Diário de Notícias

Marc Goergen

As mulheres dão mais sustentabi­lidade à direção das empresas

- Marc Goergen Professor de Finanças na IE Business School.

No auge da pandemia de covid, as medidas do confinamen­to imposto pelos governos levaram a uma redução acentuada, na ordem dos 26 %, das emissões globais de dióxido de carbono (CO2) – um dos gases com efeito de estufa responsáve­is pelo aqueciment­o global – derivantes da atividade humana. Essas reduções drásticas na poluição ambiental lançaram o debate em torno da construção de uma sociedade mais sustentáve­l à escala mundial, uma vez ultrapassa­da a pandemia de covid. Creio que um dos estudos mais recentes que conduzi com vários colegas nos ajuda a perceber como podemos fazer isso.

A conclusão principal do meu estudo é que as empresas com liderança feminina utilizam mais energias renováveis do que as empresas com liderança exclusivam­ente masculina. Cobrindo as 1500 firmas americanas classifica­das pela Standard & Poors no período de 2008 a 2016, o estudo também constata que a combinação de mulheres na direção das empresas e a utilização de energias renováveis gera valor para os acionistas. Esse é um resultado importante, pois joga a favor das empresas não só em termos de sustentabi­lidade, mas também do ponto de vista da liderança feminina.

Penso que este foi o primeiro estudo que se debruçou sobre o elo entre a presença das mulheres na direção das empresas e o consumo das energias renováveis. As Nações Unidas (ONU) definem energia renovável como aquela que é produzida a partir da biomassa e de fontes solares, eólicas, residuais e hídricas em pequena escala. A transição do consumo de energia fóssil ou suja para a energia renovável ou limpa pelas empresas é um passo importante para combater as alterações climáticas a nível global. A Agência Americana para a Proteção da Energia (EPA, de American Energy Protection Agency) calcula que, em 2018, as empresas tenham sido responsáve­is pela maioria das emissões de gases com efeito de estufa nos EUA. Isso significa que elas terão de envidar esforços substancia­is para fazer face às alterações climáticas a nível global.

Por que razão se considera que as empresas lideradas por mulheres tenderão a promover mais a utilização das energias renováveis do que as empresas exclusivam­ente dirigidas por homens? Em primeiro lugar, as mulheres associam a moralidade e a ética à responsabi­lidade – como o dever de zelar pelos outros e de mudar o mundo para melhor, abordando os desafios que a sociedade enfrenta. Os homens, por sua vez, tendem a associar a moralidade e a ética aos seus direitos – não interferir no direito dos outros de viver uma vida plena. Em segundo lugar, os homens e as mulheres também diferem na forma como ajudam o seu próximo. Para as mulheres, ajudar os outros implica prestar-lhes cuidados e ajuda a longo prazo. Para os homens, ajudar tende a consistir em intervençõ­es heroicas pontuais ou a curto prazo. Uma vez que as alterações climáticas representa­m um desafio monumental que a sociedade enfrenta e que requer ações mais a longo prazo, prevê-se que as mulheres assumam um papel mais ativo no seu combate.

Que provas temos de que as mulheres se preocupam mais com a ética e a responsabi­lidade social das empresas (RSE) do que os homens? Por outras palavras, na prática, o que nos mostra que as mulheres na liderança das empresas são mais propensas a levar a sério a RSE? As provas sugerem que as diretoras tendem menos a envolver-se em práticas comerciais considerad­as negativas pelas empresas de classifica­ção de RSE – como a MSCI KLD. Mais genericame­nte, as mulheres tendem a melhorar a classifica­ção de RSE e a reputação das empresas sob a sua alçada. Além disso, dispõem-se mais facilmente a divulgar informação sobre a RSE das suas empresas – e o mercado bolsista preza mais essas divulgaçõe­s voluntária­s do que as feitas por empresas exclusivam­ente lideradas por homens. O meu estudo comprova todas estas evidências com a descoberta da ligação entre as mulheres líderes empresaria­is e as energias renováveis.

Mas será que as empresas têm a ganhar com a promoção das energias renováveis? Embora seja claramente do interesse da sociedade em geral, será que a RSE ambiental gera valor financeiro para os detentores das empresas implicadas? A resposta a esta pergunta não é simples. Estudos anteriores sobre o elo entre a RSE e o rendimento financeiro ou o valor empresaria­l obtiveram resultados contraditó­rios. Enquanto alguns concluíram que a RSE gerava valor para os acionistas, outros descobrira­m uma ligação negativa, e outros ainda não identifica­ram qualquer ligação entre as duas coisas. Não obstante, várias análises abrangente­s dos estudos existentes tendem a indicar que, na maioria dos casos, uma melhor RSE correspond­e a um incremento no rendimento financeiro. Da mesma forma, os estudos para determinar se as empresas dirigidas por mulheres têm melhor rendimento do que as lideradas por homens foram inconclusi­vos. O meu estudo contribui para enriquecer o nosso conhecimen­to, dando destaque a um contexto em que a representa­ção feminina na administra­ção das empresas e a RSE ambiental tendem mais a contribuir para o rendimento financeiro.Éo que acontece quando as duas coisas coexistem. Por outras palavras, o meu estudo constata queéacombi nação da representa­ção feminina na administra­ção das empresas com uma maior utilização das energias renováveis que conduz a um incremento do valor e do rendimento empresaria­l.

Para concluir, aumentar o número de mulheres na liderança das empresas é um passo importante e necessário, que nos permitirá avançar para uma sociedade mais sustentáve­l.

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