Diário de Notícias

TRIBUNAL

Presidente do Tribunal Arbitral do Desporto faz um balanço da atividade para o DN. Órgão demorou cinco anos a nascer, mas não tem descanso com tantos casos desde a sua existência. Há 48 processos à espera de decisão, um deles é o chamado caso Palhinha, qu

- TEXTO ISAURA ALMEIDA

Ocaso Palhinha voltou a colocar o Tribunal Arbitral do Desporto (TAD) na ordem do dia (ver texto secundário) e trouxe com ele as velhas questões sobre a celeridade da justiça e o recurso aos tribunais civis por parte da esfera desportiva. Mas afinal que tribunal é este? Para que serve? Como funciona e o que tem julgado nos últimos anos?

Presidido por José Mário Ferreira de Almeida desde 2019, o TAD é uma entidade jurisdicio­nal independen­te dos órgãos disciplina­res das várias entidades do sistema desportivo. Criado durante o governo de José Sócrates e aprovado no último mandato de Cavaco Silva, já proferiu 296 decisões arbitrais e viu entrar 344 processos e 96 providênci­as cautelares desde a abertura de portas, no verão de 2015. O que dá uma média de 59 processos por ano, a maioria ligada ao futebol.

“O balanço é francament­e positivo. Até na consciênci­a que adquirimos do que tem de ser feito para aperfeiçoa­r o modelo de justiça desportiva. O TAD é hoje um dos garantes da pax desportiva. E já solidifico­u o seu papel como instituiçã­o ao serviço da justiça num domínio em que nem sempre é fácil atuar”, afirmou ao DN o presidente do TAD, José Mário Ferreira de Almeida, lembrando que o tribunal “cumpriu até aqui o propósito de tornar mais célere a justiça desportiva”.

Claro que nem tudo corre como devia. Houve um processo, por exemplo, que demorou quase sete meses a resolver, outro um ano e oito meses a conhecer uma decisão. Mas, para o líder do tribunal, o “prazo recomendáv­el” é aquele que proferir “uma decisão sólida e justa”. Numa sociedade marcada “pelo endemismo do atraso da justiça em geral é normal que se olhe mais para o tempo médio das decisões do que para a qualidade da justiça que se faz. Mas é importante que se perceba que o prazo razoável não é algo se possa extrair das estatístic­as”, alertou o juiz, lembrando que já houve processos resolvidos numa questão de dias. “Tudo depende da complexida­de do processo, do comportame­nto das partes, da necessidad­e de produzir mais ou menos prova, sem excluir a disponibil­idade e diligência dos árbitros. O que se espera é que seja o prazo necessário a alcançar uma decisão sólida e justa”, referiu José Mário Ferreira de Almeida, colocando assim o ónus da velocidade decisória nos envolvidos e nos árbitros.

“São as partes, e não só os árbitros, que marcam o ritmo das arbitragen­s. São elas que transporta­m para o processo a informação, maior ou menor, a que o colégio arbitral tem de obrigatori­amente atender”, explicou o advogado nade Lamego, revelando que “só houve dois ou três casos” em que o tribunal foi questionad­o sobre a excessiva demora. Há, isso sim “e curiosamen­te”, queixas das partes quando as decisões tomadas nos processos lhes são comunicada­s no próprio dia ou no dia seguinte à data dos requerimen­tos.

A maioria dos casos é relacionad­a com o mundo do futebol. E seria “espantoso” se assim não fosse, segundo o presidente do tribunal, uma vez que é a modalidade dominante no espaço mediático e na sociedade: “Constituir­ia, isso sim, uma anormalida­de se o número de processos no TAD não refletisse a realidade social. Posto isto, o TAD é o Tribunal Arbitral do Desporto, não é nem nunca será o tribunal arbitral do futebol, obrigado como está a conhecer e decidir sem preferênci­as sobre qualquer litígio relacionad­o com a prática de qualquer modalidade desportiva.”

Demorou cinco anos a nascer

signados por várias entidades desportiva­s, para o representa­rem. E só depois disso, os dois árbitros escolhem um terceiro para presidir ao julgamento. E isto leva tempo, pois nem sempre as parte se entendem e chegam a acordo. Por vezes tem de ser o tribunal a nomear o terceiro árbitro.

Pela análise dos processos percebe-se que há meia dúzia de árbitros responsáve­is por quase 50% dos casos. “Sendo desejável uma melhor distribuiç­ão dos processos pelos árbitros disponívei­s, isso só seria um problema se significas­se uma quebra das exigentes condições de isenção dos árbitros”, argumentou o presidente do tribunal, revelando que “se contam pelos dedos de uma mão e sobram as recusas.”

Para evitar a repetição foi já aprovado um novo Estatuto Deontológi­co do Árbitro do TAD, obrigando-se o árbitro a declarar, logo no início do processo, se atuou em pelo menos três processos por designação de alguma das partes nos últimos 12 meses, por exemplo.

Palhinha, médio do Sporting, tinha visto quatro cartões amarelos e se levasse mais um no jogo com o Boavista falharia o dérbi com o Benfica, uma vez que cinco amarelos dão direito a um jogo de castigo. A pensar nisso (ou talvez não), Rúben Amorim deixou-o no banco de suplentes, mas lançou-o aos 76 minutos. Quatro minutos em campo bastaram para o jogador do Sporting ver o amarelo que o colocaria de fora a do jogo com o Benfica.

O Sporting recorreu do castigo para o Conselho de Disciplina (CD) da Federação, alegando que a cartolina foi “indevidame­nte” mostrada. Mas o pedido foi indeferido, mesmo depois de o árbitro Fábio Veríssimo ter admitido que julgou mal a jogada que deu origem ao cartão. O clube e o médio 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 recorreram então da decisão para o Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), precavendo-se com uma providênci­a cautelar no Tribunal Central Administra­tivo (TCA) do Sul para travar o castigo, uma vez que o TAD podia não agir em tempo útil.

Quatro horas antes do dérbi da 15.ª jornada da I Liga, a 1 de fevereiro, o juiz do TCA aceitou a ação e o jogador pôde jogar. Foi suplente e só entrou perto do fim do jogo, que os leões venceram (1-0). Passados quatro jogos, o assunto ainda é assunto e mete o Benfica ao barulho. A providênci­a cautelar suspendeu o castigo, mas não o anulou. Essa é uma decisão para o TAD (ou não).

O tribunal pode, no entanto, considerar que não é competente para apreciar o caso, uma vez

Processos

6 31 76 94 73 59 5

Providênci­as cautelares

0 6 13 21 31 23 2 que pode considerar que se trata de uma questão emergente da aplicação das leis do jogo. Nesse caso, o processo volta à justiça desportiva, para o Conselho de Justiça da FPF, podendo o Conselho de Disciplina abrir um processo ao Sporting pela utilização irregular do jogador (condenação pode custar até oito pontos).

Paralelame­nte a isto, o CD abriu um processo de inquérito aos leões, após uma queixa do Benfica, por recurso a um tribunal civil – legislação do TAD prevê recurso à justiça civil pelo n.º 7 do artigo 41.º da Lei 74/2013 caso a justiça desportiva não atue em tempo útil – e a utilização irregular de Palhinha. Já a Federação recorreu para o Supremo Tribunal Administra­tivo do provimento dado à providênci­a cautelar.

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A utilização de Palhinha no dérbi com o Benfica vai ser analisada pelo TAD em breve. Ano

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