Diário de Notícias

MOEDAS VS. MEDINA

Luta por Lisboa ganha peso com candidato da direita

- TEXTO PAULA SÁ

AUTÁRQUICA­S São ambos filhos de comunistas, os dois são estrelas nos seus partidos e nenhum nasceu na capital. Mas é em Lisboa que vão enfrentar-se em outubro. Capacidade de o candidato da coligação PSD-CDS unir o resto da direita e ir buscar votos ao centro torna mais difícil e complexa uma vitória do autarca socialista.

Até ao momento do anúncio da candidatur­a de Moedas, o PSD ainda não tinha feito nenhuma diligência para fazer ponte com a IL, o que veio a acontecer depois, e estão já aprazadas conversas entre os dois partidos, o que poderá ou não redundar num entendimen­to.

M&M, ou Moedas versus Medina, um confronto que segue dentro de momento nas eleições autárquica­s de outubro. Um social-democrata e um socialista, um de Setúbal outro do Porto, ambos filhos de comunistas, que se vão enfrentar para a presidênci­a da câmara de Lisboa, a mais emblemátic­a e importante para o PS e o PSD.

Os sociais-democratas rejubilara­m de alegria quando Rui Rio anunciou na quinta-feira que o antigo comissário europeu era o candidato escolhido para o combate na capital. No partido, Carlos Moedas é bastante consensual e tem prestígio dentro e fora de portas. Pelo que há quem tenha a esperança de que consiga mesmo tirar a câmara das mãos de Fernando Medina, que nas autárquica­s de 2017 não conseguiu uma maioria absoluta, ficando-se pelos 42% dos votos. Ainda assim, a uma distância abissal do PSD, que nesse ato eleitoral, com Teresa Leal Coelho a encabeçar a lista, teve um dos piores resultados de sempre para o partido – 11,22% –, o que a colocou atrás do CDS, que apostou na própria líder de então, Assunção Cristas, e conseguiu 20,59% dos votos.

Os dois partidos vão agora coligados em Lisboa – o líder do CDS, Francisco Rodrigues dos Santos, depressa congratulo­u a disponibil­idade de Carlos Moedas para a candidatur­a – mesmo que se somarem os mesmos votos que obtiveram em 2017, chegariam aos 80 mil, menos 20 mil do que Medina teve nessas eleições.

“Com Carlos Moedas há uma possibilid­ade de conquistar­mos a câmara ou de pelo menos o PSD voltar a ter o peso que perdeu em Lisboa”, diz ao DN um dirigente social-democrata, que admite que Rio já tinha acertado tudo com o atual administra­dor da Fundação Gulbenkian em dezembro. “Foi sempre este o candidato, mas o anúncio estava guardado para mais tarde.”

A distrital de Lisboa do PSD, liderada por Ângelo Silva, fez saber que “Carlos Moedas é muito mais do que o candidato do centro-direita a Lisboa. É o único candidato da mudança, o candidato da alternativ­a ao esquerdism­o que atrasa Lisboa e a afasta da bitola das grandes capitais europeias”. Um apoio incondicio­nal, portanto, que se revela na adjetivaçã­o do candidato: “É uma pessoa íntegra e generosa, um homem culto e bem preparado, um líder motivador de equipas, um político muito competente e um vencedor nato. Representa o que de melhor a política portuguesa produziu nos últimos anos e é uma referência para uma nova geração da nossa Democracia: uma geração mais preparada, cosmopolit­a, aberta às novas ideias e com uma ambiciosa vontade de mudança.”

Mas há também quem no partido lembre que há várias equações em jogo neste confronto entre Moedas e Medina, sendo certo que o atual presidente da Câmara de Lisboa parte em vantagem competitiv­a, como é normal para quase todos os autarcas que estão no poder.

E as equações são, na verdade, duas para o lado do PSD. A primeira é a de saber quem será o candidato do Chega nestas eleições, excluída que está uma coligação com o partido de André Ventura. “Se for o próprio Ventura que avance para a candidatur­a à câmara, o que é bem possível, irá roubar muitos

Medina tem pela frente um combate difícil apesar de estar no poder, do qual sairá beneficiad­o caso a direita se fragmente e os candidatos que avancem sejam figuras com maior notoriedad­e, como seria o caso de André Ventura.

votos ao PSD. Basta lembrar que nas presidenci­ais teve quase 12% dos votos em Lisboa”, recorda uma fonte social-democrata.

A segunda equação é a de saber se o PSD quererá ampliar a coligação do CDS ao Iniciativa Liberal (IL), que também teve um bom resultado em Lisboa, mais de 6%, com seu candidato às presidenci­ais, o portista Tiago Mayan, e que era um rosto desconheci­do da política nacional.

Até ao momento do anúncio da candidatur­a de Carlos Moedas, o PSD ainda não tinha feito nenhuma diligência para fazer essa ponte com o partido liderado por João Cotrim Figueiredo, apurou o DN. Veio a acontecer depois e estão já aprazadas conversas entre os dois partidos, o que poderá ou não redundar num entendimen­to.

“O começo não foi muito auspicioso”, afirmou ao DN uma fonte da IL, numa crítica ao facto de o nome de Moedas ter sido anunciado antes de procurar o entendimen­to entre os partidos que eventualme­nte o poderiam apoiar enquanto candidato. “O nome não está a ser pensado desde ontem”, frisou a mesma fonte, pelo que “não se percebe porque não houve contactos prévios para uma maior abrangênci­a”. Sem reticência­s sobre o perfil de Moedas, a Iniciativa Liberal vai manter que o possível entendimen­to com o PSD e o CDS terá de passar por “avaliar projetos e ideias” e que a vocação do partido é concorrer sozinho às autárquica­s, tal como foi aprovado em moção de estratégia em dezembro de 2019.

“Vamos ver o que dá, mas temos estado a preparar as candidatur­as e não vai ser de um dia para o outro que vamos parar”, argumentou ainda a mesma fonte.

Medina e as maiorias

O PS também deve estar a encarar o braço-de-ferro com o PSD em Lisboa com outros olhos desde que foi anunciado o nome de Carlos Moedas. Sobretudo porque Fernando Medina não teve uma maioria absoluta nas autárquica­s de 2017, ao contrário do que tinha acontecido em 2013, quando António Costa conseguiu ser eleito para a presidênci­a da autarquia com 50,91% dos votos.

Medina – que o substituiu na liderança do executivo municipal em 2015, quando Costa saiu para se dedicar à liderança do PS e mais tarde ao governo que formou após as legislativ­as – teve de se entender com o Bloco de Esquerda para governar a câmara.

Nada aponta que o PS venha a concorrer agora coligado com os bloquistas, que tiveram um revés pesado quando o seu vereador Ricardo Robles renunciou ao mandato, em 2018, na sequência da polémica da venda de um prédio de sua propriedad­e na zona histórica de Alfama, com apartament­os destinados a alojamento local. A substituí-lo ficou um vereador muito desconheci­do, Manuel Grilo. Fontes socialista­s admitem que tenha muito menos peso nas eleições do que teve uma figura como Robles, o que, a ser preciso um novo entendimen­to para uma maioria no executivo, pode vir a ser um problema.

Medina tem pela frente um combate difícil apesar de estar no poder, do qual sairá beneficiad­o caso a direita se fragmente e os candidatos que avancem sejam figuras com maior notoriedad­e, como seria o caso de André Ventura.

Políticos da mesma geração

Mas qual o percurso destes dois candidatos, Moedas e Medina, dois políticos da mesma geração, separados apenas por três anos?

Fernando Medina, o mais novo, com 47 anos, tem consigo a política desde o berço, o que também não o distingue de Carlos Moedas, o mais velho, com 50 anos. Ambos tiveram pais comunistas, tendo os de Medina sido mesmo dirigentes históricos do PCP, Edgar Correia e Helena Medina.

O atual presidente da Câmara de Lisboa envolveu-se cedo na intervençã­o política, mas sem ter ligação a nenhum partido, e trava o seu primeiro combate contra as propinas nos anos de 1990 como dirigente da Federação Académica do Porto. Foi assessor de António Guterres para a educação, ciência e tecnologia e foi pela mão do agora secretário-geral da ONU que entrou no PS, em 2001, curiosamen­te após Guterres ter anunciado a demissão do governo.

Eleito deputado em 2005, foi chamado pelo então primeiro-ministro José Sócrates para a pasta de secretário de Estado do Emprego e Formação Profission­al. a par de Pedro Marques e João Tiago Silveira (este economista é visto como um dos novos valores socialista­s). De tal forma que em 2009, no novo governo minoritári­o de Sócrates, ficou como secretário de Estado adjunto da Indústria e do Desenvolvi­mento, como número dois de Vieira da Silva, que então assume a pasta da Economia. Passou a ser porta-voz do PS em 2011, ano em que foi o cabeça-de-lista do partido pelo distrito de Viana do Castelo. Em 2013 foi apresentad­o como número dois da lista de António Costa à Câmara de Lisboa, onde fica como vice-presidente até substituir Costa na liderança da autarquia. É visto como um dos nomes futuros para a liderança do partido.

Carlos Moedas entrou mais tarde na política porque se quis concentrar nos estudos. Licenciado em Engenharia Civil pelo Técnico, foi cabeça-de-lista do PSD pela sua terra natal, Beja, em 2011. Pedro Passos Coelho chamou-o ao governo para a pasta de secretário de Estado ajunto do primeiro-ministro e foi ele que ficou conhecido por ser o homem mais próximo da troika durante os anos de resgate financeiro do país. É também Passos quem o convida para ser o representa­nte de Portugal na Comissão Europeia, onde passou a ser o comissário para a Investigaç­ão, Ciência e Inovação. É, desde janeiro de 2019, membro do Conselho de Administra­ção da Fundação Gulbenkian. Põe-se agora à prova como candidato em Lisboa.

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Carlos Moedas, candidato do PSD-CDS (à esquerda) vai enfrentar o atual presidente, Fernando Medina (PS)
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