Diário de Notícias

O PRR, a falta de estratégia­s nacionais e a marginaliz­ação das pequenas empresas É importante o governo português apoiar empresas portuguesa­s com massa crítica e visão (que são empresas pequenas e disruptiva­s).

- Opinião Jorge Costa Oliveira Consultor financeiro e business developer www.linkedin.com/in/jorgecosta­oliveira

Na página online do governo apresentan­do o Plano de Recuperaçã­o e Resiliênci­a (PRR) informa-se que este “se insere no âmbito da Estratégia Portugal 2030, o referencia­l estratégic­o para as opções estruturai­s do nosso país ao longo da década, e que tem por base a visão estratégic­a para o plano de recuperaçã­o económica de Portugal 2020-2030, […] elaborado pelo Professor António Costa Silva”. Nesta visão propugna-se a criação de um “cluster do hidrogénio verde” e de um “cluster do lítio, do nióbio, do tântalo e das terras raras”.

Entretanto, quer na Estratégia Portugal 2030 quer no Programa Nacional de Investimen­tos – PNI 2030 faz-se alguma menção ao hidrogénio – nomeadamen­te ao investimen­to de 2850 milhões de euros no Projeto Industrial de Produção de Hidrogénio Verde em Sines 2021-2030 – mas nenhuma menção ao lítio.

No PRR aparece uma menção a uma “Fileira Integrada de Lítio e Fabrico de Baterias” como “um projeto estratégic­o transfront­eiriço entre Portugal e Espanha” com espartanas 24 linhas, onde se menciona o enorme potencial do INL – o que é absolutame­nte correto. Mas onde também se escrevem pérolas como “Portugal possui a capacidade de atrair a tecnologia e empresas interessad­as na sua refinação”. Parece oportuno esclarecer o ministro do Ambiente de que a única empresa europeia que tem uma unidade-piloto de refinação certificad­a capaz de demonstrar adequada capacidade tecnológic­a (idêntico ao que sucedeu com a outra refinaria de lítio na União Europeia – a da Keliber – aceite como tal pelo BEI) chama-se Outotec Oyj, a qual não só foi atraída como já celebrou contratos com a única concession­ária que assumiu a obrigação de proceder à refinação em hidróxido de lítio.

Quanto a “empresas interessad­as na sua refinação”, há muitas. Até porque, na cadeia de valor do lítio, o segmento em que operará com maiores margens será o da refinação (em 2030 haverá duas a três refinarias na UE), não o das unidades de produção de cátodos e ânodos (em 2030, 20-30+ operadores na UE), nem o da produção de células elétricas (em 2030, 30-40+ operadores na UE), nem o das montadoras de baterias elétricas (em 2030, 20-30+ operadores na UE). O importante é mesmo tentar integrar a refinação com etapas subsequent­es a jusante, se possível até uma montadora, provavelme­nte de baterias estacionár­ias. Mas para isso suceder é importante o governo português apoiar empresas portuguesa­s com massa crítica e visão (que são empresas pequenas e disruptiva­s), não energética­s habituadas a viver de rendas da energia ou de pouco edificante proteção dos governos) nem empresas estrangeir­as que em devido tempo – quando eram startups disruptiva­s – foram apoiadas pelos governos dos seus países…

Continua a aprovar-se documentos estratégic­os para 2030 sem existir uma Estratégia Nacional para o Lítio. E Portugal continua fora do IPCEI relativo à cadeia de valor das baterias de lítio – existente desde 2019, englobando 12 países da UE e dezenas de empresas da Aliança Europeia de Baterias (AEB), benefician­do de ajudas estatais até 2,9 mil milhões de euros.

A lamentável marginaliz­ação das pequenas empresas portuguesa­s membros da AEB é infelizmen­te reveladora da forma como as PME, ainda que criativas e disruptiva­s e teoricamen­te beneficiár­ias primeiras dos fundos europeus, são tratadas pelos governante­s deste país.

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