TEATRO DOS MARRETAS REABRE A CORTINA PARA OS FÃS
A totalidade das temporadas de The Muppet Show, de Jim Henson, fica disponível a partir de hoje no Disney+. Um exclusivo do serviço de streaming que fará as delícias dos fãs num aguardado regresso às origens.
Os fantoches com personalidade criados por Jim Henson nunca passaram de moda. Tiveram várias vidas, entre séries – a mais recente chama-se Muppets Now –e filmes, mas não há nada como aqueles episódios de 25 minutos que, ao longo de cinco temporadas (1976-1981), definiram um certo tipo de comédia nonsense, com muitas referências, imaginação e um conjunto de bonecos a interagir com convidados estrelas. A essência deste espetáculo de variedades sempre esteve aí: no cruzamento de Cocas, Miss Piggy e companhia com celebridades de carne e osso dispostas a um bom momento televisivo. De Julie Andrews a Sylvester Stallone, passando por Liza Minnelli, Elton John, Peter Sellers, Charles Aznavour, Gene Kelly e tantos outros, o programa de Henson estabeleceu-se como um arquivo notável de convidados especiais.
São esses 120 episódios de The Muppet Show, a série originalmente emitida entre 5 de setembro de 1976 e 15 de março de 1981 (a Portugal chegou na década de 1980, pela RTP, com o título Os Marretas), que agora ficam disponíveis no Disney+, acabando com a lacuna da quarta e quinta temporadas, como informa o comunicado, “que nunca foram disponibilizadas anteriormente para sistemas de entretenimento em casa”. Está assim garantida a nostalgia de uma geração e a conquista de novos espectadores.
O legado de Jim Henson
Fascinado desde criança pelas animações da Disney e, mais tarde, pela comédia popular de figuras como Bob Hope e George Burns, Jim Henson (1936-1990) tinha apenas 18 anos quando os seus espetáculos com bonecos começaram a ganhar vida própria. Em 1954 estava a dar os primeiros passos na televisão, e logo no ano seguinte as suas personagens já se difundiam por toda a América através de Sam and Friends (episódios de cinco minutos com números cómicos), que seria o verdadeiro laboratório para a criação dos Muppets – o nome resulta da aglutinação das palavras marionette (“marioneta”) e puppet (“fantoche”).
A influência do referido humor popular e da farsa acabou por se revelar, em Henson, o ingrediente secreto para o modo como os bonecos se afirmaram na televisão, até ao sucesso absoluto que permitiu criar a empresa Muppets, Inc. e aumentar a família de figurinhas. A
Sam and Friends seguiu-se, em 1969, o programa infantojuvenil Rua Sésamo, essa reconhecida instituição pedagógica, e só depois Os Marretas surgiram na paisagem.
Apenas a personagem de Cocas (antes de ser sapo) fez a transição de Sam and Friends e Rua Sésamo para Os Marretas, tornando-se o mais famoso dos fantoches, tido mesmo como o alter ego de Henson – ideia que o criador, apesar de lhe dar voz, declinava, justificando que a sua omnipresença só se justificava pela leveza e a facilidade de manobrar. Uma justificação que não é desprovida de sentido, se tivermos em conta que é das figuras que só exige um marionetista com uma mão no interior e a outra no arame que está preso aos braços, ao contrário de outros marretas, como o Chef Sueco, que envolve o trabalho de dois marionetistas.
Com a ajuda de uma vasta equipa de produção, que se reuniu nos estúdios londrinos Elstree (por onde passaram Hitchcock, Kubrick, Spielberg), Henson concebeu a mais peculiar performance de variedades, com música, momentos de paródia e pozinhos de perlimpimpim do charme de cada convidado. Um golpe de génio que se arriscava a ficar pelas cinco temporadas de The Muppet Show e duas longas-metragens – As Aventuras dos Marretas (1979) e Os Marretas Contra-Atacam (1981) –, com Henson a retirar-se para outros projetos, de que Labirinto (1986), com David Bowie e Jennifer Connelly, será o exemplo sonante. O criador morreria de uma pneumonia aos 53 anos, mas o futuro dos Marretas estava assegurado, em primeiro lugar, pelo filho, Brian Henson.
Sob o signo da Disney
Em 2004, a Disney comprou os direitos da saga à Jim Henson Company (desde Muppets, Inc., teve outras designações). O negócio começou a apalavrar-se ainda na altura do criador, e embora tivesse sido interrompido pela sua morte, os estúdios de animação coproduziram pouco depois O Conto de Natal dos Marretas (1992) e Os Marretas na Ilha do Tesouro (1996), ambos realizados por Brian Henson. Na sequência da aquisição propriamente dita deste universo por parte da Disney, alimentou-se a esperança num novo filme – com efeito, o comeback de Os Marretas chegou ao grande ecrã em 2011, alcançando um enorme êxito de bilheteira. Prova provada de que a nostalgia dá mesmo lucro...
Motivado por essa confirmação do sucesso, seguiu-se mais um filme, Marretas Procuram-se (2014), com assinatura do mesmo realizador, James Bobin, mas desta vez trocando os protagonistas humanos Jason Segel e Amy Adams por Ricky Gervais, Tina Fey e Ty Burrell, para além de outras participações ilustres como Céline Dion, Tony Bennett, Lady Gaga ou Christoph Waltz.
A magia tinha voltado, com outro fôlego. Mas o clássico será sempre o clássico: The Muppet Show é o início de tudo. Tem o ADN de Jim Henson, a sua audácia criativa e aquele gesto de personalidade que permitiu a cada marreta fixar características individuais, em vez de se confundirem uns com os outros na barafunda paródica. Por isso, regressar às origens é fundamental.
E vai saber bem.