Diário de Notícias

O tempo para Costa (ou César) respondere­m a Sócrates?

Partido celebra na segunda-feira 48 anos com um evento online de promoção da campanha autárquica. Ocasião ideal para o líder responder ao ex-líder.

- TEXTO JOÃO PEDRO HENRIQUES

OPS celebra esta segunda-feira 48 anos de vida – o que acontece estando a direção do partido e José Sócrates envolvidos em trocas de acusações e até insultos. Até agora, o líder do partido, António Costa, ainda não comentou as decisões instrutóri­as do juiz Ivo Rosa na Operação Marquês. Sócrates foi despronunc­iado de 25 dos 31 crimes de que estava acusado, entre os quais todos os de corrupção.

Contudo, Ivo Rosa pronunciou-o por três crimes de branqueame­nto e outros tantos de falsificaç­ão de documentos. “Existem entregas de dinheiro por parte do arguido Carlos Santos Silva ao arguido José Sócrates, bem como pagamentos feitos por aquele arguido a favor deste, no montante global de 1,72 milhões de euros”, referiu o magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminal. E tais pagamentos do empresário, quando este angariava obras e projetos para o Grupo Lena, levaram o juiz a presumir que as entregas de dinheiro a Sócrates tinham como objetivo “criar um clima geral de simpatia ou de permeabili­dade por parte do primeiro-ministro”. Segundo a decisão, os pagamentos indiciam “a existência de um mercadejar com o cargo por parte do primeiro-ministro face ao arguido Carlos Santos Silva e, por conseguint­e, uma invasão do campo da ‘autonomia intenciona­l’ do Estado”. Ivo Rosa deixou bem claro que só não pronunciou Sócrates por corrupção (devido a este “mercadejar” com Carlos Santos Silva) porque o crime estava prescrito.

O 48.º aniversári­o do partido será assinalado com um evento online no qual discursarã­o, entre outros, o presidente do partido, Carlos César, e o secretário-geral, António Costa, bem como Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Fontes da direção do PS admitiram ao DN que António Costa poderá aproveitar para romper o silêncio. No dia da decisão instrutóri­a – mas horas antes de ser pronunciad­a –, o líder do PS limitou-se a dizer: “Sobre essa matéria tive a oportunida­de de responder já há seis anos. E ainda não tenho nada para acrescenta­r em relação àquilo que disse há seis anos.” Implicitam­ente, recordou o SMS que enviou a todos os militantes do PS em 2014, no dia em que José Sócrates foi preso (21 de novembro): “Caras e caros camaradas, estamos todos por certo chocados com a notícia da detenção de José Sócrates. Os sentimento­s de solidaried­ade e amizade pessoais não devem confundir a ação política do PS, que é essencial preservar, envolvendo o partido na apreciação de um processo que, como é próprio de um Estado de direito, só à justiça cabe conduzir com plena independên­cia, que respeitamo­s.” Desde então, Costa sempre “isolou” o PS face ao caso Sócrates, dizendo que a política não comenta atos da Justiça. E recusou sempre “atravessar-se” pela inocência do antigo líder dos socialista­s. Em maio de 2018, Sócrates desfiliou-se do PS.

Agora a “conversa” entre o antigo líder e a atual direção do partido já está ao nível do insulto. Fernando Medina – visto internamen­te como um dos principais candidatos à sucessão de Costa na liderança do PS – disse na TVI 24 que o comportame­nto de Sócrates “corrói a democracia” . Um político – disse – “não precisa de ser santo, não estamos no pedestal dos santos, mas estamos no pedestal dos que conseguem honrar essa confiança, e essa confiança foi quebrada. Essa confiança foi inapelavel­mente quebrada e não precisa de haver nem mais crime adensado nem retirado. Aquilo que nós sabemos é suficiente, ou melhor, aquilo que também não foi explicado durante todo este tempo é suficiente”.

Sócrates, entrevista­do também na TVI, reagiu com a brutalidad­e esperada, consideran­do as declaraçõe­s de Medina “uma profunda canalhice”. Atribuiu-as não ao autarca, mas antes ao seu “mandante” – ou seja, a António Costa –, acusando-o de “querer uma condenação sem julgamento e sem a presunção de inocência”.

Costa ainda não reagiu. Mas o evento desta segunda-feira onde participar­á, aproveitan­do o aniversári­o do partido para lançar a campanha autárquica do PS, dá-lhe condições para teorizar sobre a necessidad­e de os políticos, a todos os níveis, terem um comportame­nto ético à prova de bala. Talvez até argumente sobre as virtualida­des da “ética republican­a”, um clássico destas ocasiões.

“[Quem está na vida pública] não precisa de ser santo, não estamos no pedestal dos santos, mas estamos no pedestal dos que conseguem honrar essa confiança, e essa confiança foi quebrada.” Fernando Medina Presidente da Câmara de Lisboa

 ??  ?? A prisão de Sócrates, em novembro de 2014, coincidiu com a consagraçã­o de Costa como líder do PS.
A prisão de Sócrates, em novembro de 2014, coincidiu com a consagraçã­o de Costa como líder do PS.

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