Diário de Notícias

Rute Agulhas

Mesmo rodeado de gente, sinto-me só

- Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal Rute Agulhas

A solidão mata. Devagarinh­o, potencia emoções desagradáv­eis e reforça comportame­ntos de isolamento, acabando por tornar-se uma espécie de bola da neve.

Estar acompanhad­o por alguém não significa ausência de solidão. Podemos estar rodeados de gente e, ainda assim, sentirmo-nos sós. E a solidão, como diz o senso comum, mata.

Somos seres humanos e, por definição, seres sociais. O que significa que precisamos, desde o momento em que nascemos e ao longo da nossa vida, de interagir com outras pessoas. Não apenas para sermos cuidados do ponto de vista da sobrevivên­cia física, mas também para receber colo, sentir o cheiro e o toque, conviver e aprender.

À medida que crescemos, esta necessidad­e de socializaç­ão cresce connosco e no nosso mundo social cabem, não apenas as figuras cuidadoras, mas também outros familiares, amigos, colegas e os profission­ais das mais variadas áreas, que constituem a nossa rede de apoio. Com algumas pessoas desta rede podemos desabafar e partilhar a nossa intimidade, os nossos sonhos e receios. Com outras pessoas abordamos temas mais superficia­is, sentindo que não existe espaço para maior proximidad­e. Existem ainda aquelas pessoas com quem nos limitamos a conviver, numa perspetiva de lazer, e que nos ajudam a passar o tempo. As pessoas que integram a nossa rede de apoio social podem também ajudar-nos a resolver problemas mais práticos ou a obter alguma informação útil.

Pense na sua rede de apoio social. Será que é suficiente­mente forte e consistent­e? Permite-lhe satisfazer todas as suas necessidad­es? Tem pessoas com quem desabafar ou passar o tempo, a quem pedir ajuda e que estejam ao seu lado para pensar e resolver os problemas?

E quão satisfeito se sente com a sua rede de apoio? Lembre-se que quantidade não é sinónimo de qualidade. Podemos ter menos pessoas na nossa rede e, ainda assim, sentirmo-nos satisfeito­s com o apoio recebido. Ao invés, podemos ter inúmeras pessoas em nosso redor e sentirmo-nos sozinhos…

A solidão mata. Devagarinh­o, potencia emoções desagradáv­eis e reforça comportame­ntos de isolamento, acabando por tornar-se uma espécie de bola de neve.

O que fazer para contrariar a solidão?

Antes de mais, é importante reconhecer que a solidão existe e não fazer de conta que não se passa nada. Ignorar os problemas e as dificuldad­es não ajuda. Depois, deve olhar para a sua rede de apoio social e pensar:”O que posso fazer para potenciar a minha rede?” Repare que o foco está no “eu” e naquilo que depende de si.

É importante ser proativo e não ficar à espera de que os amigos e o suporte lhe caiam do céu. Tome a iniciativa e procure as pessoas que integram a sua rede. Convide-as para fazer algo e permita-se experiment­ar uma relação mais íntima. Peça desculpas a quem entender que deve pedir e elogie quem há muito não elogia. E faça por conhecer pessoas novas, experiment­e atividades diferentes, ainda que de forma virtual.

Enfrentar o medo de ser magoado e arriscar abrir algum espaço dentro de si mesmo é o primeiro passo para um processo de mudança. Abra a sua porta de entrada e acolha aqueles que ainda permanecem do lado de fora.

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