Diário de Notícias

REINO UNIDO

Ex-primeiro-ministro procurou que a empresa para a qual trabalhava desde 2018 (e que faliu em março) tivesse acesso a fundos de apoio para a covid-19. Governo está a investigar.

- TEXTO SUSANA SALVADOR

Em fevereiro de 2010, a poucos meses de se tornar primeiro-ministro britânico, David Cameron considerou que os lóbis eram “o próximo grande escândalo à espera de acontecer”. Em 2014, já no n.º 10 de Downing Street, introduziu uma lei destinada a garantir uma maior transparên­cia nesta atividade. Agora, está sob fogo pela pressão que fez junto de ministros do governo de Boris Johnson, em nome da Greensill Capital (para a qual trabalhava desde 2018), de forma a garantir o acesso a fundos destinados a combater a crise causada pela pandemia de covid-19. A empresa financeira viria a declarar falência em março e Cameron enfrenta uma investigaç­ão do governo, com a oposição a pedir um inquérito parlamenta­r independen­te.

Após quase um mês de silêncio em relação ao escândalo, o ex-primeiro-ministro reagiu oficialmen­te no passado domingo. “Nas minhas apresentaç­ões ao governo, não quebrei nenhum código de conduta ou regra governamen­tal”, disse Cameron num comunicado, lembrando que os seus esforços não tinham sido atendidos e que não houve qualquer mudança da política de governo. Contudo, indicou ter refletido longamente sobre o tema e que “há lições importante­s a tirar. Como antigo primeiro-ministro, aceito que as comunicaçõ­es com o governo precisam de ser feitas apenas através dos canais mais formais, para que não haja espaço para interpreta­ções erradas”.

O “funcionári­o” Cameron

Mas afinal, o que queria Cameron? O ex-primeiro-ministro, que se demitiu em 2016 depois da vitória do “sim” no referendo do Brexit (ele convocou-o, mas defendia o “não”), começou a trabalhar para a Greensill em 2018. Por ser “funcionári­o” (tinha até direitos sobre ações) e não precisava de se registar como lobista, não tendo na prática violado a sua própria lei. A empresa, fundada em 2011 pelo australian­o Lex Greensill (que chegou a ser conselheir­o de Cameron), especializ­ava-se em supply chain finance – serviço que permite aos fornecedor­es serem pagos mais rapidament­e, através do recurso de empréstimo­s de curto prazo.

Cameron deixou governo em 2016 e entrou na Greensill em 2018.

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