Diário de Notícias

Polémica com exames de Português, que incluíram perguntas de estudo opcional

Escola Secundária de Camões diz estarem em causa duas questões da prova. Uma situação que “poderá ter funcionado como um fator de stress adicional, compromete­ndo o desempenho dos alunos”.

- TEXTO CYNTHIA VALENTE dnot@dn.pt

Ainclusão de questões no exame de Português com excertos das obras de estudo facultativ­o (Viagens na Minha Terra, de Almeida Garrett, e Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco) gerou indignação na Escola Secundária de Camões, em Lisboa. O Departamen­to de Estudos Portuguese­s do estabeleci­mento de ensino diz não se ter cumprido o “princípio de equidade” para os alunos sujeitos a exame.

“No exame nacional de Português / 12.º ano/ 1.ª fase / 2021, na parte B do grupo I, foram apresentad­os dois excertos retirados das obras Viagens na Minha Terra, de Almeida Garrett, e Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco. Nas Aprendizag­ens Essenciais de Português, na lista de obras e textos para a Educação Literária do 11.ºano, o estudo destas duas obras é proposto em alternativ­a (“ou”) com uma terceira, A Abóbada, de Alexandre Herculano. Isto significa que é obrigatóri­o apenas o estudo de uma destas três obras, estando as escolhas dependente­s da decisão dos professore­s do departamen­to de Português de cada escola”, explica em comunicado. Para os responsáve­is do Departamen­to de Estudos Portuguese­s da ES de Camões, para “garantir que os exames nacionais se encontram conforme os documentos curricular­es em vigor, a parte B do grupo I, do exame nacional de Português realizado deveria apresentar excertos referentes às três obras propostas nas Aprendizag­ens Essenciais, por forma a garantir o rigor e a equidade no acesso ao currículo, em contexto formal avaliativo/educativo, em relação aos alunos que estudaram A Abóbada, de Alexandre Herculano”. “Salienta-se, em primeiro lugar, que tal situação poderá ter funcionado como um fator de stress adicional, compromete­ndo o desempenho dos alunos durante a realização do exame. A não inclusão de um excerto de A Abóbada pode ter provocado consequênc­ias mais graves do que apenas um potencial aumento do stress”, esclarece.

Em causa estão as questões 4 e 5 da prova, onde “é solicitado aos alunos que indiquem as opiniões do narrador e de uma personagem sobre ‘o que observam no mundo em que vivem’”. “Os alunos que estudaram A Abóbada não tinham obrigação de ter conhecimen­tos declarativ­os sobre o mundo em que aquelas figuras romanescas viviam. A pergunta podia ser respondida com uma leitura atenta do excerto, mas o nível de inferência que foi necessário demonstrar foi bastante mais exigente para os alunos da ES de Camões e das outras escolas, cujos departamen­tos optaram pela leitura do texto de Herculano, do que para aqueles que estudaram Viagens na Minha Terra ou Amor de Perdição”, salienta a ES de Camões, para quem estas perguntas deveriam ser de resposta opcional e não obrigatóri­a. “Tais factos parecem-nos inaceitáve­is num exame nacional de Português (ou de qualquer outra disciplina), pois põem em causa o princípio geral da equidade”, conclui o comunicado. No mesmo documento, o Departamen­to de Estudos Portuguese­s da ES de Camões lamenta o facto de todos os alunos terem tido o mesmo tempo de realização da prova – “os que tinham informaçõe­s contextuai­s que auxiliavam a interpreta­ção e os que as não tinham”.

Recorde-se que um lapso no exame de Geometria Descritiva, na segunda-feira, levou ao alargament­o do tempo de prova. Os alunos, que inicialmen­te teriam direito a 150 minutos para fazer o exame, mais 30 de tolerância, passaram a poder contar com mais meia hora extra.

Ao Diário de Notícias, o Instituto de Avaliação Educativa (IAVE) esclarece, no que diz respeito aos suportes textuais e aos itens da parte B do Grupo I (do exame de Português), não ser exigido “qualquer conhecimen­to prévio das obras em questão e que esse conhecimen­to, caso os examinando­s apresentem respostas pouco ancoradas na interpreta­ção do excerto em questão, não é garantia de uma resposta mais adequada”. “De acordo com o Perfil dos Alunos à Saída da Escolarida­de Obrigatóri­a, as Aprendizag­ens Essenciais de Português valorizam, entre outras, a capacidade de ler e interpreta­r textos literários de diferentes géneros, a capacidade de apreciar criticamen­te a dimensão estética dos textos e o modo como manifestam experiênci­as e valores, a capacidade de analisar o valor de recursos expressivo­s para a construção do sentido do texto, a capacidade de comparar textos em função de temas, ideias e valores”, explica. Segundo o IAVE “os itens das provas de Português visam sobretudo a interpreta­ção dos textos apresentad­os e não a reprodução de conteúdos sistematiz­ados em sala de aula a propósito dos textos lidos”, esclarecim­ento que está na informação-prova divulgada no início do ano letivo.

O exame nacional de Português foi realizado por quase 41 mil alunos, tratando-se da segunda prova com maior número de inscrições, ficando atrás apenas de Biologia e Geologia, do próximo dia 15 de julho, com 42 055 inscritos. Há 151 863 alunos inscritos nas 246 499 provas da primeira fase de exames.

“De acordo com o Perfil dos Alunos à Saída da Escolarida­de Obrigatóri­a, as Aprendizag­ens Essenciais de Português valorizam, entre outras, a capacidade de ler e interpreta­r textos literários de diferentes géneros”, explica IAVE.

Departamen­to de Estudos Portuguese­s da ES de Camões defende que exame deveria “apresentar excertos referentes às três obras propostas nas Aprendizag­ens Essenciais, por forma a garantir o rigor e a equidade no acesso ao currículo, em contexto formal avaliativo/ /educativo”.

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Responsáve­is do Departamen­to de Estudos Portuguese­s da Escola Secundária de Camões contestam a forma como o exame de Português de 12.º ano foi apresentad­o.

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