José Mendes
Diferenciação, mas seletiva
Portugal e a sua economia são pequenos em dimensão. Não é defeito, nem limitação, é apenas uma constatação objetiva. A boa notícia é que, não sendo grande, não terá problemas enormes e insolúveis. E mais, sendo também muito aberto e permeável, as oportunidades a que pode aceder e de que pode tirar vantagem são ilimitadas, desde que encontre o modelo de criação de valor adequado à sua especificidade.
Diz-se em microeconomia que as duas formas alternativas de competir no mercado são o preço e a diferenciação. Para conseguir preço competitivo – isto é, baixo – é preciso dispor de escala, mercado interno grande ou mão de obra barata. Logo após 1974, Portugal seguiu esta via, porque não tinha outra opção. A evolução das organizações internacionais, como a do Comércio, e a integração de Portugal num espaço económico europeu rapidamente trouxeram à evidência a insustentabilidade deste caminho. O anúncio da falência da têxtil Coelima, esta semana, simboliza o fecho de um ciclo que foi importante no passado mas que já não traz futuro.
Por exclusão de partes, o sucesso e a sustentabilidade económica do nosso país terão de traçar-se pela via da diferenciação. Diferenciado quer dizer inovador, assente no conhecimento avançado, consequente no desenvolvimento de produtos e resiliente face à feroz concorrência. Um rápido olhar para o mapa das economias mais competitivas mostra que, logo após o clube restrito dos grandes países desenvolvidos, existe um grupo de pequenas nações, quase todas europeias, que dão cartas por terem apostado no talento e serem extremamente inovadores. São os países nórdicos, a Suíça, Israel, e pouco mais.
No ano passado, Portugal integrou, pela primeira vez, o grupo de “fortes inovadores” do Ranking Europeu de Inovação, o que indicia condições para aceder ao tal grupo dos que, sendo pequenos, criam valor diferenciado e sustentável. É um excelente sinal, mas convém não embandeirar em arco. Uma análise cuidada das componentes da nossa boa classificação denuncia que ao nível da criação de produtos de elevado valor acrescentado, derivados de conhecimento protegido e não copiável, estamos ainda atrasados.
Observo uma crescente reivindicação por parte da comunidade de investigadores, nomeadamente bolseiros de investigação que aspiram a lugares estáveis nas instituições de ensino superior, argumentando com a importância da ciência. Parece-me bem. Mas sei também que a “ciência” é um termo pouco específico num contexto de decisão. Quando se reivindicam mais lugares na carreira de investigação, importa começar pela demonstração concreta do valor acrescentado que a satisfação dessas pretensões pode trazer ao país, de forma a justificar a utilização do dinheiro público, leia-se os impostos de todos nós, nos salários e no financiamento da atividade científica. Lamento dizer que, salvo raras exceções, não descortino essa dimensão no discurso.
A divulgação, há dias, do ranking de 2020 da consultora em propriedade industrial Gastão da Cunha Ferreira mostra que há em Portugal quem, apesar de tudo, produza valor concreto a partir do conhecimento avançado. Em termos de patentes concedidas, as universidades do Minho e do Porto lideram entre as academias, enquanto a Bosch e aVeniam fazem o top entre as empresas. Se considerarmos que o aumento exponencial de patenteamento pela Bosch, sediada em Braga, está ligado ao megaprojeto conjunto que a associa à Universidade do Minho, então concluímos que é no Noroeste que está a mais poderosa semente de um futuro próspero para Portugal.
Diferenciação, sim, mas seletiva.