Bruno Fernandes O três em um que quer devolver o United aos dias de glória
Há pouco mais de um ano em Manchester, o médio apresenta números incríveis: só nesta época, esteve em cerca de 50% dos golos da equipa e já soma tantos prémios de jogador do mês como CR7 desde que chegou. Agora, só faltam os troféus para se tornar uma lenda.
Quando, em janeiro do ano passado, já parecia inevitável que Bruno Fernandes deixasse o Sporting durante o mercado de inverno, Jorge Silas, então treinador dos leões, disse que, para substituir o médio contratado à Sampdoria, precisava de três jogadores: “Um que marque golos como ele, um que organize como ele e um que defenda como ele. Em Portugal não há nenhum.” O clube de Alvalade ainda conseguiu aguentar o jogador até ao fim do mês, até que o que toda a gente esperava acabou por acontecer. O Manchester United avançou com 55 milhões de euros imediatos, mais 25 por objetivos, para garantir o concurso do internacional português e proporcionar ao clube lisboeta a maior transferência da sua história.
Depois dos anos de glória no reinado de Sir Alex Ferguson, e apesar de algumas conquistas sob o comando de Van Gaal e José Mourinho, o clube deixara de estar na linha da frente do futebol inglês e precisava de dar um novo impulso à equipa comandada pelo norueguês Ole Gunnar Solskjaer. Mas a chegada de um reforço por um preço elevado, oriundo de uma liga “menor”, levantou sobrancelhas, mesmo que Bruno Fernandes se tivesse tornado o médio com mais golos numa época, superando na temporada anterior, por cinco, os 27 conseguidos por Frank Lampard, do Chelsea, em 2009-10.
Hoje, quando se prepara para fazer o 60.º jogo com a camisola dos red devils – embora deva ser poupado no jogo desta quinta-feira para a Liga Europa, graças à vantagem de quatro golos obtida frente à Real Sociedad, em Turim –, essas dúvidas dissiparam-se. O Manchester United ganhou outra vida impulsionado pelo carisma do português, que em pouco mais de um ano anotou 34 golos e fez 21 assistências – no último domingo, perante o Newcastle, foi a sétima vez nesta época que Bruno marcou e assistiu no mesmo jogo, isto numa partida em que nem esteve particularmente inspirado... E, claro, nos fóruns do Manchester United já há quem considere que os 55 milhões foram afinal uma pechincha e quem peça que a braçadeira de capitão passe para o seu braço. Solskjaer já lhe proporcionou essa honra uma vez (na vitória em Paris
para a Liga dos Campeões, quando Maguire não pôde jogar), surpreendendo o português na conferência de antevisão da partida com a decisão.
“Se nos lembrarmos de como estava o United há um ano, longe do City, do Liverpool e até do Chelsea, estar onde está agora mostra o impacto que ele teve. O que mais gosto é a forma como ele parece o capitão. Fala como um, é um líder no campo e tem os pés assentes no chão, o que é muito importante”, ressalvou Phil Neville, antigo defesa do conjunto de Manchester.
Números, números, números
É fácil definir o rendimento de Bruno Fernandes em Manchester com recurso a números. Com aqueles que apresenta é, neste momento, o segundo melhor marcador da Premier League esta temporada (15 golos, menos dois que o egípcio Salah), o terceiro com melhor média de golos por jogo (0,6, atrás do avançado do Liverpool e de Calvert-Lewin, do Everton), o segundo com mais assistências (10, menos uma que Harry Kane, do Tottenham) e o jogador com mais participações em golos (25, mais uma que o atacante dos Spurs) – quase metade dos apontados pelo United (53), melhor ataque da prova. O jornal espanhol As preconiza mesmo que o grande desafio do ex-Sporting é tornar-se o primeiro médio a conquistar o prémio de melhor marcador da Premier League – uma meta complicada, tendo em conta a categoria dos adversários com que se bate numa liga tão exigente.
Além disso, em apenas um ano, Bruno Fernandes já foi considerado jogador do mês em quatro ocasiões. Tantas quantas um tal de Cristiano Ronaldo nas seis temporadas que representou o United – diga-se que o recorde pertence ao argentino Sergio Agüero, do Manchester City, com sete.
Nota artística
Demonstra ainda uma espantosa frieza a marcar penáltis e só falhou três ao longo da carreira: um na Udinese, outro no Sporting e mais um em Inglaterra: Gabriel, do Nápoles, Miguel Soares, do Loures, e Karl Darlow, do Newcastle, de quem se desforrou no último fim de semana, foram os guarda-redes heróis. Ao todo, já converteu 34 penáltis desde que se estreou como profissional pela Udinese (ou seja, 29,5% dos 115 golos que festejou), algo que serve muitas vezes para os rivais menorizarem o seu papel. Mas, com exceção de Fernando Peyroteo (apenas tentou uma vez, frente à Académica, e falhou), todos os grandes goleadores da história engordaram bem as suas estatísticas com grandes penalidades.
Além disso, boa parte dos seus golos merecem nota artística elevada. Só para dar alguns exemplos, recorde-se os dois assinados nas meias-finais da Taça de Portugal, perante o Benfica (um livre de 35 metros na Luz e um remate soberbo em Alvalade) ou, mais recentemente, um “à Cantona”, frente ao Everton, com a bola a cair entre o guarda-redes e a trave e um festejo semelhante ao do francês.
“Tem sido sensacional desde o dia em que assinou contrato, faz que a equipa jogue futebol. Sempre que o vejo, ele influencia o jogo, algo que alguém que jogue naquela posição deve fazer. Revelou-se uma contratação formidável”, assinalou Paul Scholes, antiga glória do United à estação BT Sport.
“Definitivamente, é um jogador que tem impacto nos resultados. Cria hipóteses, marca golos e assume riscos – algo que qualquer jogador do Manchester United deve poder e ser suficientemente corajoso para fazer. Bruno é definitivamente corajoso. Às vezes, arranco os cabelos e digo que podia fazer um passe mais fácil para os lados ou para trás, mas não se pode tirar essa faceta ao Bruno”, confessou, por seu lado, o técnico norueguês Solsjkaer, que tanto pediu a sua contratação.
Troféus e seleção: a fronteira
Desde que regressou ao futebol português depois de iniciar a carreira sénior no exigente futebol italiano, a Bruno Fernandes faltam agora títulos importantes para cimentar o seu estatuto e subir um degrau no panteão dos grandes futebolistas. Em Alvalade conseguiu vencer uma Taça de Portugal e duas Taças da Liga, em Manchester ainda está em branco – e neste ano dificilmente terá o prémio mais desejado, uma vez que o rival citadino parece imparável na liga e a diferença já está nos dez pontos. Resta a Taça de Inglaterra (o United defronta o Leicester nos quartos-de-final) e a Liga Europa... “Como sempre disse, para mim o mais importante é conquistar troféus, troféus coletivos, porque somos uma equipa de futebol e não o Bruno. Os prémios individuais dão-te felicidade e confiança para trabalhar ainda mais e conseguires mais de ti próprio, mas, como toda a gente sabe, só serei completamente feliz se conquistar um troféu pelo clube”, assinalou o médio depois de ser distinguido em dezembro.
“A forma como Bruno Fernandes jogou nos últimos meses faz lembrar um pouco Éric Cantona, porque parece estar no seu palco. Éric adorava tudo o que significava jogar naquele que era o maior clube do mundo. Fernandes tem sido fantástico nisso, também é o seu palco. Sugerir que está no mesmo nível de Cantona é um enorme elogio para ele, mas agora têm de conseguir ganhar coisas, como Éric fez. Se o United o conseguir, obviamente que os podem comparar”, considerou Steve Bruce, atual técnico do Newcastle que representou o United enquanto jogador.
Já na seleção, e apesar de ter contribuído para a conquista da Liga das Nações, o médio ainda não atingiu o potencial que todos esperam dele. Só chegou à equipa principal aos 23 anos – tem 26 agora –, somando 25 internacionalizações e dois golos. Mas, numa equipa recheada de talento, deverá ser uma questão de tempo até explodir, também, de quinas ao peito.
“Tem sido sensacional desde o dia em que assinou contrato, faz que a equipa jogue futebol. Sempre que o vejo, ele influencia o jogo, algo que alguém que jogue naquela posição deve fazer. Revelou-se uma contratação formidável”, assinalou Paul Scholes.