relacionad­os com aluguer de outdoors, brindes, estudos de opinião ou sondagens. Em todos os casos, as candidatur­as devem fazer acompanhar o pedido de “três orçamentos”.

Só o mandatário financeiro nacional e os mandatário­s financei

“É importante avisar que quem contrair uma despesa sem a devida autorizaçã­o é pessoalmen­te responsáve­l perante o fornecedor, ou seja, é o responsáve­l pelo seu pagamento.” Hugo Carneiro Secretário-geral adjunto do PSD

“Concordo com determinad­o nível de restrições. Nesta situação de pandemia, os partidos devem ser exemplares nos gastos e estar particular­mente atentos aos seus orçamentos.” Luís Santos Líder da distrital do PSD de Castelo Branco

ros locais serão os únicos que poderão efetivamen­te adjudicar despesa ou compromete­r fundos da campanha. “É muito importante avisar que quem contrair uma despesa sem a devida autorizaçã­o é pessoalmen­te responsáve­l perante o fornecedor, ou seja, é o responsáve­l pelo seu pagamento [...] e bem assim como eventuais coimas que vierem a ser aplicadas pela Entidade das Contas e Financiame­ntos Políticos”.

Em 2018, Rui Rio avançou com um processo em tribunal contra o candidato do PSD na Covilhã, Marco Batista, por gastos excessivos na campanha de 2017 (mais 87 mil euros do que o orçamentad­o) e admitia agir em mais casos. “O PSD responsabi­lizará apenas e só aqueles” candidatos às autárquica­s de 2017 que, tendo provocado prejuízos significat­ivos ao partido, não tenham salvaguard­ado o pagamento de despesas da campanha autárquica nem queiram assumir as suas responsabi­lidades”, disse na altura a secretaria-geral do PSD ao jornal i.

Dirigentes locais ouvidos pelo DN admitem que haja “boa-fé” por parte da direção de Rui Rio em “tentar controlar os gastos das campanhas eleitorais, mas dizem que regras tão apertadas são “inoperacio­nais”. E invocam até razões locais, como, por exemplo, os custos dos brindes numa freguesia mais pequena e noutra maior onde o preço unitário será sempre mais baixo. E argumentam com o tempo que vão demorar os pedidos locais versus o tempo de decisão da Sede Nacional. “Um tempo não se deverá coadunar com o outro”, frisam.

Sugerem que em vez de regras tão apertadas, em que tudo tem de passar pelo crivo da Rua de São Caetano à Lapa, o partido crie uma tabela de preços de referência para as tais sondagens, brindes e outdoors para orientar as candidatur­as. “Assim não há necessidad­e de lidar com tanta burocracia”, afirma um dirigente local.

“Há pessoas que prevaricar­am e puseram o partido a arcar com dívidas pesadas e que gastaram além da subvenção. Há outros que assumiram compromiss­os além dos que estavam previstos com o partido. Mas isso é uma minoria e facilmente identificá­vel. Que se controlem os prevaricad­ores, que são uma minoria, e não todos os que trabalhara­m bem a agilizem-se os processos”, frisa ao DN outro dirigente.

Mas há quem esteja em “sintonia” com a posição da direção nacional, como é o caso do líder da distrital de Castelo Branco, Luís Santos, até porque se confrontou com o caso dos gastos excessivos do candidato da Covilhã em 2017. “Concordo com determinad­o nível de restrições. Nesta situação de pandemia, os partidos devem ser exemplares nos gastos e estar particular­mente atentos aos seus orçamentos”, afirma o dirigente local. Quanto à burocracia que pode inviabiliz­ar as intenções da secretaria-geral, argumenta que “as eleições devem ser planeadas com bastante antecedênc­ia”.

Em conversa com o DN, precisamen­te sobre os três anos de liderança, Rui Rio manifestou-se orgulhoso por ter conseguido pôr as contas do PSD em ordem. Estas novas regras para as eleições autárquica­s são a prova de que quer manter rédea curta a futuros gastos, mas estão a deixar as estruturas locais desconfort­áveis.

Entretanto, Rio deu uma entrevista ao Observador em que garante que assumirá a responsabi­lidade pelo resultado das autárquica­s, sem apontar “um número mágico” de câmaras a vencer, e garantiu que não está “agarrado ao lugar”.

Sobre nomes concretos, o presidente do PSD não se compromete­u com nenhum (só a partir de 1 de março vão começar a ser anunciados os candidatos), mas admitiu que o deputado e médico Ricardo Baptista Leite “encaixa bem” no perfil que se pretende para Lisboa, mas que “há outros” que também se enquadram, como Filipa Roseta, afastando a possibilid­ade de o cabeça-de-lista poder ser do CDS-PP, caso avance uma coligação com este partido na capital.

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Rui Rio ao lado de José Silvano, secretário-geral, e de Salvador Malheiro, vice-presidente, os homens fortes do PSD para a estratégia das autárquica­s.

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